1.1. Introdução
Durante o último século e início deste, o mundo se fez dependente de energia de fontes não renováveis, os combustíveis fósseis, os quais contribuem intensivamente ao aquecimento global. Estes combustíveis oriundos do petróleo tiveram por várias vezes seus fornecimentos comprometidos e preços super valorizados por crises políticas e econômicas. Por isso, durante os últimos decênios estudos relacionados à produção de energias de fontes renováveis tem-se intensificado no meio rural em especial na avicultura, no sentido de substituir a fonte de energia até agora utilizada.
A partir da crise do petróleo nos anos 70, ocorreu uma busca de fontes alternativas de energia, no Brasil e no mundo. Para o meio rural, a alternativa que se mostrou promissora foi o biogás obtido com a biodigestão anaeróbia de material orgânico vegetal e/ou animal. Considerando a elevação crescente dos preços dos insumos energéticos, o que torna extremamente cara a utilização de combustíveis de natureza fóssil, a vocação avícola do Brasil e suas condições climáticas, verifica-se que a geração de biogás, juntamente com outras formas de energia relacionadas à biomassa, constitui-se em importante alternativa de fornecimento de energia às propriedades avícolas, contribuindo para sustentabilidade da cadeia produtiva.
Visto que, ao longo de 2008 uma empresa de fornecimento de energia elétrica desenvolveu um projeto piloto (com respaldo em autorização concedida pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), eficaz e de baixo custo para o gerenciamento e geração de eletricidade pelo produtor rural. E de forma pioneira em janeiro de 2009, fez uma chamada pública inédita no Brasil para comprar energia elétrica produzida com biogás gerado por dejetos de animais. O objetivo da empresa é adquirir a energia elétrica produzida em instalações com no máximo 300 kW (quilowatts) de potência instalada cada, até atingir um limite de 3 mil kW no total. Com essa potência, seria possível atender aproximadamente 600 residências de padrão médio de consumo. O resultado dessa chamada pública foi a contratação de seis empresas que geram de 20 a 240 kW com preço de venda de até R$ 129,72/MWh.
O setor avícola só tem a ganhar com estas iniciativas, visto que a produção de cama de frango está intimamente ligada a geração de energia térmica através da produção de biogás.
Registra-se que em 2008 foram produzidos no Brasil 5,08 bilhões de pintos de corte, que resultaram a produção de 11,03 milhões de toneladas de carne, consagrando o Brasil como o maior exportador mundial de carne de frango por cinco anos consecutivos (ABEF, 2009; UBA, 2009). Considerando-se a produção média de cama de 2,19 kg por frango de corte na matéria natural (MN) (SANTOS e LUCAS JR., 2003) estima-se, portanto que em 2008 foram produzidos aproximadamente 11,12 bilhões de kg de cama de frango (MN).
À medida que a produção nacional de frangos aumenta, maiores quantidades de cama são geradas sendo notória a necessidade eminente de se pensar nas possibilidades de manejo e de destino deste resíduo a fim de minimizar os impactos por ele causados, principalmente pelas elevadas concentrações de nitrogênio e carbono orgânico presente no material.
Entre as novas opções de manejo de resíduos encontra-se a separação das frações sólidas e líquidas com destinos diferenciados dentro da propriedade, aonde a fração líquida teria o destino da biodigestão anaeróbia e a fração sólida a compostagem. No entanto, para uma otimização do processo de biodigestão anaeróbia, esse substrato residual, a fração líquida, pode precisar de ajustes em suas características de sólidos totais e diluições necessárias visando o melhor desempenho do biodigestor com a menor diluição possível.
O conteúdo de sólidos totais do resíduo líquido do efluente pode ser separado, em termos gerais, entre aquele dissolvido e o presente como matéria suspensa. De acordo com este fato, um fracionamento útil do material suspenso pode ser realizada para refletir a performance dos principais grupos de equipamentos de separação disponíveis. Estas frações são constituídas por sólidos dissolvidos, partícula coloidal, sólidos finos, grossos e fibras (BURTON, 2007).
Neste sentido muitos estudos surgiram nas últimas décadas para avaliar a biodigestão anaeróbia de dejetos de aves com a finalidade de otimizar a produção de biogás (JONES JR e OGDEN, 1984; WEBB e HAWKES, 1985; LUCAS JR et al., 1993; CHEN e SHYU, 1998; ITODO e AWULU, 1999; SANTOS, 2001; STEIL et al., 2002; AUGUSTO, 2007; FUKAYAMA, 2008; AIRES et al., 2008).
