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Pleuropneumonia fibrinosa em suíno: relato de caso

Publicado: 6 de setembro de 2021
Por: Maria Eduarda Rosa, Elizabeth Schwegler, Juliano Santos Gueretz, Erica Marson Bako, Robert Lenoch, Moacir Quaiatto, Jéssica Regina Moreira e Fabiana Moreira
1 INTRODUÇÃO
As doenças infecciosas que acometem o trato respiratório, resultando principalmente em pneumonias, têm sido cada vez mais comuns na produção de suínos, como consequência do sistema de criação intensivo, com alta densidade animal. A presença de doenças respiratórias está associada a grandes perdas econômicas devido às altas taxas de morbidade e mortalidade, redução do ganho de peso médio diário, piora na conversão alimentar, gastos com medicamentos, vacinas e, perdas no abate decorrente das condenações de carcaças (MORES et al., 2015; HOELTIG et al., 2018).
A pleuropneumonia suína é uma doença respiratória infectocontagiosa causada pela bactéria Actinobacillus pleuropneumoniae (APP) e a sua apresentação clínica pode variar de superaguda, aguda a crônica. Suínos entre 70 a 100 dias de idade são os mais acometidos, podendo apresentar sinais de apatia, anorexia, dispneia e aumento da frequência cardíaca. Na fase terminal da forma superaguda é comum a morte súbita, na qual o animal é encontrado com secreção sanguinolenta na boca e narinas. Na forma crônica, observa-se principalmente condenação de carcaças de forma parcial ou total em abatedouros devido à aderência entre pulmão e as pleuras visceral e parietal (MORES, 2006; KICH e LARA, 2016; GOTTSCHALK et al., 2019). Segundo Santos e Alessi (2014) as lesões observadas são pneumonia em lobos cranioventrais de aspecto vermelho escuro e necrosados. Também são observados espessamento de septos interlobulares devido ao acúmulo de fibrina e presença de exsudato fibrino-hemorrágico sobre a pleura visceral. As lesões crônicas são responsáveis pelas condenações nos abatedouros e incluem abcessos pulmonares múltiplos, nódulos de tecido necrótico, muitas vezes com presença de capsula fibrosa, de coloração amarelada e extenso comprometimento da pleura, podendo estar espessada por tecido fibroso e com aderências a parede costal (MORES et al., 2016).
Considerando à importância da suinocultura no panorama econômico brasileiro e das doenças respiratórias nestes animais, o objetivo desse estudo é relatar um caso de pleuropneumonia fibrinosa em um suíno, necropsiado após morte súbita.
2 RELATO DE CASO
Foi realizada a necropsia de um suíno macho com cerca de 120 dias de idade pesando aproximadamente 70 kg, proveniente de uma propriedade suinícola localizada em Araquari, Santa Catarina (26° 22′ 12″ S 48° 43′ 19″ O). Durante a pesagem de dois lotes da terminação para análise de desempenho zootécnico, alguns leitões apresentavamse apáticos, movimentavam-se lentamente durante o manejo e estavam sendo agredidos por outros leitões da baia. Estes animais foram transferidos para uma baia hospital, onde começaram a apresentar sinais clínicos como dispneia e respiração abdominal, além de adotarem a posição de cão sentado. O veterinário responsável recomendou o tratamento desses animais sintomáticos com o antimicrobiano enrofloxicina. Previamente ao tratamento, durante a contenção dos animais para medicação, houve a morte súbita de um dos suínos, após intensa agitação, no qual foi submetido à necropsia.
Durante a avaliação macroscópica observou-se grande quantidade de líquido serosanguinolento na cavidade torácica (Figura 1), associado a exsudato serofibrinoso livre e aderido as pleuras visceral e parietal (Figura 1), resultando em aderência de ambas as superfícies e ao saco pericárdico (Figura 2). Os pulmões apresentaram consolidação pulmonar cranioventral de coloração vermelha escura e aderência com a pleura visceral (Figura 3). Ao corte, apresentava exsudato serofibrinoso, com septos interlobulares espessados com conteúdo ligeiramente amarelado (Figura 3).
