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Avaliação das respostas imunes humoral e celular induzidas por uma vacina inativada experimental contra estirpe variante brasileira do vírus da bronquite infecciosa aviária

Publicado: 14 de abril de 2015
Por: Romeu Moreira dos Santos¹, Mariana Monezi Borzi¹, Ketherson Rodrigues Silva¹, Priscila Diniz Lopes¹, Filipe Santos Fernando¹, Maria de Fátima da Silva Montassier¹, Cintia Hiromi Okino¹, Helio José Montassier¹ *¹Laboratório de Imunologia e virologia veterinária, departamento de Patologia animal, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista – FCAV/Unesp, Jaboticabal, SP
 Introdução
O vírus da bronquite infecciosa (VBI) ocasiona um grande impacto negativo na avicultura industrial de postura, sendo caracterizado principalmente por ocasionar uma doença aguda do trato respiratório de seus hospedeiros. A prevenção da bronquite infecciosa das galinhas (BIG) no Brasil é feita pela vacinação dos plantéis avícolas, sendo utilizada a vacina atenuada da estirpe Massachusets do VBI (Mass) (MONTASSIER et al., 2012). No entanto, não se sabe se os níveis de anticorpos e se a resposta imune celular induzida pela vacina Mass é capaz de induzir um estado suficiente de proteção contra estirpes variantes genéticas, denominadas heterólogas.
Os estudos de proteção vacinal contra estirpes isoladas entre os anos de 1990 e 2000 no Brasil mostraram que o sorotipo Mass, forneceu proteção inadequada contra a maior parte dessas novas variantes brasileiras do VBI. Consta na literatura que essas estirpes foram isoladas de surtos de BIG, apresentando diversas manifestações clínicas e patológicas, tais como traqueobronquites e aerossaculites, lesões renais e problemas reprodutivos em fêmeas e em machos. Esses achados caracterizaram, assim, o potencial de um amplo espectro de patotipos dentre esses isolados do VBI no Brasil (FERNANDO et al., 2013; MONTASSIER et al., 2012). Estas análises trouxeram grande contribuição no contexto genealógico das estirpes do VBI que estavam circulando no Brasil, no entanto, estudos de proteção vacinal frente a estas estirpes e análise de caracterização patogênica não foram ainda completamente realizados.
A despeito da existência de inúmeros trabalhos na literatura versando sobre o nível de proteção contra o VBI, especialmente aquela que é decorrente do uso de vacinas, restam muitas dúvidas sobre a eficácia destas vacinas frente às variantes isoladas em todo o mundo, e por isso é necessário antever as características biológicas destas estirpes, bem como buscar alternativas para um correto manejo sanitário contra estas variantes. Dessa forma, o propósito deste trabalho, foi avaliar a imunogenicidade da vacina inativada formulada com a estirpe variante do VBI pertencente ao genótipo BR-1 administrada após a vacina atenuada comercial formulada com a estirpe Massachusetts, por meio da mensuração das respostas imunes humorais e cito-mediadas.
Material e Métodos
Foi utilizada uma estirpe variante de campo do VBI (IBVPR-05), isolada e caracterizada geneticamente por Montassier et al. (2012), para a produção da vacina experimental inativada com adjuvante a base de água em óleo. A mesma estirpe variante foi utilizada para a realização da infecção experimental (desafio) nas aves. Para formulação da vacina foi utilizado como reagente para inativação viral a beta-propiolactona (BPL), seguindo a metodologia utilizada por McDougall (1969). Após comprovada inativação viral, foi incorporada à mistura o adjuvante a base de água em óleo na proporção 70 % do adjuvante mais 30 % do vírus inativado conforme as recomendações do fabricante.