A biodigestão anaeróbia de excretas, uma das formas de bioconversão, oferece várias vantagens como: conversão de resíduos orgânicos em gás metano, o qual pode ser usado diretamente como fonte energética; redução da emissão de amônia; controle de odores e o efluente da digestão anaeróbia, que pode ser utilizado como biofertilizante nas plantações, por ser fonte de vários minerais, além de contribuir para a rápida amortização dos custos da tecnologia instalada.
Além destas, outras vantagens da digestão anaeróbia podem ser citadas como: a contribuição para a mitigação das emissões de gases estufa como o CH4; a conservação de áreas destinadas a aterro de resíduos, diminuindo o acúmulo de metais no solo, além da lixiviação dos mesmos para o lençol freático; alterações nas relações familiares e sociais nas camadas de baixa renda em função do fornecimento de energia de baixo custo e todas as benéficas conseqüências; influência na balança comercial do país pela substituição de combustíveis fósseis e redução dos conseqüentes impostos; minora distorções de mercado referentes a práticas monopolistas do setor energético em função da auto-suficiência que propicia; a atuação como um mecanismo de segurança para o sistema regional ou local de geração e distribuição de energia e a geração de empregos (FUKAYAMA, 2008).
Segundo Konzen (2003), a cama de frangos de corte pode constituir fertilizante eficiente e seguro na produção de grãos e de pastagem, desde que precedidos dos ativos ambientais que assegurem a proteção do meio ambiente, antes de sua reciclagem.
Embora ainda não existam projetos relacionados a Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL) com o uso de cama de frangos como fonte de energia renovável, é possível observar a necessidade de maiores avaliações para implantação de uma linha de base com o objetivo da redução dos Gases de Efeito Estufa (GEE), para que com isso possa requerer a Redução Certificada de Emissão (RCEs) no âmbito do Protocolo de Kyoto.
1.2. Revisão de Literatura
1.2.1. Problemas ambientais relacionados aos dejetos
O problema ambiental que vem recebendo atenção especial nos últimos anos, não apenas no que se refere à avicultura, mas a produção animal em geral é o alto potencial de emissão de gases de efeito estufa proveniente da degradação dos dejetos em locais inapropriados. Segundo a United Nations Framework Convention on Climate Change (2006) 20% das emissões mundiais de gases de efeito estufa são provenientes das atividades agropecuárias, sendo o metano (produzido durante a degradação da matéria orgânica em meio anaeróbio) e o óxido nitroso (produzido em meios anaeróbios utilizando os compostos nitrogenados de natureza orgânica ou inorgânica) os principais gases envolvidos. Estes gases impedem a saída da radiação solar que é refletida na superfície da Terra para o espaço contribuindo assim para o aumento da temperatura global.
Esses gases trazem grande preocupação devido ao seu tempo de vida na atmosfera e seu potencial de aquecimento global com relação ao CO2 (o CO2 é o principal gás do efeito estufa, por isso foi eleito como sendo índice 1 para o aquecimento global e os demais gases são comparados a ele). Segundo a United Nations Framework Convention on Climate Change (2006) a vida média desses gases na atmosfera seria de 12 anos para o CH4 e 120 anos para o N2O e os respectivos potenciais de aquecimento global de 21 e 310.
A única forma de evitar a emissão destes gases seria a captação e posterior queima, onde o CH4 e N2O seriam transformados em CO2 e N2 após a queima, reduzindo assim a contribuição para o aquecimento global.
Em função desse apelo ambiental o manejo de dejetos merece destaque como, atualmente como uma preocupação a mais aos produtores do setor, envolvendo qualidade, comércio e interferindo nos custos de investimento e retorno, que são fatores importantes na produção lucrativa de aves.
Os dejetos provenientes da avicultura de corte são tão valiosos do ponto de vista biológico que devem ser usados com inúmeras vantagens e não simplesmente como dejeto a ser eliminado (MORENG e AVENS, 1990).
Os resíduos, quando dispostos sem prévio tratamento, comprometem a qualidade do solo e da água, com contaminação dos mananciais pelos microrganismos, toxidade a animais e plantas e depreciação do produto, porém com percepção em médio e longo prazo.
Deste modo, fica evidente a necessidade de desenvolvimento de tecnologias mais limpas com perspectivas de mitigar o abuso ao meio ambiente e produção de tais resíduos.
O direcionamento para cada uma dessas situações depende exclusivamente do manejo adotado que, quando bem conduzido, permite o aproveitamento quase que integral dos resíduos dentro das condições estabelecidas em cada propriedade (SANTOS, 2000).