Pleuropneumonia fibrinosa em suino: relato de caso - Image 1
Pleuropneumonia fibrinosa em suino: relato de caso - Image 2
Pleuropneumonia fibrinosa em suino: relato de caso - Image 3
Após a necropsia, foram colhidos fragmentos de pulmão e enviados para um laboratório de patologia clínica para análise histopatológica, cultura bacteriana e antibiograma. A partir do swab pulmonar foi realizado a semeadura em meios de isolamento em ágar sangue e ágar MacConkey, provas bioquímicas, meios de identificação EPM/MiLI, Bactray NF Laborclin, cromatogenia para contagem de colônias, microanaerobiose e incubação a 35-37°C/18 a 24 horas a cada etapa. Os resultados da cultura e do antibiograma mostraram o isolamento da bactéria Escherichia coli, com resistência aos antibióticos ampicilina, enrofloxacina, florfenicol, penicilina e resistência intermediária à moxifloxacina.
Na avaliação histopatológica foi detectado exsudato fibrinoso acompanhado de infiltrado inflamatório (neutrófilos, macrófagos e linfócitos) difuso severo, acometendo a pleura visceral (Figura 4), septos interlobulares e em menor proporção bronquíolos, espaços alveolares e interstício (Figura 4). Notam-se ainda, êmbolos fibrinosos em vasos linfáticos e calcificação multifocal discreta na pleura.
Pleuropneumonia fibrinosa em suino: relato de caso - Image 4
3 DISCUSSÃO
Fatores ambientais, nutricionais, de manejo, de instalações, bem como situações estressantes e doenças imunodepressoras podem predispor ou desencadear doenças respiratórias, especialmente as pneumonias. (BARCELLOS et al., 2008). Dentre os agentes infecciosos envolvidos na casuística de doenças respiratórias pode-se citar Mycoplasma (M.) hyopneumoniae, Pasteurella (P.) multocida, Actinobacillus (A.) pleuropneumoniae, Haemophilus (H.) parasuis, bactérias gram-positivas, circovírus suíno tipo 2 (PCV2), vírus da influenza suína e o vírus da síndrome reprodutiva e respiratória suína (PRRS), considerado exótico em nosso país (MORES et al., 2015; MORES et al., 2016).
O diagnóstico deste caso clínico foi realizado por meio do histórico do plantel, sinais clínicos, achados macro e microscópicos. O animal apresentava sinais respiratórios (dispneia, respiração abdominal e posição de cão sentado), apatia e lentidão ao se locomover. Essas manifestações corroboram com os sinais descritos por GOTTSCHALK et al. (2019), no qual animais com pleuropneumonia superaguda adoecem repentinamente, apresentando sinais clínicos de apatia e sinais respiratórios distintos. Na fase terminal, é observado grave dispneia e o animal adota a posição de cão sentado. Além disso, é frequente a morte súbita dos animais, nos quais são encontrados com uma secreção abundante, espumosa e tingida de sangue pela boca e pelas narinas (TOBIAS, 2014). Neste caso, sugere-se morte secundária a insuficiência respiratória, considerando uma associação de fatores clínicos, como estresse provocado pela contenção e grave comprometimento pulmonar devido a pleuropneumonia.
De acordo com GOTTSCHALK et al. (2019) e KICH e LARA (2016) os achados macroscópicos da doença são caracterizados por pleuropneumonia necro-hemorrágica, onde os pulmões afetados apresentam consolidação cranioventral de coloração vermelho escura. Ocorre uma extensa pleurite fibrinosa com grande volume de líquido tingido por sangue na cavidade pleural. Casos crônicos são caracterizados por lesões hemorrágicas subpleurais focais e aderências pleurais fibrosas, normalmente encontradas no abatedouro. Sendo assim, as lesões encontradas na necropsia desse suíno se enquadram nas observadas em casos de pleuropneumonia descritas.
