O que o consumidor busca na carne de aves?
O consumidor busca uma carne saborosa, saudável, de boa aparência, apresentação e higiênica. Ao mesmo tempo, ele apresenta receio sobre resíduos de drogas, substâncias tóxicas, componentes alergênicos e com contaminação microbiológica, que causem problemas de saúde. Aliado a esse fato, os consumidores estão cada vez mais interessados em produtos nutricionalmente enriquecidos, que venham a contribuir com o seu bem-estar. Todos estes caminhos levam a busca por alimentos funcionais. É interessante observar que estes alimentos funcionais são capazes de atender as exigências nutricionais de substâncias relevantes, frequentemente em níveis subotimos na dieta. Portanto, os alimentos funcionais podem melhorar a saúde e o bem-estar de humanos e reduzir o risco de doenças metabólicas. Em termos de mercado, esta idéia parece ser muito promissora (Uijttenboogaart, 2000).
Propriedades nutricionais da carne de frango
A carne de frango e ovos representam uma excelente fonte protéica e de aminoácidos e podem satisfazer uma fração significativa das exigências de humanos. Nutricionalmente falando, a carne de frangos e ovos são uma fonte rica em aminoácidos essenciais. Assim, 100 g de carne de frango ou um ovo grande são capazes de satisfazer as exigências de aminoácidos (Tabela 1). O potencial em aumentar o perfil de aminoácidos da carne de frangos é limitado. Entretanto, tanto a carne de aves como ovos apresentam baixos níveis de minerais e de vitaminas. O perfil de ácidos graxos tende a refletir o que é oferecido na dieta. Este aspecto pode ser explorado na manipulação da composição da carne e de ovos.
Tabela 1 Perfil nutricional da carne de frangos e ovos e exigência nutricional de humanos adultos
Leeson (1993), Surai (2005)
Baixa caloria
Pelos conceitos atuais, um alimento para ser saudável deve apresentar baixo valor calórico. Sob este ponto de vista, a carne de frango é um alimento saudável por conter em torno de apenas 10% das necessidades calóricas diárias (Tabela 1).
Qualidade protéica
Alterar o perfil de aminoácidos da carne de frangos é uma tarefa não fácil. Ao oferecer uma dieta deficiente em um aminoácido resulta em menor deposição muscular, mas o perfil de aminoácidos não é alterado. Mesmo entre as diferentes partes da carcaça do frango, os distintos músculos apresentam uma composição similar de aminoácidos (Tabela 2). Este fato torna difícil alterar algumas partes mais nobres, como o peito, através da nutrição.
Tabela 2. Perfil de aminoácidos da carne de frangos (g/100 g proteína)
Leeson (1993)
Analisando as Tabela 1 e 2 pode-se facilmente constatar que, em verdade, a carne do frango é considerada uma fonte protéica de alto valor biológico, pois apresenta alta percentagem de todos os aminoácidos essenciais.
Por outro lado, traçando um paralelo entre a qualidade das proteínas animais e as vegetais, pode ser afirmado que estas últimas não suprem todos os aminoácidos essenciais. Ainda, a disponibilidade dos aminoácidos da carne de frango, após a digestão é alta, pois as mesmas são 95 a 100% digestíveis, enquanto que algumas proteínas vegetais são apenas 65 a 75%.
Gorduras
As gorduras são importantes componentes de uma dieta balanceada. Além de contribuirem para o sabor, aroma e maciez da carne, as gorduras fornecem ácidos graxos essenciais e também auxiliam na absorção de vitaminas lipossolúveis A, D, E e K. Além disso, as gorduras são uma fonte concentrada de calorias.
Todas as gorduras de origem animal ou vegetal contêm misturas de ácidos graxos saturados e insaturados. Apesar da comum referência da gordura animal como saturada, apenas 30% dos ácidos graxos da carne estão inclusos nesta categoria. Por outro lado, nem todos os ácidos graxos apresentam o mesmo efeito no colesterol sanguíneo, como o caso dos monoinsaturados, que não contribuem para o aparecimento de doenças cardiovasculares.