Com base nas características quantitativas, qualitativas e pelo alto potencial de emissão de gases de efeito estufa dos dejetos de aves, torna-se evidente a necessidade de um tratamento que atue sobre cada um desses pontos. A biodigestão anaeróbia pode ser utilizada nesse tratamento, pois além de reduzir o poder poluente, e os riscos sanitários dos dejetos, tem como subprodutos o biogás e o biofertilizante (PLAIXATS et al., 1988).
Enfim o poder poluente dos dejetos animais é extremamente alto, face ao elevado número de contaminantes que possui, cuja ação individual ou combinada, representa uma fonte potencial de contaminação e degradação do ar, dos recursos hídricos e do solo. Estes fatos vêm exigindo a fixação de parâmetros de emissão cada vez mais rigorosos pela legislação ambiental, visando à preservação dos recursos naturais, do conforto e da saúde humana (STEIL et al., 2003).
1.2.2. Produção de biogás e biodigestão anaeróbia
O biogás é o nome comum dado à mistura gasosa produzida durante a biodegradação anaeróbia da matéria orgânica (RUIZ et al., 1992; CAMARERO et al., 1996; GARBA, 1996; LASTELLA et al., 2002; YADVIKA et al., 2004).
Na forma como é produzido, o biogás é constituído basicamente de 60 a 70% de metano (CH4) e 30 a 40% de dióxido de carbono (CO2), além de traços de O2, N2, H2S, etc., segundo Ruiz et al. (1992).
O processo biológico para produção de biogás ocorre na ausência de oxigênio molecular, no qual um consórcio de diferentes tipos de microrganismos interage estreitamente para promover a transformação de compostos orgânicos complexos em produtos mais simples, resultando, principalmente, nos gases metano e dióxido de carbono (FORESTI et al., 1999).
A biodigestão anaeróbia geralmente é dividida em três fases, hidrólise, acidogênese e metanogênese. Porém, há autores que a dividem em quatro fases, acrescentando a acetogênese, fase intermediária entre a acidogênese e a metanogênese (CAMARERO et al., 1996; SINGH e SINGH, 1996; STERLING et al., 2001). Há ainda quem divida o processo nas fases de hidrólise, acetogênese e metanogênese (SHARMA et al., 2000).
A primeira fase da digestão anaeróbia é chamada de hidrólise e envolve a transformação mediada por enzimas extracelulares dos compostos insolúveis e dos compostos com alto peso molecular como carboidratos, proteínas, lipídios e ácidos nucléicos em compostos solúveis mais simples como os monossacarídeos, os aminoácidos e os ácidos graxos. As bactérias que hidrolisam a matéria orgânica nessa primeira fase são facultativas e anaeróbias estritas.
Na segunda fase, chamada de acidogênese, outro grupo de microrganismos transformam os produtos resultantes da fase anterior em ácido acético, hidrogênio, dióxido de carbono e outros ácidos orgânicos como o propiônico e o butírico que podem ser convertidos em ácido acético.
Na terceira fase, o ácido acético, o hidrogênio e o dióxido de carbono são convertidos em uma mistura de metano e de dióxido de carbono pelas arquéias metanogênicas (dentre elas as que utilizam o acetato, Methanosarcina spp. e Methanosaeta e as que utilizam o formiato e o hidrogênio, Methanobacterium spp. e Methanococcus spp.) (RUIZ et al., 1992; GARBA, 1996; HESSAMI et al., 1996; HAMMAD et al., 1999; LASTELLA et al., 2002; LIU et al., 2002)
O sucesso do processo de biodigestão anaeróbia depende, portanto, de condições ambientais específicas (nutrientes, temperatura, tempo de retenção hidráulica suficiente e outros) para que as diferentes populações de microrganismos possam crescer e se multiplicar (SINGH, S. e SINGH, S.K. 1996; HAMMAD et al., 1999; YADVIKA et al., 2004).
O uso do biogás traz ganhos econômicos devido à redução dos gastos com combustíveis, como também traz ganhos ambientais através da troca de um combustível não renovável por um renovável e redução da contribuição da atividade para o aquecimento global.
1.2.3. Caracterização da Cama de Frango
Cama é todo o material distribuído sobre o piso de galpões para servir de leito às aves (PAGANINI, 2004), sendo uma mistura de excreta, penas das aves, ração e o material utilizado sobre o piso. Vários materiais são utilizados como cama: maravalha, casca de amendoim, casca de arroz, casca de café, capim seco, sabugo de milho picado, entre vários outros materiais (GRIMES, 2004).