Foram testadas 26 aves SPF da linhagem de postura “White Leghorn”, distribuídas em três grupos: grupo A com dez animais (aves vacinadas com um dia de idade com vacina atenuada comercial e revacinadas com 14 dias de idade com vacina inativada experimental homóloga); grupo B com dez (aves não vacinadas); grupo C (controle). Todas as aves foram alojadas separadamente em grupos em isoladores, com água e comida à vontade durante todo o experimento. Aos 35 dias de idade as aves do primeiro (Grupo A) e segundo grupos (Grupo B) foram desafiadas via óculo-nasal com a estirpe variante de campo do VBI (IBVPR-05) (104 DIE50). O terceiro grupo (Grupo C) foi mantido como controle negativo da infecção, já que não foi submetido à vacinação nem ao desafio.
Três aves de cada tratamento experimental (Grupo A e B) foram sacrificadas aos 3, 7 e 11 dias pós-infecção (d.p.i.); já no grupo controle (grupo C) apenas duas aves foram sacrificadas em cada intervalo, para colheita de material, sendo colhidas amostras de traquéia, rins, soro e lágrima. As amostras de traquéia e rins foram submetidas ao congelamento rápido em nitrogênio líquido e armazenadas a –70 °C até o momento de serem processadas pela técnica de extração de RNA para avaliação da resposta imune celular através do genes marcadores de células T citotóxicas CD8+ e Granzima A, seguindo os procedimentos descritos por Okino et al. (2013).
As amostras de soro e de lágrima foram coletadas e armazenadas a -20 °C, até o momento de serem processadas pela técnica de Sandwich-ELISA-Concanavalina A, com algumas adaptações.
Resultados e Discussão
Os resultados do PCR em tempo real para avaliação da expressão gênica do marcador CD8+ de células T citotóxicas nas amostras de traquéia e de rins das aves pertencentes aos grupos A (aves vacinadas e desafiadas com estirpe variante homóloga IBVPR-05) e B (aves não vacinadas e desafiadas com estirpe variante homóloga IBVPR-05) apresentaram variações na cinética do período pós-desafio que foi investigado. No 7º dia pós-desafio (dpi) foi verificado que os valores da expressão desses dois genes de resposta imune cito-mediada se elevaram mais acentuadamente nos dois grupos experimentais de aves e declinaram depois deste período. Estudos prévios revelaram que as células efetoras T colhidas com 10 dias pós-infecção de aves com o VBI garantem a proteção das aves durante a fase aguda da infecção por este vírus e que a ativação dessas células T declina após dez dias de infecção. Além disso, a ativação de células T por antígenos específicos se desenvolve até dez dias pós-infecção, período no qual são encontrados os maiores números destas células. Durante este período, a infecção aguda é resolvida e as partículas infecciosas do VBI são reconhecidas e eliminadas do meio interno do hospedeiro e, após o “clearence” do patógeno, a maioria das células T específicas sofrem morte por apoptose (PEI et al., 2003). Embora não houvesse diferença estatística na expressão do gene de cadeia ? do CD8 pelas aves do grupo vacinado em relação às aves do grupo não vacinado, maiores expressões deste gene foram observadas nas aves imunizadas.
Diversamente do que ocorreu com a expressão do gene da cadeia ? do CD8, os níveis de expressão do gene da granzima A revelaram-se, no 3º e 7º dpi, significativamente mais aumentados na mucosa traqueal e nos rins das aves vacinadas do que nas aves não vacinadas. Aumentos similares, embora mais precoces, da expressão do gene da Granzima A foram encontrados em aves previamente imunizadas, na idade de um dia, com vacina atenuada da estirpe Massachusetts (H120) e desafiadas três semanas depois com estirpe homóloga (M41) (OKINO et al., 2013). Deve-se ressaltar nesse ponto que a resposta dos linfócitos T citotóxicos em galinhas contra a infecção pelo VBI parece exercer um papel preponderante na eliminação desse vírus do meio interno do hospedeiro durante a fase aguda da infecção (MONTASSIER et al., 2012; OKINO et al., 2013).
