1 Introdução
Atualmente os frangos de corte vêm apresentando índices de desempenho produtivo muito superiores aos obtidos no passado. Inúmeras modificações foram feitas para que os índices atuais fossem atingidos, desde mudanças genéticas (em aspectos morfológicos e fisiológicos) até práticas de manejo. Todas estas alterações contribuiram para o aparecimento das chamadas síndromes, geralmente distúrbios fisiológicos e/ou metabólicos, representados pela manifestação de um estado mórbido causado por múltiplos fatores que podem agir isoladamente, ou em sinergismo (Jaenisch et al., 2001).
As lesões de pele em frangos de corte têm despertado interesse em função dos prejuízos causados aos produtores, decorrentes de perdas no abate, como condenações de carcaça e redução de valor do produto final, devido a lacerações de carcaças. A ocorrência de lesões de pele tem sido relacionada com problemas de mau empenamento em aves, alteração esta, que até o presente momento, parece ser de etiologia multifatorial, visto que o processo de empenamento pode ser influenciado principalmente por fatores nutricionais, hormonais, genéticos e ambientais.
A idéia de que há multifatores envolvidos é reforçada pelo fato de que ao se isolar fatores nutricionais ou mesmo de manejo, como temperatura ou restrição alimentar, o quadro de mau empenamento visto em aviários não se reproduziu. A possibilidade de que diversos fatores interajam para gerar o problema visto em integrações, sugere tratar-se de uma Síndrome do Mau Empenamento.
O mau empenamento origina perdas econômicas diretas na comercialização de aves vivas, aumentando os custos de produção do frango abatido pelo aumento do número de carcaças condenadas. Também na redução da rentabilidade dos integrados, o mau empenamento é fator preponderante, pois limita o número de aves a serem criadas por área. A empresa avícola perde a flexibilidade de aumento sazonal do alojamento de aves e, portanto, de maior produção por m2 em épocas de preços elevados da carne de frango (Barbi e Zaviezo, 2000).
A redução do número de penas, principalmente na região dorsal das aves, caracteriza a grande maioria dos casos de mau empenamento atualmente. Acomete frangos de corte produzidos em lotes com bom desempenho zootécnico, sem comprometer o ganho de peso da ave afetada, nem aumentar a taxa de mortalidade do plantel (Coello, 2000). O problema é observado principalmente em machos, em condições de temperatura elevadas e criados sob altas densidades. Na região afetada, penas com estruturas incompletas e necrose dos folículos podem ser observadas. Ao exame histológico observa-se hiperplasia do tecido conjuntivo que circunda o folículo da pena, o qual pode invadir a polpa do folículo e determinar sua oclusão (Jaenisch et al., 2001).
A composição normal das penas é apresentada na Tabela 1, sendo que desvios superiores a 15% destes valores devem analisados com atenção.
Tabela 1 — Composição médias das penas
As penas estão constantemente sendo desprendidas e regeneradas, porém o número de folículos de uma ave adulta é semelhante ao encontrado no embrião. As penas possuem um crescimento cíclico, alternado com períodos de repouso. Uma nova pena idêntica à anterior poderá crescer no mesmo folículo (Furlan & Macari, 1998).
2 Fatores nutricionais que podem causar o mau empenamento
Como já foi dito, muitos são os fatores que podem agir para um mau empenamento das aves. Um deles é a proteína total da dieta e aminoácidos específicos, tais como metionina, cistina, arginina, isoleucina, leucina, valina, lisina, treonina e triptofano.
A proteína é considerada por alguns como um fator crítico para empenamento e dois aspectos devem ser observados: 1) em que fase da vida da ave a proteína é mais crucial para o empenamento e, 2) como o nível de energia da dieta afeta o consumo de proteína e, consequentemente o empenamento. A literatura propoem que o período de incubação e os primeiros 21 dias de vida são muito importantes para o desenvolvimento do folículo da pena e empenamento, e que a quantidade e qualidade da dieta inicial afeta o número de carcaça riscada no abatedouro (LUCAS & STETTENHEIM, 1972; BILGILI & HORTON, 1995).
Em relação à quantidade de proteína, SI et al. (2000) demostraram que o peso das penas e a quantidade de penas em relação ao peso vivo foram afetados somente quando a proteína bruta da dieta inicial (0 a 21 dias) esteve abaixo de 18%. Em todos os níveis de proteína, os aminoácidos metionina, lisina, treonina, arginina, triptofano, valina, isoleucina e fenilalanina estiveram presentes em quantidades adequadas. No entanto, ganho de peso e conversão alimentar foram negativamente afetados num momento anterior, com níveis de proteína bruta abaixo dos 20%, independente da suplementação de aminoácidos cristalinos.
