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Parâmetros Elétricos Para a Insensibilização de Frangos: Qual a Corrente Elétrica que Atinge o Cérebro?

Publicado: 28 de novembro de 2022
Por: GN Scheuermann1, E Xavier Costa2, L Caron1, A Coldebella1, SP Alves3, LT de La Veja4 e PS Rosa1.1Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa; 2Departamento de Ciências Básicas – USP/FZEA; 3BRF, São Paulo-SP; 4F&S Animal Origin Food Consulting, Dubling, Irlanda.
INTRODUÇÃO
Como país exportador de carne de frango à União Europeia, o Brasil deve sujeitar-se às exigências daquele bloco, principalmente as relacionadas ao bem estar animal no período de pré-abate e abate. É o caso dos parâmetros elétricos que constam no regulamento CE 1099/2009 (EUROPE, 2009). A não utilização destes parâmetros implica na necessária apresentação de método que atenda requisitos de equivalência.
Embora o regulamento EC 1099/2009 possibilite variada combinação entre frequências e corrente, ele caracteriza-se pelo uso de elevada corrente exceto se concomitante com baixa frequência. Sabe-se que a aplicação de parâmetros elétricos desta natureza afeta negativamente a qualidade da carcaça ocasionando lesões hemorrágicas e fraturas nos cortes de valor econômico (Ali et al., 2007), implicando em perdas e impacto econômico negativo. A justificativa da União Europeia para não permitir o uso de eletronarcose com baixa intensidade e elevada frequência baseia-se no suposto comprometimento do bem-estar, uma vez que a ave não estaria devidamente insensibilizada para as etapas posteriores à cuba de insensibilização ou que estaria susceptível ao sofrimento durante o próprio processo de insensibilização. O objetivo deste estudo foi avaliar se a insensibilização baseada em alta frequência (600 Hz) e baixa corrente elétrica (110 V) propicia a passagem de corrente elétrica no cérebro do frango suficiente para assegurar efetiva insensibilização.
MATERIAL E MÉTODOS
Para acessar a corrente elétrica que flui no cérebro durante o processo de insensibilização foram avaliados oito frangos com peso médio igual a 3273 g e erro padrão de 78 g.
Após abatidos individualmente por eletronarcose, dois eletrodos de prata foram introduzidos no cérebro de cada ave através de incisão dorsal na pele na região crânio- -cervical, adentrando o forame magno via fossa atlanto-occipital. Os eletrodos foram posicionados dentro dos limites das meninges, um na porção frontal e outro na caudal do cérebro, mantendo-se distância de 15 mm entre eles. Os cabos dos eletrodos foram colados na superfície da musculatura da região dorsal da cervical, sendo a incisão cirúrgica também colada. O posicionamento dos eletrodos foi conferido através de raio X. O ensaio foi realizado com acesso individual em cada ave morta, a qual foi dependurada em gancho simulando a nória de abatedouro, com a cabeça imersa em água eletrificada.
Todos os frangos foram submetidos individualmente, em duplicata, à sequência de quatro frequências (200, 400, 600 e 1500 Hz) associadas a diferentes voltagens (Tabela 1), utilizando onda quadrada em corrente alternada (com 50% duty cycle). Avaliou-se a tensão na cabeça usando multímetro com resolução de milésimos de volts (mV). Fez- -se também leitura da impedância entre os eletrodos através de ponte LCR à frequência de 1 KHz (Seoane et al., 2004), antes e após a passagem da corrente elétrica para verificar a variação pela possível interação do tecido com a corrente elétrica e também usar estas medidas para calcular a corrente elétrica na área de cérebro compreendida pelos eletrodos através da Lei de Ohm generalizada. Foi realizada a análise da variância para o modelo considerando os efeitos de frango e de tratamento, seguida pelo teste de Tukey. O software SAS (2012) foi utilizado para realização das análises.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O teste F da análise da variância mostrou haver efeito significativo dos tratamentos para a corrente estimada no cérebro, conforme Tabela 1. Os dados foram gerados imediatamente após a morte das aves, considerando que não há diferença significativa nos valores de resistividade do cérebro nesta condição se comparado com aves vivas anestesiadas (Woolley et al., 1986). Observou-se que a frequência 1500 Hz associada à Corrente Elétrica de 213 mA propiciou a passagem da maior corrente elétrica na cabeça, sendo este tratamento diferente dos demais. A frequência de 600 Hz, associada à corrente elétrica de 102 mA possibilitou corrente no cérebro similar ao tratamento controle (200 Hz; 99 mA), o qual segue o regulamento europeu. Já a frequência de 400 Hz associada à corrente elétrica de 158 mA apresentou resultados intermediários em relação aos outros três tratamentos.
O processamento da informação no cérebro, como dor e consciência, depende do nível da atividade elétrica complexa e global dos neurônios. Já a atividade bioelétrica cerebral é regulada pela dinâmica das polarizações e depolarizações dos neurônios no cérebro, a qual ocorre com tensões da ordem de mV, sendo 70mV o potencial de repouso dos neurônios (EFSA, 2004). A hipótese que motivou este trabalho é de que, a submissão da ave a insensibilização com parâmetros elétricos alternativos ao do Regulamento CE 1099/2009 possibilite a passagem de corrente no cérebro alta o suficiente para impedir a manutenção do equilíbrio de gibbs-Donnan nas membranas dos neurônios.
Em determinado nível de tensão elétrica os neurônios conseguem controlar a fluidez da membrana em função de diferentes tipos de neurotransmissores e outras moléculas, como é o caso das bombas de Na+ e K- que respondem à presença de campo elétrico nos meios intra- e extra-celular, visando manter o equilíbrio Gibbs-Donnan (DREIER et al., 2013). Elevação da tensão elétrica pode romper esta funcionalidade. Por exemplo, em humanos, correntes da ordem de 43µA/cm2 parecem ser suficientes para alterar o comportamento dos neurônios (Ruffini et al., 2013). Considerando a dinâmica metabólica, possivelmente uma corrente elétrica elevada como a observada no presente estudo, superior a 420 μA/ cm2, faz com que não se mantenha a dinâmica de depolarização, o que reduziria a capacidade do cérebro de processar informações como a dor.
CONCLUSÃO
A insensibilização elétrica de frangos com corrente aproximada de 100 mA e frequência de 600 Hz, utilizando onda quadrada em corrente alternada (com 50% duty cycle) possibilita a passagem de corrente no cérebro da ave em magnitude maior do que a corrente normalmente utilizada para a atividade neurológica. Presume-se que nesta condição não se mantenha a capacidade de transmissão da dor, condição essencial para a insensibilização das aves.
Parâmetros Elétricos Para a Insensibilização de Frangos: Qual a Corrente Elétrica que Atinge o Cérebro? - Image 1