Um aspecto interessante na avaliação da expressão desses genes de imune-resposta foi a coincidência das elevações para a expressão dos genes CD8 das células T citotóxicas e da Granzima A, reforçando a participação das células T citotóxicas de memória nesse fenômeno de proteção induzida pela vacinação prévia com a vacina inativada oleosa contendo a estirpe IBVPR-05 para as aves desafiadas com a estirpe homóloga. Há, portanto, uma forte evidência da importância da presença de linfócitos T de memória, a qual pode ser avaliada por meio da expressão gênica de alguns de seus marcadores como o Granzima A, que são ativados precocemente no grupo vacinado que assegura um combate mais rápido ao VBI em relação ao grupo não imunizado.
Ao se analisar o perfil cinético nas respostas imunes humoral sistêmica (soro sanguíneo) e local (secreção lacrimal) induzidas pelo uso combinado das vacinas atenuada (Mass) e inativada (variante brasileira) para os anticorpos anti-VBI do isótipo IgG, nota-se que houve aumento significativo dos níveis desses anticorpos, em todos os intervalos de tempos; os níveis de anticorpos elevaram-se significantemente no grupo A (vacinado), enquanto que no grupo B (não vacinado) tal aumento começou a ocorrer discretamente somente no 11º dia pós infecção, ou seja a soroconversão foi mais tardia, provavelmente devido à falta de linfócitos B de memória conferidos aos grupos vacinados no primeiro dia de vida com vacina e reforço com vacina inativada homóloga.
No entanto, a maior parte dos artigos da literatura destaca que os títulos de anticorpos anti-VBI do soro sanguíneo não apresentam boa correlação com o estado de proteção ao desafio com estirpe virulenta do VBI, especialmente quando o estado de proteção é avaliado através da mensuração do grau de lesões histológicas e do re-isolamento viral na traqueia e rins. Por outro lado, considera-se que os níveis de anticorpos presentes nas secreções mucosas estão mais envolvidos na proteção do trato respiratório e, especialmente, da porta de entrada desse vírus constituída pelas células epiteliais da mucosa nasal e traqueal (LANCELLOTTI et al., 2014; MONTASSIER et al., 2012).
Embora os anticorpos do isótipo IgG no soro sanguíneo revelaram uma associação com a proteção ao desafio com o VBI, os níveis destes anticorpos presentes na secreção lacrimal foram de maior magnitude principalmente no 7º dpi. Nesse sentido, os resultados obtidos corroboraram os dados observados em investigações anteriores que também encontraram importantes marcadores de imunidade humoral na secreção lacrimal (LANCELLOTTI et al., 2014; OKINO et al., 2013).
Assim, os nossos resultados indicaram que os anticorpos locais são efetivamente induzidos pela vacina inativada formulada com a estirpe variante brasileira do VBI em galinhas SPF e estes anticorpos podem fornecer uma parte significativa da proteção para as vias respiratórias superiores destas aves. Essa superfície da mucosa, especialmente a da traqueia se constitui na porta de entrada e no sítio primário de replicação do VBI. Além disso, as respostas imunes cito-mediadas, que foram avaliadas neste estudo através da expressão dos genes CD8 e da granzima A, não devem ser desconsideradas como um mecanismos de proteção adicionais de resistência contra a infecção pelo VBI, dado que os linfócitos citotóxicos específicos T CD8 têm sido demonstrados como importantes fatores na imuno-proteção contra este vírus (OKINO et al., 2013).
Como é geralmente o que ocorre na proteção induzida por vacinas contra estirpes respiratórias do VBI, a melhor proteção contra o desafio por estirpes variantes virulentas desse mesmo vírus é obtida também com estirpe homóloga pertencente ao mesmo genótipo / sorotipo. No entanto, a possibilidade de utilizar uma vacina viva formulada com estirpe homóloga a uma das variantes do genótipo / sorotipo BR-I, tal como a estirpe IBVPR-05, para controlar a doença em planteis comerciais de aves não é possível atualmente, pois um vírus atenuado e estavelmente seguro não está disponível. Sendo assim, o uso de vacinas inativadas contra o VBI em galinhas torna-se uma opção para controlar estirpes heterólogas em poedeiras e reprodutoras, oferecendo imunidade sistêmica para prevenir ou reduzir as doenças. Neste contexto, exalta-se a importância de selecionar uma estirpe com um elevado grau de semelhança com os principais antígenos do vírus desafio para inclusão na vacina inativada, aumentando assim, o potencial de proteção imune da vacina (FERNANDO et al., 2013; LADMAN et al., 2002).
