Mais que a soma de enzimas, são vários os efeitos que podemos esperar da combinação do uso de diferentes enzimas na mesma dieta.
O uso de fitase já está estabelecido como padrão, pelo seu retorno econômico e efeito ambiental, mas muitas questões ainda precisam ser respondidas quanto ao seu funcionamento. Como exemplo destas questões, temos: a afinidade de cada fitase pelos fósforos (P) do Acido Fítico além dos situados nas posições 3 (P3) e 6 (P3); a discussão sobre a matriz nutricional; as diferentes formas de avaliação da atividade de uma fitase; e finalmente, as discussões sobre comparações de qualidade dos produtos enzimáticos, seja ela física ou de sua própria atividade enzimática.
Além disto, com as comprovações da eficiência do uso de produtos multienzimáticos a base de xilanases e glucanases para qualquer tipo de dieta, o contexto do uso de enzimas se complexa ainda mais. Ver quadro abaixo.
Quadro 1.: Efeito das enzimas isoladas
Além das possibilidades de resposta nutricional produzidas por uma fitase, vamos somar as muitas possibilidades que compõe a resposta dos complexos enzimáticos compostos por carbohidrases. E esta não parece ser uma soma matemática simples, especialmente para quem trabalha no sentido de uma Nutrição de Precisão.
Vejam também que a maioria dos estudos de comprovação da eficiência das enzimas analisa cada enzima comercial isoladamente, mas posteriormente nos deparamos com fitases sendo utilizadas conjuntamente a estes outros grupos de enzimas.
Será que teremos o mesmo efeito?
O efeito positivo das enzimas quanto a melhora de digestibilidade de aminoácidos pode ser comparado a variação da digestibilidade natural do aminoácido do ingrediente vegetal. Em teste de campo, este efeito pode ser facilmente mascarado por uma boa qualidade da soja utilizada no período do teste... E o inverso também pode acontecer.
Para se ter uma idéia da dificuldade destes trabalhos, experimentos de Geraert et al. mostram que um estudo de digestibilidade pode apresentar resultados variando em 25% apenas pela variação da qualidade da coleta de excreta.
Outros estudos demonstram variações nos conteúdos aminoacídicos e energéticos dos macroingredientes de ordem de 3 a 10%, para produtos de mesma avaliação de qualidade no mercado.
A fim de encontrarmos as respostas mais adequadas, temos desenvolvido pesquisas in vitro e in vivo, sejam em gaiolas metabólicas, galpões experimentais ou condições de campo, com enzimas especialmente voltadas para as análises dos efeitos do uso do complexo Fitase+Carbohidrases; e podemos dizer que as respostas têm se apresentado um pouco diferentes das observadas com o uso isolado destes produtos.
É, sem dúvida, uma resposta mais econômica e ambientalmente mais amigável que o uso isolado destes produtos enzimáticos, porém é ainda mais eficiente quando há mais rigor no controle dos ingredientes e nutrientes da dieta. Estes estudos vêm sendo feitos tanto em frangos de corte, quanto em poedeiras e suínos.
Assim, partir do efeito individual de cada enzima (ver exemplo no quadro 2), e conhecendo as condições em que esta enzima pode atuar (quadro 3), começamos a adequar o uso das enzimas à estratégia de formulação que cada nutricionista utiliza.
Quadro 2: variação da atividade de algumas enzimas, e podemos observar a importância do pH do trato intestinal neste processo, em estudo da Universidade de Mc Gill no Canadá
Quadro 3: o efeito de uma enzima é específico para cada tipo de ligação química.
Pois, cada enzima tem uma atividade específica no trato intestinal, e atua melhor sob determinadas circunstâncias, podendo ser mais eficiente ou não, quando na presença de outras enzimas.
As paredes celulares dos ingredientes vegetais, ricas em polissacarídeos não amiláceos, especialmente os arabinoxilanos, beta-glucanos, celuloses, hemiceluloses e pectinas, formam uma complexa organização de diversos monômeros, com diversas formas de ramificações, unidos por ligações tipo beta, que retêm nutrientes, restringindo seu aproveitamento. As carbohidrases atuando sobre estes componentes alteram positivamente o acesso das enzimas endógenas como amilases e proteases, e até mesmo da fitase, aumentando a digestibilidade destes nutrientes. Assim, os componentes nutricionais dos ingredientes vegetais da ração são aproveitados ainda mais eficientemente, aumentando o desempenho animal, além de ocorrer redução da umidade das excretas e menor emissão de amônia na atmosfera do galpão, melhorando as condições de criação.
Devemos ainda considerar outras variações importantes: quando uma dieta sem enzimas tem incluído o complexo fitase+carbohidrase, podem ocorrer importantes alterações de percentuais de macroingredientes nas dietas, especialmente os derivados de soja, assim como também diminuição no nível de extrato etéreo, e no perfil de ácidos graxos da dieta. Estas alterações devem ser avaliadas a cada fórmula, e eventualmente restringidas a fim de que não ocorram imprevistos. Exemplo de alteração que deve ser limitadas: uma diminuição muito drástica da inclusão de uma boa soja integral, substituída por um farelo de baixa qualidade de fornecedor pouco conhecido. Nutricionalmente, as dietas podem ser similares, mas a diferença de qualidade dos ingredientes, o desconhecimento do novo ingrediente em alta inclusão, a menor densidade nutricional, um aumento grande na quantidade de fibra, e uma diminuição importante na quantidade de ácidos graxos (diminuindo a energia líquida da ração) podem causar um impacto no desempenho, ainda que o custo por tonelada produzida deva ser compensador.
Já existe uma combinação fitase+carbohidrase, registrada na Europa, EUA e Brasil, que provou ser eficiente em frangos de corte, poedeiras, perus, patos, suínos, e leitões. Nesta combinação de 6-fitase proveniente do Schizosaccharomyces pombe, com um complexo de carbohidrases originadas do Penicillium funiculosum, conseguimos, por exemplo, melhorar a disponibilização do fósforo (P), acima dos valores de P da fitase isolados. Também outros fatores como a digestibilidade dos Aminoácidos e Energia Metabolizável apresentaram variações em função da combinação, da dieta utilizada, e da espécie testada.
Como principais efeitos práticos desta combinação temos a diminuição da viscosidade intestinal, mesmo em dietas com base em milho, com aumento de energia em mais de 80 kcal/kg, e 3% maior percentual de aminoácidos digestíveis (porém menor que a soma dos valores isolados das enzimas), e liberação do P fítico próximo aos 0,15%, acima de valores encontrados nas dietas de fitase.
A conclusão que chegamos é que primeiro devemos conhecer profundamente os produtos que queremos utilizar, e não serão apenas experimentos de desempenho que devem ser utilizados como base para definirmos pelo uso de enzimas.
Passada esta fase, devemos encontrar o ponto de equilíbrio da matriz nutricional para cada estratégia nutricional, a fim de que o uso da combinação enzimática fitase+carbohidrases alcance os objetivos estabelecidos. Esta é hoje a melhor opção para quem busca vantagens competitivas, sejam elas econômicas, ambientais ou zootécnicas.
*Pesquisas do Prof. Dr. Kermasha do Department of Food Science and Agriculture Chemistry (Departamento de Ciência dos Alimentos e Química Agrícola), McGill University, Montreal, Canadá, identificaram e quantificaram as atividades enzimáticas acima.