Introdução
A doença de Marek (EM ou MD), um transtorno linfoproliferativo das aves domésticas que existe em praticamente todas as explorações comerciais de frangos em todo o mundo, caracteriza-se por infiltrações de células mononucleares em nervos periféricos e vários outros órgãos e tecidos (Calnek & Witter, 2000; Schat & Nair, 2008; Witter & Schat, 2003).
A EM tem sido considerada a mais grave das muitas doenças infecciosas que afetam os lotes de aves e ainda é um problema na Argentina. Estudos de "falhas de vacinação" da EM no país têm sido realizados desde 1988 (Buscaglia et al., 1998; Buscaglia et al., 1999; Buscaglia et al., 2001). A Argentina é o segundo país da América Latina com maior superfície depois do Brasil e o oitavo no mundo. Encontra-se no sul do continente sul-americano e ocupa uma superfície continental de 2.766.890 km² (1.068.302 sq mi). Apresenta 5.121 km (umas 3.182 milhas) de longitude de norte a sul, e 1.400 km (aproximadamente 870 mi) de leste a oeste. A Indústria avícola tem aproximadamente uma quantidade de: 500.000.000 de frangos de corte e 33.000.000 poedeiras.
Os isolamentos das linhagens de campo dos vírus da EM (EMV ou MDV) de lotes vacinados nas províncias de Buenos Aires e Entre Ríos (Argentina) se caracterizaram como linhagens muito virulentas (VV) e muito virulenta "plus" (VV+) durante a década de 1990. A caracterização de quatro linhagens argentinas do vírus da doença de Marek como muito virulentas foi publicada em 2004, juntamente com a influência de um desses isolamentos no sinergismo entre os vírus das vacinas contra a doença de Marek (Buscaglia et al., 2004). A infecção experimental com estes vírus causou uma alta incidência de EM em ambas as linhas de aves resistentes N-2a e suscetíveis P-2a (Buscaglia et al., 2001; Buscaglia et al., 2004).
Dificuldades com o surgimento da EM em lotes vacinados ainda são um problema devido principalmente a: 1) má administração das vacinas, 2) precoce e forte exposição ao vírus, incluída a presença de VV+ MDV que podem anular a imunidade da vacina. 3) presença de outros agentes imunossupressores como o vírus da anemia infecciosa (VAIP) e o de reticuloendoteliose (VRE) e 4) a adição de antibióticos às vacinas contra EM. Distintos antibióticos (gentamicina A e B e Ceftiofur A e B) foram avaliados (Buscaglia, comunicação pessoal). As vacina comercial HVT foi utilizada. Foi estudada a influência da adição de um antibiótico sobre a sobrevivência dos vírus vacinais contra a EM. Este estudo se realizou para determinar o efeito de acrescentar o mesmo antibiótico, mas a partir de dois laboratórios diferentes, a vacinas comerciais da EM e avaliá-lo in vivo e in vitro. Embora se saiba que a mistura de qualquer antibiótico com as vacinas de EM não é recomendável porque pode prejudicar sua viabilidade, a adição de um antibiótico se transformou numa prática comum para impedir a mortalidade precoce de pintinhos. Os resultados não mostram diferenças significativas na titulação de HVT em 30 minutos após ter sido diluído na presença de ceftiofur A ou B. Os títulos depois de 120 minutos de incubação com o produto B eram levemente mais baixos (Buscaglia & Prada, 2005; Buscaglia, 2007; Buscaglia, 2008).
O objetivo do presente trabalho consistiu em diagnosticar novos casos de EM através das lesões macroscópicas e histopatologia e avaliar a presença da EM em populações vacinadas de poedeiras e frangos de corte, o impacto na mortalidade e produção de ovos das granjas afetadas e sua relação com AIPV e VRE que continuam em estudo.
Materiais & Métodos
História da EM numa empresa dedicada à produção de ovos.
A empresa tem 4 granjas de poedeiras e 2 granjas de recria. Destas últimas existe uma de 12.000 aves criadas em piso, próxima de uma das granjas de poedeiras e outra de 40.000 aves criadas em gaiolas e mais isolada.