Conclusões
As respostas imunes humoral e celular induzidas pelo uso combinado da vacina atenuada comercial, contendo a estirpe Massachusetts, com a vacina inativada contendo a variante brasileira do VBI (IBVPR-05) induziram respostas imunes humorais tanto a nível sistêmico como local e também respostas imunes cito-mediadas, que podem proporcionar proteção contra o desafio com a estirpe virulenta homóloga desse mesmo vírus.
Referências Bibliográficas
FERNANDO, F. S.; MONTASSIER, M. F. S.; SILVA; K. R.; OKINO, C. H.; OLIVEIRA; E. S.; FERNANDES; C. C.; BANDARRA, M. B.; GONÇALVES, M. C. M.; BORZI, M. M.; SANTOS, R. M.; VASCONCELOS, R. O.; ALESSI, A. C.; MONTASSIER, H. J. Nephritis Associated with a S1 Variant Brazilian Isolate of Infectious Bronchitis Virus and Vaccine Protection Test in Experimentally Infected Chickens. International Journal Of Poultry Science, Asia, v. 11, n. 12, p. 639-646, 2013.
LADMAN, B. S.; POPE, C. R.; ZIEGLER, A. S.; SWIECZKOWSKI, T.; CALLAHAN, J. M.; DAVISON, S.; GELB, J. JR. Protection of Chickens after Live and Inactivated Virus Vaccination against Challenge with Nephropathogenic Infectious Bronchitis Virus PA/Wolgemuth/98. Avian Diseases, v. 46, n. 4, p.938-944, 2002.
LANCELLOTTI, M.; MONTASSIER, M. F. S.; FERNANDO, F. S.; SILVA, K. R.; OKINO, C. H.; SANTOS, I. L.; SANTOS, R. M.; BORZI, M. M.; ALESSI, A. C.; PEREIRA, G. T.; MONTASSIER, H. J. Relationship Between Mucosal Antibodies and Immunity Against Avian Infectious Bronchitis Virus. International Journal Of Poultry Science, v. 13, n. 3, p.138-144, 2014.
MCDOUGALL, J. S. Avian infectious bronchitis: the protection afforded by an inactivated virus vaccine. Veterinary Record. v. 85, n. 14, p. 378-381, 1969.
MONTASSIER, M.F.S., L. BRENTANO, L.J. RICHTZENHAIN, MONTASSIER, H. J. Molecular analysis and evolution study of infectious bronchitis viruses isolated in Brazil over a twenty-one-year period. In: INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON AVIAN CORONA AND PNEUMOVIRUSES AND COMPLICATING PATHOGENS, 7., 2012, Germany, Proceedings..., Rauischholzhausen, p. 19-30. 2012.
OKINO, C.H.; ALESSI, A.C.; MONTASSIER, M.F.S.; ROSA, A.J.M.; WANG, X.; MONTASSIER, H.J. Humoral and Cell-Mediated Immune Responses to Different Doses of Attenuated Vaccine Against Avian Infectious Bronchitis Virus. Viral Immunology, v. 26, n. 2, p. 1-9, 2013.
PEI, J.; ELWOOD BRILES, W.; COLLISSON, E. W. Memory T cells protect chicks from acute infectious bronchitis virus infection. Virology, v. 306, p. 376-384, 2003.
***O trabalho foi originalmente apresentado durante o XIII Congresso da APA – Produção e Comercialização de Ovos, “Ovo todos os dias: só faz bem!”, em Ribeirão Preto, entre os dias 17 e 19 de março.
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Priscila Diniz Lopes
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