Leeson (1993) alerta que a composição das dietas oferecidas as aves pode afetar a composição das carcaças, entretanto, cuidados devem ser tomados na interpretação dos resultados se são baseados em alterações absolutas ou relativas. Neste aspecto, Jackson et al (1982) observaram alterações no conteúdo de gordura e de proteína da carcaça de frangos alimentados vários níveis de energia e de proteína da dieta. Entretanto, a única alteração absoluta ocorreu com a gordura, uma vez que as gramas de proteínas parecem não ser afetadas pela dieta. Portanto, é possivel influenciar a deposição de gordura na carcaça, enquanto que o acúmulo de proteíina parece ser controlado por outros fatores, provavelmente de ordem genética. Entretanto, altos níveis de lisina na dieta podem ser correlacionados com melhora no rendimento do peito (USDA, 1979).
O tecido adiposo não é estático, mas dinâmico. Assim como qualquer outro tecido corporal, ele sofre uma reciclagem constante. O controle na quantidade e na qualidade de lipídios depositados nas carcaças é de interesse na produção de frangos com alto rendimento de tecido muscular. Sanz et al (1999) observaram que dietas isoenergéticas ricas em ácidos graxos poli-insaturados propiciam uma menor deposição de gordura abdominal, comparativamente a frangos recebendo dietas contendo altos teores de gordura saturada. Qualquer redução na quantidade de gordura abdominal é considerada positiva por produtores e consumidores, porque é perdida durante o corte das carcaças em pedaços (cut-ups). Ela contribui pouco para a qualidade da carne, ao mesmo tempo em que existe uma resistência crescente ao consumo de carne com alto conteúdo de gordura.
Por outro lado, o uso de uma fonte de lipídio insaturado pode afetar negativamente a carcaça, devido ao baixo ponto de fusão (Leeson e Summers, 2001). É fato conhecido que o ponto de fusão da gordura das aves depende do seu perfil de ácidos graxos e que este depende da composição de ácidos graxos da dieta (Leeson e Summers, 2001). A substituição de uma dieta contendo altos níveis de gordura insaturada por uma contendo gordura saturada poucos dias antes do abate resulta em menor deposição de gordura abdominal associado a uma fluidez aceitável da gordura da carcaça (Sanz et al., 2000).
O excesso de gorduras saturadas no organismo é considerado um fator de risco para a ocorrência do aumento dos níveis de colesterol ruim, bem como propensão ao surgimento de cânceres. Para contornar qualitativamente este processo, aparecem como alternativas substâncias como ácidos graxos omega-3 (Leeson e Summers, 2005) e ácido linoléico conjugado (Du e Ahn, 2002).
O aumento do consumo de ácidos graxos Omega-3 reduz o risco de doenças coronárias (Kromhout, 1992). Outros estudos indicam que o consumo de ácido eicosapentanóico (EPA) e de ácido docosahexanóico (DHA) reduz os níveis de triglicerídios circulantes (Sanders e Roshanai, 1983). Além disso, O DHA é fisiologicamente essencial como componente de fosfolipídeos de membrana do cérebro e da retina para a performance mental e capacidade visual, respectivamente (Health and Welfare Canada, 1990). O óleo de peixe (ex. arenque) é rico em Omega-3. O maior limitante no óleo de peixe é o mau odor que ele pode causar na carne. Em geral, um máximo de 0,75% de óleo de peixe é tolerável (Leeson e Summers, 2005).
Minerais
A carne de frangos é uma fonte de minerais. Os mais importantes em termos de satisfação da exigência humana são selênio, fósforo, zinco, ferro, potássio e magnésio. O selênio atua em várias proteínas, sendo a glutationa peroxidase, que atua como um antioxidante, a mais conhecida. Nesta função, ele é considerado um protetor contra doença coronária e de certos cânceres, como o de próstata. Pensava-se que a biodisponibilidade deste mineral fosse maior em alimentos vegetais do que em alimentos animais, mas dados recentes mostram que as carnes são fontes de altas doses do mesmo. A carne de frangos pode ser enriquecida com selênio, quando este é suplementado na forma de selênio orgânico (Surai, 2002). Esta prática é adotada em vários países.
