O profissional Julio César Palhares, da Embrapa Suínos e Aves, concedeu entrevista ao Engormix.com e comentou sobre a gestão ambiental de resíduos animais, fez um resumo do seu perfil acadêmico, além de pontuar desafios e avanços nas questões ambientais no setor da produção animal. Boa Leitura.
1.Um resumo do seu perfil profissional.
Zootecnista, com Mestrado na área de concentração em Energia na Agricultura e doutorado em Ciências Ambientais. Desenvolvo pesquisas relacionadas a: impacto ambiental dos resíduos animais nos recursos hídricos, gestão ambiental de propriedades rurais, manejo de bacias hidrográficas caracterizadas pela intensa concentração pecuária e legislação ambiental relacionada as atividades pecuárias.
2- Uma apresentação do seu tema de estudo; problemáticas vividas, últimas inovações, enfoque atual.
O manejo dos resíduos animais ainda é um tema de pouca expressão nos meios acadêmicos e científicos nacionais, por esses desconhecerem os reais impactos ambientais que as produções pecuárias podem causar, mas o Brasil já dispõe de massa crítica em universidades, empresas e institutos de pesquisa capaz de auxiliar a sociedade na busca pela sustentabilidade dessas produções. A discussão ambiental nas atividades pecuárias ainda se restringe as regiões onde essas produções se apresentam com alta concentração ou quando implica na degradação de biomas ameaçados. Mas a sociedade está mudando seus valores ambientais, com isso as atividades pecuárias serão cada vez mais questionadas sobre sua relação com a conservação dos recursos naturais. O Brasil já dispõe de técnicas e tecnologias a fim de mitigar os impactos, cabe as cadeias produtivas e a sociedade internalizarem o assunto em seus cotidianos para que os avanços ocorram e decisões sejam tomadas. O grande desafio que se faz presente é a carência de mão de obra capaz de manejar ambientalmente as produções, apesar do conhecimento acumulado no meio científico, a transferência desse para o campo necessita de mão de obra qualificada, o que hoje não dispomos.
3- Como surgiu o interesse pelo tema de estudo e/ou área de trabalho?
Atuo nessa área desde minha graduação, sendo que minha monografia abordou a avaliação do impacto nos recursos hídricos de sistemas de piscicultura integrada. O interesse pelo tema foi facilitado, pois na Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias de Jaboticabal/UNESP havia um tradicional grupo de pesquisa nessa temática. Em contato com esse grupo, segui os passos dos que ali estavam, especializando-me em impactos nos recursos hídricos. A ciência e a realidade do campo sempre me mostraram o manejo ambiental das atividades pecuárias era uma área enorme para a formulação de pesquisas e de grande importância social. Hoje sou pesquisador de um dos grandes grupos de pesquisa na área e referencia para pesquisas relacionadas a suinocultura (Embrapa Suínos e Aves) e também sou sócio fundador e da atual diretoria da Sociedade Brasileira dos Especialistas em Resíduos das Produções Agropecuária e Agroindustrial.
4- Comentar uma experiência profissional interessante.
Como pesquisador penso que a mais interessante ou de maior importância ainda está por vir, pois é inerente a nossa carreira impor-se desafios, mas posso dizer que até o momento a mais interessante foi a participação no Termo de Ajustamento de Conduta da Suinocultura da Região do Alto Uruguai Catarinense. O Termo é um instrumento jurídico utilizado por muitos promotores, mas nunca havia sido proposto para a atividade suinícola e em uma escala regional. As discussões para implantação deste começaram em 2001, envolvendo todos os atores da cadeia produtiva, sendo esse assinado em 2004. Neste ano as atividades de campo começaram e a Embrapa Suínos e Aves era uma das responsáveis técnicas. Assim, delineamos um projeto de avaliação do Termo, pois até aquele momento não sabíamos se esse instrumento era o melhor a ser utilizado. Fiquei responsável pela avaliação ambiental e o pesquisador Cláudio Rocha de Miranda, também da Embrapa, pela avaliação socioeconômica. O término do Termo se deu em 2009, mas esse foi renovado até 2012. Essa renovação se baseou nas conquistas alcançadas até aquele momento, ou seja, todos os signatários possuíam licença ambiental para atividade e estavam promovendo a recuperação das matas ciliares. O maior valor do Termo está em sua importância social por ter envolvido todos os atores da cadeia entorno de um objetivo comum e internalizar o assunto no cotidiano da sociedade. Outros Termos foram assinados no Estado de Santa Catarina, baseados na experiência deste primeiro. Essa está sendo uma experiência positiva de como a ciência pode transferir seus resultados para o bem de todos e como o manejo ambiental, quando baseado no conhecimento, produz avanços e reduz os conflitos.
5- Como vê as discussões futuras sobre seu o tema de estudo? Qual o rumo está tomando? Pontos positivos e negativos.
Sem dúvida a suinocultura é a atividade que tem o maior histórico ambiental no país. Pode-se dizer que já são duas décadas de intensas discussões, principalmente, nos Estados do Sul. Recentemente, a bovinocultura de corte tem sido o foco das atenções devido a sua relação com o bioma amazônico. Quanto ao futuro ambiental das outras atividades pecuárias o horizonte está mais aberto, pois não há um passado e, na maior parte das vezes, um incipiente presente. Independente, da cadeia produtiva, pode-se afirmar que todas terão que inserir o manejo ambiental em seus cotidianos no curto prazo, quem não o fizer sofrerá sanções ambientais, sociais e econômicas. Como não há muito tempo, devemos, primeiramente, educar os atores e formar profissionais capazes de manejar ambientalmente as produções. Outros pontos importantes são: utilizar ferramentas nutricionais ambientalmente benéficas; otimizar o uso dos recursos naturais renováveis e não-renováveis, com destaque para água e energia; utilizar tecnologias de tratamento de resíduos, principalmente nos territórios caracterizados pela elevada concentração de animais; pautar-se pelo balanço de nutrientes no uso dos resíduos como fertilizante; ter conhecimento do custo ambiental da atividade; utilizar indicadores de desempenho ambiental.
6- Teria algum recado para deixar aos colegas profissionais e acadêmicos que estão atuando na mesma área?
Posso dizer que os colegas que atuam na mesma área podem ser caracterizados como abnegados, com isso não digo que os pesquisadores que atuam em outras áreas não o sejam, mas, particularmente, na temática produção animal e conservação ambiental, a maré ainda não está para peixe! Mas cada vez mais a ciência vai ser questionada sobre esse tema e devemos estar prontos para responder. Por isso, os alunos de graduação e pós-graduação que pretendem trabalhar nessa área terão um rico horizonte de atuação. Quando comecei a situação era menos confortável, mas acreditei na importância desse tipo de pesquisa e hoje digo que estava certo. Estudos mostram que o Brasil será o grande produtor de proteína animal do mundo, isso se dará nos próximos dez anos, devemos nos orgulhar disso, não só pela importância econômica e social, mas também por chegarmos nessa posição de forma equilibrada ambientalmente, conservando as riquezas naturais que dispomos, pois são elas que propiciarão a perpetuação de nossa condição de potência agropecuária mundial.
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Veja o perfil de Julio Cesar Palhares, no Engormix.com.
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