A cama de frango foi fornecida para ruminantes por muito tempo, porém, devido aos problemas sanitários ocorridos na Europa em 2001, como a encefalopatia espongiforme bovina (BSE), o Ministério da Agricultura publicou uma Instrução Normativa (BRASIL, 2001) proibindo, entre outros, a comercialização da cama de frango com a finalidade de alimentação para ruminantes. Tal proibição se deve aos riscos de haver contaminação da cama com restos de ração que por ventura tenha proteína animal em sua composição. Devido à dificuldade de fiscalização em todo o território brasileiro para a diferenciação se as aves foram alimentadas com proteína especificamente vegetal ou animal, a instrução proíbe o uso de toda e qualquer cama, independente da sua origem.
Com esta correta proibição, o destino para cama de frango tornou-se restrito, sendo necessárias pesquisas com objetivo de estudar alternativas para o aproveitamento deste resíduo.
A reutilização da cama é uma alternativa viável para diminuir o impacto ambiental provindo do acúmulo deste resíduo, além de favorecer regiões em que há escassez do material base e dificuldade para vender a cama após a saída dos animais.
Outras razões para a reutilização da cama são: custo para aquisição do material; mão-de-obra para retirar a cama do galpão, aliada à tentativa de diminuir o tempo ocioso das instalações; diminuição da atividade madeireira, tornando escassa a oferta de maravalha e adaptação às épocas do ano para disponibilidade dos materiais (PAGANINI, 2004).
Segundo Lien et al. (1992); Malone (1992) e Brake et al. (1993), a cama pode ser reutilizada de 1 a 6 vezes sem que haja diferenças significativas no que se refere à mortalidade, ganho de peso, consumo de ração, eficiência alimentar e qualidade das carcaças.
Vários fatores influenciam a composição químico-bromatológica da cama de frango, como a composição da ração, quantidade do material de cobertura do piso do galpão, estação do ano, densidade de alojamento das aves, tipo de substrato de cama, ventilação do galpão, nível de reutilização da cama e características das excretas das aves.
Santos (1997) constatou que há diminuição significativa na produção de resíduos na granja quando se reutiliza a cama. Segundo a autora, o coeficiente de resíduo no qual se criou um lote foi de 0,521 kg de matéria seca (MS) de cama/kg de peso vivo de ave, e para dois lotes de 0,439 kg de MS de cama/kg de peso vivo de ave, indicando que uma reutilização pode diminuir o coeficiente de resíduo (produção de cama) em aproximadamente 16%. Severino et al. (2006), ao estudarem onze materiais orgânicos (Tabela 1), dentre esses a casca de amendoim e a cama de frango, encontraram valores de macronutrientes diferentes de Santos et al. (1997).
Tabela 1. Concentração de nitrogênio, fósforo, potássio, cálcio e magnésio, nos materiais estudados.
Fonte: SEVERINO et al. (2006).
Como a concentração de minerais na cama de frango pode influenciar no desenvolvimento da biodigestão anaeróbia, demonstra-se a importância de conhecê-la para melhor manejar o biodigestor e conseqüentemente conhecer o valor agronômico do efluente (biofertilizante) para adubação de plantas.
1.2.4. Pré-tratamento da cama de frango para biodigestão anaeróbia
Pode ser necessário que a cama tenha que sofrer um pré-tratamento antes de ser adicionada ao biodigestor, o mais indicado seria a moagem, pois as partículas de maravalha são muito grandes e isso pode diminuir a eficiência da atividade dos microrganismos. Em relação ao teor de umidade da cama, é necessária a adição de água para a da diminuição do teor de sólidos e diluição do conteúdo. Se o teor de sólidos totais for muito alto, demandará um longo TRH dificultando a consorciação produção de biogás/avicultura.
Segundo Lucas Junior et al. (1993), há biomassas que apenas diluídas podem apresentar bons resultados no processo de digestão anaeróbia, com relativa facilidade de degradação, porém outras são mais difíceis de serem degradadas pelos microrganismos envolvidos no processo, apresentando degradação lenta e nesses casos, se faz necessária não apenas a diluição como também a inoculação.
Um dos problemas é a quantidade de material de difícil degradação existente em algumas camas de frangos, como por exemplo a casca de amendoim, que por muitas vezes pode se tornar um empecilho para os microorganismos na bioconversão do carbono em biogás. Por isso, infere-se que o peneiramento em malha, desta fração grosseira existente na cama possa incrementar a produção de biogás e reduzir o percentual de ST, antes da biodigestão anaeróbia, proporcionando uma diminuição do potencial poluidor desse resíduo no solo, na água e no ar.