Vitaminas
As vitaminas são substâncias orgânicas encontradas em pequenas quantidades nos alimentos e responsáveis pela regulação de centenas de processos metabólicos do organismo humano. São normalmente classificadas como lipo e hidrossolúveis.
As de maior significância na carne de frango são em ordem: niacina, com 27,2 a 56% da exigência humana diária, dependendo do corte cárneo; vitamina B6 com 13,8 a 27,5%, ácido pantotênico com 8,2 a 10,7%, riboflavina com 5,4 a 9,4%; vitamina B12 com 5,2 a 6,3% e tiamina com 1,0 a 4,7%.
A carne de frango é, portanto, uma boa fonte principalmente das vitaminas do complexo B (B1, B2, B6, B12 e ácido pantotênico). Todas estas são essenciais para os humanos e inclusive, as carnes de modo geral, estão entre os alimentos que mais as contém. Em geral, as vitaminas do complexo B regulam muitas das reações químicas necessárias para promover o crescimento celular e manter a saúde.
As vitaminas A, C e K estão em baixo teor nas carnes, mas alguns órgãos comestiveis apresentam bons teores das mesmas. O ácido pantotênico e a folacina são especialmente abundantes no fígado, o qual supre apreciáveis teores das vitaminas A, D, E e K.
A vitamina E é um dos antioxidantes naturais mais eficientes, protegendo as membranas celulares da destruição oxidativa, conferindo melhor estabilidade das carnes. A vitamina E interage com a dupla camada lipídica que compõe as membranas celulares e inibe a ação dos radicais livres in vivo, contribuindo para a integridade destas membranas.
Evidências indicam que a presença de vitamina E nas membranas celulares via a suplementação, inibe a lesão provocada por estresse e amenizam os processos bioquímicos indutores de carne PSE em frangos, melhorando as propriedades funcionais da carne (Olivo et al., 2001).
A vitamina E confere estabilidade lipídica e de cor aos cortes cárneos de frangos. A adição de vitamina E no momento do processamento de carnes aumenta a estabilidade da cor do produto e diminui os níveis de rancificação. Entretanto, a sua ação é efetivamente maior quando incorporado na dieta dos animais (Olivo e Olivo, 2006). Os resultados de estudos de estabilidade de cor (estado químico do pigmento heme) mostraram que a suplementação retardou a formação do pigmento metamioglobina (cor marrom), mantendo-se por mais tempo no estado oximioglobina (cor vermelha), para os produtos crus e cozidos, elaborados com carne de frangos (coxas-sobrecoxas). Estas mesmas carnes apresentaram retardo na formação de ranço, com acréscimo de quatro dias na vida de prateleira, quando conservados sob resfriamento. Este efeito de melhoria, inclusive nas propriedades funcionais, foi também observado em carne mecanicamente separada, obtida a partir de resíduos de ossos das aves suplementadas.
A ação positiva da vitamina E na extensão da cor vermelha da carne deve-se provavelmente ao seu efeito protetor à molécula do pigmento heme, principalmente a parte protéica (globina), a qual por sua vez, protege o átomo de ferro, retardando sua oxidação.
Algas: um futuro ou já realidade
Algas são ricas em vitaminas, pigmentos, proteínas, lípidios entre outros componentes que os tornam muito interessantes como ingrediente potencial para dietas. A utilização da biomassa das algas na alimentação animal é uma área muito importante para o futuro. O sistema de produção de algas é mais eficiente que qualquer outro em relação a quantidades de nitrogênio por hectares. Este é um dos motivos que demonstra seu tremendo potencial para o direcionamiento da produção de proteínas no futuro. Beneficiar a alimentação protegendo a atmosfera dos gases e tratando a água, tudo ao mesmo tempo (Rodriguez, comunicação pessoal).