O primeiro surto de EM foi registrado em 2005, na granja de criação em piso. A origem do surto foi a partir de umas aves importadas do Brasil, provenientes de uma companhia que atualmente já não existe. Nessa granja de recria aparecem surtos de EM quando os animais completam aproximadamente 17 semanas de idade. Durante este tempo, diferentes empresas adquiriram novas aves e as vacinas utilizadas foram HVT (herpesvírus de peru) + Rispens no primeiro dia (Buscaglia & Viora, 2010). Somente no último surto as aves receberam uma vacina recombinante de HVT + Gumboro e a mortalidade se iniciou aproximadamente às 6 semanas de idade.
Os frangos para grelhados receberam a vacina HVT misturada com gentamicina.
As aves mortas ou abatidas foram autopsiadas e se registraram as lesões macroscópicas. Os tecidos que eram questionáveis foram submetidos a um exame histopatológico e fixados em formol a 10% para logo após serem incluídos em parafina e cortados. As seções foram pintadas com hematoxilina-eosina (H&E) e foram examinadas ao microscópio óptico.
Resultados & Discussão
O grupo de poedeiras que recebeu a vacina recombinante pertencia a um lote muito desigual no momento de serem vacinadas. A mortalidade foi de 8% na primeira semana, chegando ao 18% atual e sem sinais de deter-se ou regredir. Foram observadas lesões nas cristas, cuja confirmação por estudos histopatológicos estão em processo.
Histopatologicamente, se observou uma abundante infiltração celular nos órgãos estudados. Detalhes dos cortes anteriores (40X) evidenciaram, no fígado, atrofia do parênquima reduzido a grupos de hepatócitos Pleomórficos, isolados entre si, com relação núcleo-citoplasma superior à normal. Foram observados também focos de necroses e aumento do estroma por hemorragia, fibroses, pigmentos biliares e infiltração de linfócitos pequenos bem diferenciados. Os cortes de baço mostraram infiltração da cápsula por células linfoides atípicas, pleomórficas, de núcleo arredondado ou ovalado, hipercromático e citoplasma irregular. Células similares às descritas foram disseminadas na polpa vermelha.
Na união proventrículo-moela se observou a mucosa manifestamente inchada devido à infiltração de células linfoides atípicas, pleomórficas, com núcleo arredondado e citoplasma de contorno irregular. Os núcleos evidenciaram nucléolo único ou múltiplos proeminentes, mitoses aberrantes e tamanho variável. Também foram observadas células necróticas entremisturadas, ou então focos de necroses destas células. A infiltração afetou também o interstício muscular. Outros tecidos entre os quais se encontram bolsas de Fabrício, nervos e cristas, ainda não foram observados por microscópio.
Como se expõe neste trabalho, a EM continua sendo um problema na Argentina. Aqui mostramos novos casos numa população vacinada de poedeiras diagnosticadas a partir de lesões macroscópicas e histopatologia.
Do mesmo modo que em outras partes do mundo, onde o surgimento de linhagens de campo ultrapassaram a capacidade de proteção da vacinação trivalente, na Argentina a presença de linhagens do VEM com maior virulência, não deveria surpreender. Com certeza, isto provocará um impacto na mortalidade e na produção de ovos das granjas afetadas. Como exemplo, se anexam 2 figuras (Figura 1 e Figura 2) procedentes de um dos lotes afetados.
Figura 1. Curva de mortalidade de uma granja de poedeiras contaminada pela Doença de Marek.
Figura 2. Curva de postura da mesma granja descrita na Fig. 1.
Nos frangos para grelhados, a mortalidade foi de 1% diária e aos 35 dias de idade a autópsia mostrou também aerossaculite e síndrome de cabeça inchada, tipo coriza. De qualquer maneira, a EM foi diagnosticada por histopatologia.
Conclusões
A EM ou MD continua sendo um problema na Argentina. Aqui apresentamos uma mortalidade de 15% num lote de galinhas poedeiras, causada pela MD. O surto foi diagnosticado por lesões macroscópicas e confirmado por histopatologia, da mesma forma que nos frangos para grelhados. A queda de postura não foi significativa. A vacina que receberam os frangos mencionados contra a MD tinha sido misturada com gentamicina e seu efeito sobre a viabilidade da vacina é uma possível explicação do surto. A avaliação de dados pertencentes a outros lotes de poedeiras e outros cortes de tecidos está sendo analisada, da mesma forma que a possível influência dos VAIP e REV.
Bibliografia
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