Estudando o efeito de proteína no canibalismo de pena, TWINING et al. (1976) sugeriram que este fenômeno ocorre mais frequentemente em machos do que em fêmeas, e que dieta de crescimento (28 a 49 dias) com proteína bruta de 17% ocasionou maior canibalismo do que com 21.5%.
AJANG et al. (1993) demonstraram o efeito da proteína no comprimento de pena do dorso aos 28 dias, mas não aos 14 ou 42 dias (Tabela 2), independentemente da linhagem ser de rápido ou lento crescimento. Porém, a proteína também afetou o peso vivo em todas as idades, com menores ganhos de peso para níveis protéicos mais baixos.
Tabela 2 — Efeito de níveis protéicos e linhagem de empenamento rápido ou lento em comprimento de pena do dorso e peso vivo de machos
A deficiência de lisina pode levar à despigmentação das penas. Um desbalanceamento entre aminoácidos de cadeia ramificada na dieta (leucina, isoleucina e valina) gera penas de formato côncavo anormal, que dobram-se para fora do corpo da ave, neste caso o quadro geralmente está associado à redução de peso e pior conversão alimentar. FARRAN & THOMAS (1992) utilizando dieta deficiente em valina, à base de trigo, farelo de amendoim e glucose observaram este efeito. Excesso de leucina na dieta (PENZ et al., 1984) ou deficiência de valina na dieta (FARRAN & THOMAS, 1992) causaram, também, redução no conteúdo de proteína das penas.
Para metionina, LOPÉZ-COELLO et al. (1994) compararam experimentalmente fontes de metionina quanto à cobertura de penas e não encontraram diferenças significativas entre as fontes (Tabela 3).
Tabela 3 — Penas como porcentagem do peso vivo em aves sexáveis e não sexáveis com 49 dias de idade e tratadas com diferentes fontes de metionina
Quando à arginia, sua relação com lisina tem sido estudada. BALNAVE et al. (1999) sugeriram que em condições de estresse por calor uma relação arginina:lisina maior que 1.20 traria efeitos positivos no consumo de alimentos e ganho de peso com dietas suplementadas com HMB. BRAKE (1999) sugeriu que o nível de cloro da dieta influencia o antagonismo entre arginina e lisina. STUTZ et al. (1971) demostraram a redução da ocorrência de penas dobradas com o aumento da relação arginina:lisina ou com o aumento do nível de potássio nas dietas.
Minerais e Vitaminas são outros grupos de nutrientes que requerem atenção no caso de mau empenamento. Como possíveis potencializadores de problemas de empenamento encontram-se o zinco, o manganês, o selênio, o cobre e o molibdênio e entre as vitaminas, a niacina, a colina e a vitamina E.
Os sintomas de deficiência de zinco, descritos na literatura, variam desde pobre crescimento de penas a penas frisadas distanciando-se do corpo e problemas de estrutura em penas primárias. Na pele de aves deficientes em zinco observa-se espessamento da epiderme, hiperqueratinização e degeneração de folículos de penas. COOK et al. (1984) sugerem atenção nos níveis de cobre e ferro da dieta, pois excessos destes minerais podem influenciar negativamente a absorção de zinco.
O balanço eletrolítico é outro aspecto a ser analisado. Alguns pesquisadores sugerem que níveis marginais de sódio e potássio e níveis altos de cloro seriam uma importante causa de mau empenamento em frangos e matrizes. Níveis de sódio de 0.22-0.24%, de potássio entre 0.9 - 1.0% e nível máximo de cloro de 0.35% minimizariam o problema (BARBI e ZAVIEZO, 2000). Outros nutricionistas sugerem que o importante é o balanceamento de íons descrito como número de Mongin (MONGIN, 1981).
Entre as vitaminas, a deficiência de vitamina E (e selênio) pode gerar anormalidades em penas seguida da presença de sangue na base da pena. Selênio e manganês (e zinco) estão associados a fatores antioxidativos no metabolismo de aves e assim, indiretamente relacionados com a vitamina E e C. É importante observar os níveis de niacina porque esta vitamina está ligada à minimização de histeria em aves, à semelhança do triptofano. A colina, por participar na doação de metila no metabolismo animal, é outra vitamina cujos níveis devem ser observados.