É preciso compreender melhor como utilizar as algas para a alimentação animal. Estudos analizando a sua composição estão sendo conduzidos. Estes estão sendo direcionados a como suprir os nutrientes. Além disso, as algas podem ser muito importantes em auxiliar a demanda de ingredientes que estão se tornando escassos, como a diminuição da farinha de peixe.
Xiao et al (2011) observaram efeito positivo de um produto com característica antioxidante a base de extrato de algas para substituir parcialmente ou intensificar a capacidade antioxidante da vitamina E. Entretanto, estudos devem ser conduzidos para avaliar extrato de algas sobre a saúde intestinal, proteção contra bactérias patogênicas, melhorar o valor nutricional de produtos avícolas, melhorar a função imune, ação antimicotoxínica e otimização da absorção de nutrientes (Rodriguez, comunicação pessoal).
Bibliografia
Du, M. e D. U. Ahn. 2002. Effect of dietary conjugated linoleic acid on the growth rate in live birds and abdominal fat content and quality of broiler meat. Poult. Sci 81:428-433.
Havenstein, G. B., P. R. Ferket, M. A. Qureshi. 2003. Growth, livability and feed conversion of 1957 versus 2001 broilers when fed representative 1957 and 2001 broiler diets. Poultry Sci. 82:1500-1508.
Health and Welfare Canada. 1990. Nutrition recommendations. Minister of Supply and Services, Ottawa, ON.
Leeson, S. 1993. Potential of modifying poultry products. J. Appl. Poultry Res. 2:380-384.
Leeson, S. e J. D. Summers. 2001. Scott´s Nutrition of the Chicken. Niversity Books. 4a ed. Guelph, Canada.
Leeson, S. e J. D. Summers. 2005. Commercial Poultry Nutrition. University Books. 3a ed. Guelph, Canada.
Jackson, S., J. D. Summers, S. Leeson. 1982. Effect of dietary protein and energy on broiler carcass composition and efficiency of nutrient utilization. Poultry Sci. 61: 2224-2231.
Komhout, D. 1992. Dietary fats: Long-term implications for health. Nutr. Rev. 50:49-53.
Olivo, R. A. L. Soares, E. I. Ida, M. Shimokomaki. 2001. Dietary vitamin Einhibits poultry PSE and improves meat functional properties. J. Food Biochem. 25:271-283.
Olivo, R. e N. Olivo. 2006. O Mundo das Carnes. Global food, São Paulo, Brasil.
Rechkemmer, G. 2001. Funktionelle Lebensmittel- Zukunft der Ernahrung oder Marketing-Strategie? Forschungsreport, BMVEL 1:32-35.
Sanders, T. A. e R. Roshanai. 1983. The influence of different types of Omega-3 polyusaturated fatty acids on blood lipids and platelet function in health volunteers. Clin. Sci. 64:91-99.
Sanz, M., A. Flores, C. J. Lopez-Bote. 1999. Effect of fatty acid saturation in broiler dietson abdominal fat and breast muscle fatty acid composition ans susceptibility to lipid peroxidation. Poult. Sci. 78:378-382.
Sanz, M., C. J. López-Bote, D. Menoyo, J. M. Bautista. 2000. Abdominal and fatty acid synthesis are lower and β-oxidation is higher in broiler chickens fed diets containing unsaturated rather saturated fat. Journal of Nutrition. 130:3034-3037.
Surai, P. F. 2002. Natural antioxidants in Avian Nutrition and Reproduction. Univ. Press, Nottingham, UK.
Surai, P. F. 2005. Selenium in Nutrition and Health. Univ. Press, Nottingham, UK.
Uijttenboogaart, T. G. 2000. Value added poultry products in Europe. Proc. XXI World´s Poult. Cogr., Montreal, Canada.
USDA, 1979. Composition of foods. Poultry Products USDA Agriculture Handbook pp 8-15
XIAO, R., POWER, R. F., MALLONEE, D., et al A comparative transcriptomic study of vitamin E and an algae-based antioxidant as oxidative agents: Investigation of replacing vitamin E with the algae-based antioxidant in broiler diets. Journal of Poultry Science v. 90, p136-146, 2011