1.2.5. Fatores intrínsecos a biodegradação da matéria orgânica
A temperatura é um fator extremamente importante na digestão anaeróbia, uma vez que influi na velocidade do metabolismo bacteriano, no equilíbrio iônico e na solubilidade dos substratos (FORESTI et al., 1999). O efeito da temperatura sobre o processo de digestão anaeróbia tem sido estudado por diversos autores nas faixas psicrofílica, abaixo de 20 ºC (MASSÉ et al., 2000; MASSÉ e DROSTE, 2000), mesofílica, entre 20 e 45 ºC (BROUGHTON et al., 1998; CHEN e SHYU, 1998), e termofílica, entre 50 e 70 ºC (ÖZTÜRK, 1993; LEPISTO e RINTALA, 1996).
A disponibilidade de certos nutrientes é essencial para o crescimento e atividade microbiana. Dentre eles o carbono, nitrogênio e o fósforo são minerais essenciais para todos os processos biológicos da metanogênese. A quantidade de N e P necessária para a degradação da matéria orgânica presente depende da eficiência dos microrganismos em obter energia para a síntese, a partir de reações bioquímicas de oxidação do substrato orgânico (FORESTI et al., 1999).
Embora essencial ao processo de biodegradação da matéria orgânica, o nitrogênio, pode tornar-se um fator inibitório quando em altas concentrações na forma de amônia. As concentrações do íon amônio (NH4+) e amônia livre (NH3) são ditadas pelo pH, com altos valores de pH a forma NH3 prevalece, e é mais inibitória que a forma ionizada (MATA-ALVAREZ et al., 2000).
Damianovic (1992) em revisão de literatura sobre aspectos nutricionais em processos anaeróbios fez referências a uma série de trabalhos que comprovaram a importância de micronutrientes na estimulação do processo, no entanto, o único metal traço testado em reatores de grande porte foi o ferro, com resultados bastante satisfatórios.
Apesar dos dejetos de aves possuírem alta degradação, uma fração deste total pode não ser biodegradável ou lentamente biodegradável. Por isso espera-se que a separação desta fração sólida do restante do resíduo a ser destinado ao tratamento anaeróbio, se torne mais facilmente degradado pelos microorganismos. Com isso o processo pode se tornar mais eficiente (maior produção de biogás/kg de sólido), rápido (menor tempo de retenção hidráulica) e econômico, pois necessitará de biodigestores menores para um mesmo número de animais.
Existem várias formas de separar frações mais degradáveis de frações menos degradáveis. Em se tratando de água residuária, uma das formas mais comuns é a separação da fração sólida da fração líquida, por meio de peneiras de separação, tambores rotativos, centrifugação e decantação. A fração liquida possui maior quantidade de nutrientes solúveis, já na fração sólida maiores quantidades de frações insolúveis menos degradáveis como celulose, hemicelulose e lignina.
O fato de a fração sólida possuir menor potencial de produção de biogás não implica que essa fração deva ser descartada do processo, a decisão vai depender da eficiência e a rapidez que se necessita para tratar os dejetos. Caso a decisão seja favorável à separação de sólidos será necessário um tratamento concomitante (compostagem), para que os resíduos sólidos sejam tratados, pois estes possuem um poder poluente elevado e necessitam de tratamento adequado antes de serem aplicados no meio ambiente.
Os avanços conseguidos na avicultura, como um todo, indicam que os números que correspondem ao crescimento da atividade avícola, tanto da produção de carne como da produção de dejetos, merecem ser analisados sob aspectos que se relacionam aos ganhos de mercado e as perdas e degradação de recursos naturais. Nesse contexto, consideram-se os impactos nos receptores de efluentes (solo, água e ar), indicando que qualquer sistema que promova transformação nos dejetos seja o mais eficiente possível em reduzir os impactos, quando o meio em que se instala a atividade se apresentar com alta sensibilidade no comprometimento dos recursos.
Porém quando o meio apresentar boa capacidade suporte para a atividade, o sistema de estabilização dos dejetos deverá ser o mais eficiente possível em permitir a ciclagem energética e orgânica/mineral na propriedade, resultando em menores custos de produção. Este fato justifica o estudo da separação de sólidos, dos tempos de retenção hidráulica e do potencial de produção de biogás remanescente no efluente dos biodigestores, pois este dado permitirá a avaliação do potencial de emissão de metano para atmosfera em cada tempo de retenção adotado.
2 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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