A presença de micotoxinas é um outro fator que afeta o empenamento das aves, em especial a T-2. O efeito "aves helicóptero" com penas em estrutura anormal viradas para fora do corpo é um bom exemplo. Em aves nas quais a toxina foi colocada no papo detectou-se necrose de células regenerativas na base das penas (HOERR et al, 1981). As micotoxinas comprometem a síntese protéica por interferir no metabolismo de RNA/DNA. A presença de micotoxinas nos alimentos de aves pode ocasionar perda de estrutura da pena e redução de quantidade de penas, mas estes efeitos parecem estar ligados também à perda de peso e piora na conversão alimentar.
3 Fatores de manejo e comportamento
Temperatura e umidade alta nos aviários, restrição de consumo, disponibilidade de comedouros e bebedouros, densidade de aves por m2 de aviário e tamanho de aviários ou utilização de boxes dentro de aviários são fatores que podem estar ligados a problemas de mau empenamento.
As temperaturas altas geram restrição de consumo e consequentemente poderiam gerar uma deficiência de nutrientes e problemas de empenamento. BARBI e ZAVIEZO (2000) relatam um experimento com linhagem de conformação, onde a elevada temperatura de aquecimento de pintinhos nos primeiros 21 dias (34° C nos primeiros 7 dias e 32° C de 7 a 21 dias) causou redução de consumo de alimento nos primeiros 21 dias de vida > este quadro porém, não gerou problemas de empenamento, mas afetou a quantidade de penas depositadas. Por outro lado, KRUEGER (1994) sugere que excesso de aquecimento de pintinhos afeta empenamento por atrasar o crescimento de penas e consequentemente a cobertura do corpo da ave.
COOPER & WASHBURN (1998) encontraram maior percentagem de penas em relação ao peso vivo (peso:peso) ao compararem aves criadas a 21° C (6.22% de penas) com aves criadas a 32° C (5.03% de penas). GERAERT et al. (1996) também encontraram redução na quantidade de penas de aves criadas em temperaturas mais altas, e mostraram que este efeito não estaria ligado somente à redução no consumo de alimento, mas à temperatura per se (Tabela 4).
Tabela 4 — Peso vivo e peso de penas de aves com 6 semanas de idade, criadas em à 32 ou 22° C. Nas aves a 22° C temos dois grupos: (1) consumo à vontade ou (2) consumo idêntico aos das aves criadas à 32° C
O aumento da densidade de aves por m2 tende a potencializar o problema de empenamento. Nestes casos, o mau empenamento parece estar mais relacionado com canibalismo de penas do que com não crescimento das mesmas. O nervosismo dos frangos de corte muitas vezes observado em lotes com problemas de empenamento sugere que a bicagem de pena é uma questão a ser observada (BARBI e ZAVIEZO, 2000). Estes autores sugerem que entre os fatores que podem potencializar a bicagem de penas tem-se nutrição desbalanceada, intensidade e quantidade de luz (luz intermitente com iluminação uniforme e intensidade mais baixa é relacionada com aves mais calmas), disponibilidade de bebedouros e comedouros, uso de ração peletizada, alta densidade de aves por m2 , aquecimento excessivo do pintinho, ventilação deficiente, baixa umidade e qualidade da cama.
O grau de empenamento das aves está muito relacionado com a freqüência de riscos na carcaça. Na fase pré-abate, a maneira como as aves são apanhadas no galpão para carregamento até o abatedouro, também pode gerar riscos em carcaças. "Apanha" durante a noite e uso de luz azul é recomendado em lotes mal empenados para minimizar riscos na carcaça.
4 Conclusões
Mau empenamento é um problema complexo que acomete as criações esporadicamente. Fazer generalizações a respeito de suas causas é um erro na análise, pois bloqueia o raciocínio para interações importantes. Sugere-se a manutenção de uma sistemática coleta de dados na integração para avaliar o problema em termos econômicos e de produtividade e para avaliar adequadamente as mudanças adotadas na nutrição e manejo e assim, identificar os fatores mais críticos da Síndrome de Mau Empenamento. É necessário também estabelecer um padrão de comprimento e estrutura de penas de dorso, rabo e de penas primárias e secundárias (asas), assim como padrão de área de dorso e de peito cobertos com penas em idades específicas e em linhagens específicas para as diferentes épocas do ano e genética.
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