As alterações microscópicas observadas nesse caso se assemelham aquelas descritas na literatura nos casos de pleuropneumonia suína, lesão direta resultante da infecção por Actinobacillus pleuropneumoniae ou associado a agentes primários imunossupressores, como no caso do Mycoplasma hyopneumoniae, que deixa o animal vulnerável à ação de outros agentes (MORES, 2006; HORWAT, 2018).
O diagnóstico definitivo da pleuropneumonia é normalmente obtido pela cultura e identificação do agente. Tecidos e secreções das áreas lesionadas de pulmões podem ser semeados em ágar sangue de carneiro a 5%, acompanhado de uma estria de Staphylococcus epidermidis ou S. aureus, que fornecerá NAD para o crescimento do A. pleuropneumoniae (NASCIMENTO et al., 2016). Ágares de sangue alterados (“ágar chocolate”) ou ágar PPLO suplementado com NAD ou extrato de levedura permitem o crescimento do organismo, porém as colônias são menos distintas. Considera-se relativamente fácil isolar o agente em lesões pneumônicas de animais recém-mortos. No entanto, em alguns casos, o APP pode ser coberto por outras bactérias, como P. multocida (GOTTSCHALK et al. 2019). Em nosso estudo, não foi possível identificar o APP na cultura bacteriana. Sugerimos que esse resultado decorreu do fato de que o laboratório responsável pelas análises não realiza o isolamento desse agente rotineiramente, sendo assim, o meio de cultivo utilizado não propiciou o crescimento do A. pleuropneumoniae. No entanto, vale ressaltar que o diagnóstico definitivo de doenças respiratórias é essencial para evitar as perdas econômicas na cadeia suinícola.
Atualmente, o controle e prevenção da doença consiste na antibioticoterapia e vacinação. Contudo, essas medidas são utilizadas apenas para minimizar os sinais clínicos e lesões pulmonares, pois não impedem a infecção pelo agente (HOELTIG et al. 2018). Sabe-se que o A. pleuropneumoniae é resistente a uma ampla variedade de antimicrobianos, por isso, a melhor maneira de escolher um antibiótico é o isolamento do agente etiológico e realização do teste de sensibilidade in vitro (KICH e LARA, 2016; GOTTSCHALK et al. 2019). Dentre os fármacos utilizados para o tratamento da pleuropneumonia, destaca-se a enrofloxacina e o ceftiofur (GOTTSCHALK et al. 2019). Albernaz et al. (2020) observaram a eficiência do ceftiofur como único antibiótico no tratamento de pleuropneumonia em um potro, na dosagem de 2,0 mg/kg durante 8 dias. Já a enrofloxacina, na dose de 2,5 mg/kg durante 3 dias consecutivos reduz a mortalidade de suínos na fase aguda da doença (HOELTIG et al. 2018), porém nessa propriedade as bactérias presentes mostraram resistentes ao fármaco recomendado. No caso deste relato, os demais leitões que apresentavam sinais clínicos foram tratados e se recuperaram do quadro.
Doenças respiratórias são consideradas doenças multifatoriais, pois sua frequência e grau de severidade não dependem somente das características de virulência do agente, mas também dos fatores de risco presentes (MORES et al., 2015). Portanto, para manter o plantel livre da doença é imprescindível a adoção de medidas de biosseguridade, destacando a importância da aquisição de reprodutores livres do patógeno e correção de fatores de risco na criação (HOELTIG et al. 2018).
4 CONCLUSÃO
Baseado nas manifestações clínicas e alterações patológicas apresentadas pelo suíno descritas neste relato de caso, as quais assemelham-se às lesões descritas na literatura, foi possível chegar ao diagnóstico de pleuropneumonia fibrinosa. Todavia, vale ressaltar que o diagnóstico definitivo através da identificação do agente, de forma precoce, possibilitando melhorias sanitárias para controle da doença é essencial para evitar perdas econômicas no sistema de criação de suínos.
Esse artigo foi originalmente publicado em Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p. 76909-76919 aug. 2021 | ISSN: 2525-8761 |DOI:10.34117/bjdv7n8-082 | Disponível em: https://www.brazilianjournals.com/index.php/BRJD/article/view/33899/pdf

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Autores:
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