Os microrganismos patogênicos que causam toxinfecções alimentares são um dos principais desafios da indústria alimentícia global já que podem estar presentes desde a matéria prima, infectando o alimento e também o consumidor final. A partir disso, uma série de estudos vêm sendo feita para encontrar alternativas viáveis e compatíveis, com o objetivo de que esse problema seja reduzido ou erradicado, preservando a saúde das pessoas e garantindo a segurança alimentar.
Um dos mais recentes estudos nesse sentido foi produzido pelo Departamento de Ciência dos Alimentos da Universidade Federal de Lavras, sob o comando da professora Roberta Hilsdorf Piccoli. Ela analisou a atividade antimicrobiana do chamado “TCP” contra bactérias causadoras de toxinfecções alimentares.
TCP é a sigla para Tecnologia do Consórcio Probiótico e consiste em um ecossistema populacional equilibrado com um grande número de microrganismos de diferentes estirpes probióticas que se complementam fornecendo alimentos uns aos outros por secreção, que se traduzem em mudanças metabólicas equilibradas no ambiente de aplicação, sendo que todo o processo é realizado por via anaeróbica. A combinação desses microrganismos produz metabólitos (ácidos orgânicos, enzimas, aminoácidos, vitaminas e açucares) que multiplicam os microrganismos benéficos quando atuam diretamente sobre a matéria orgânica existente, recuperando e restaurando o meio em que se aplicam.
Na TCP, bactérias ácido láticas, fototróficas, leveduras, entre outros microrganismos presentes no consórcio produzem essas secreções, que são alimentos desses mesmos grupos presentes no consórcio, fazendo com que eles continuem ajudando uns aos outros a se manter vivos e fortes no ambiente, contribuindo para as propriedades antimicrobianas e neutralização de substâncias tóxicas, fechando um ciclo simbiótico equilibrado e eficiente. A partir disso, a pesquisadora buscou avaliar o impacto do consórcio nas bactérias presentes nos alimentos, que causam prejuízo para a pecuária e para os humanos consumidores.
“Foram utilizadas as bactérias Salmonella Enteritidis S64 ; S. Cholerasuis INCQS 5001; S. Gallinarum CCT 7446; S. Pullorum CCT 7407; Staphylococcus aureus ATCC25923; Pseudomonas aeruginosa MICRO 001, Listeria monocytogenes ATCC 19117 ; Escherichia coli enteropatogênica INCQS 00181 e E. coli entetoxigênica ATCC 35401. As cepas foram obtidas na Coleção de Bactérias de Referência em Vigilância Sanitária, Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e na coleção de Cultura Tropica, Fundação André Tosello”, explicou a professora em seu artigo.
Os problemas das bactérias
Segundo o Índice.eu, de Portugal, somente nos países desenvolvidos, cerca de 30% da população é afetada por toxinfecções alimentares anualmente. A gravidade da toxinfecção depende de vários factores, tais como, do grau de contaminação do alimento, da quantidade ingerida, do tipo de agente patogênico e da capacidade de resistência do sistema imunológico de cada indivíduo, mas os grupos mais vulneráveis são as crianças até aos 4 anos, os idosos, as grávidas, os doentes e os imunodeprimidos.
A principal doença causada por meio de toxinfecções alimentares é a Salmonelose, que é oriunda das bactérias do gênero Salmonella. Qualquer alimento cru de origem animal, como carne, leite, ovos e frutos do mar, se estiverem contaminados pela bactéria, são potenciais causadores de salmoneloses. As frutas e legumes, se contaminados, também podem veicular a Salmonella.
De acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), nas aves, por exemplo, podem apresentar as seguintes enfermidades:
-Pulorose, causada pela Salmonella Pullorum,
-Tifo aviário, causado pela Salmonella Gallinarum, e
-Podem abrigar vários outros sorovares (paratíficos), entretanto sem apresentar sintomatologia clínica.
Outro patógeno comum é a Staphylococcus aureus que frequentemente está associado a infecções adquiridas na comunidade e no ambiente hospitalar. As infecções mais comuns envolvem a pele (celulite, impetigo) e feridas em sítios diversos. “Algumas infecções por S. aureus são agudas e podem disseminar para diferentes tecidos e provocar focos metastáticos. Episódios mais graves, como bacteremia, pneumonia, osteomielite, endocardite, miocardite, pericardite e meningite, também podem ocorrer”, explicou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Esperança
Todos esses problemas, somados aos possíveis prejuízos para a pecuária, como sacrifícios de animais e também medicamentos, motivaram as pesquisas atuais com os probióticos, em especial com a TCP. Como conclusão, a especialista afirma que a TCP apresentou ação antagonista a todas as cepas testadas mostrando-se efetiva na inibição e controle de Salmonella Enteritidis; S. Cholerasuis; S. Gallinarum; S. Pullorum; Staphylococcus aureus; Listeria monocytogenes; Escherichia coli enteropatogênica e E. coli entetoxigênica.
De acordo com os responsáveis pela tecnologia, a TCP se mostra como forte candidata para a ser a solução contra essas bactérias e também outros tipos de patógenos na pecuária brasileira, já que os próximos passos são estudos científicos que já estão em desenvolvimento com suínos, aves, bovinos e camarão. O consórcio pareceu não mostrar antagonismo expressivo apenas contra Pseudomonas aeruginosa, onde a média do halo de inibição foi de 1,41 mm. “Experimentos com diferentes concentrações de inóculo (TCP) estão sendo realizados com as mesmas cepas para termos a concentração mínima inibitória da TCP sobre cada um dos patogênicos do experimento”, conclui a professora Roberta Hilsdorf Piccoli.