Ali, A.S.A., Lawson, M.A., Tauson, A.-H., Jensen, J.F., Chwalibog, A. Influence of electrical stunning voltages on bleed out and carcass quality in slaughtered broiler chickens.
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Dreier, J. P., Isele, T., Reiffurth c., Offenhauser N., Kirov, S.A., Dahlem, M.A., Herreras, O.
Is spreading depolarization characterized by an abrupt, massive release of gibbs free energy from the human brain cortex? Neuroscientist, v. 19, n. 1, p. 25-42, 2013.
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EUROPE. COUNCIL REGULATION (EC). No 1099/2009, of 24 September 2009 on the protection of animals at the time of killing (Text with EEA relevance). Official Journal of the European Union, L 303, 18 nov. 2009. p. 1-30.
Ruffini, G., Wendling, F., Merlet, I., Molaee-Ardekani, B., Mekonnen, A., Salvador, R.,
Soria-Frish, A., Gran, C., Dunne, S., Miranda, P.C. Transcranial current brain stimulation (tCS): models and technologies. IEEE Trans Neural Syst Rehabil Eng, v. 21, n. 3, p. 333-
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Seoane F., Lindecrantz K., Olsson T., Kjellmer I., Flisberg A., Bagenholm R. Brain electrical impedance at various frequencies: the effect of hypoxia. Conf Proc IEEE Eng
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Woolley, S. C.; Borthwick, F. J.; Gentle, M. J. British Poultry Science, 27(2): 301-306, 1986.

Tópicos relacionados:
Autores:
Leonardo Thielo de La Vega
F&S Consulting
Ernane Costa
USP -Universidade de São Paulo
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