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Parâmetros hematológicos e níveis de cortisol plasmático em vacas leiteiras de alta produção no Sul do Brasil

Publicado: 6 de junho de 2011
Por: Romulo Campos do Departamento de Ciencia Animal, Universidad Nacional de Colombia, Campus Palmira, Colombia, e Luciana de Almeida Lacerda, Silvia Resende Terra e Félix Hilário Diaz González da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS -, RS
RESUMO
A adaptação metabólica é um processo importante para a produção de leite em vacas de alta produção leiteira. A fisiologia das mudanças hematológicas e endócrinas durante o pós-parto é complexa e muitas respostas homeostáticas são importantes para obter o máximo da produção de leite. O perfil hematológico é uma ferramenta diagnóstica útil nos diferentes estágios do ciclo produtivo de vacas leiteiras. O objetivo deste estudo foi avaliar alguns parâmetros hematológicos em diferentes estágios do ciclo produtivo de vacas leiteiras e correlacioná-los com o cortisol. Foram selecionadas 210 vacas multíparas, distribuídas por semanas: -3, -1 (antes do parto) e 2, 5, 8 e 11 (após o parto). Os parâmetros hematológicos avaliados foram hematócrito, concentração de hemoglobina, contagem total e diferencial de leucócitos. O estresse durante o periparto foi avaliado pela concentração de cortisol analisado através do método de radioinmunoensaio de fase sólida. Todos os parâmetros determinados (hematológicos e cortisol) estavam dentro do intervalo de referência para a espécie. Os maiores valores de cortisol foram observados na segunda semana após o parto. Alterações hematológicas associadas a sinais de alto estresse não foram observadas no presente estudo e isto provavelmente se deve ao estado de saúde satisfatório dos animais durante o período de experimento e às condições adequadas de manejo e nutrição.
Palavras-chave: Alterações hematológicas; Vacas leiteiras; Pós-parto; Cortisol; Estresse.
INTRODUÇÃO
Diversos estudos propõem o acompanhamento de parâmetros hematológicos para monitorar a saúde do rebanho leiteiro e relatam a associação destes com diferentes patologias. Além disso, diferentes pesquisas relacionam problemas de imunidade com altos níveis de cortisol nas vacas.1 Várias alterações nos parâmetros hematológicos podem ser observadas durante a gestação em diferentes espécies animais e fazem parte da adaptação da fêmea ao período reprodutivo em que ela se encontra.
No final da gestação o número de eritrócitos aumenta em conseqüência do efeito eritropoiético da somatotropina coriônica placentária, da progesterona e, talvez, da prolactina. O volume sangüíneo materno também aumenta em resposta à circulação utero-placentária e ao desenvolvimento do feto, mantendo adequada a oxigenação dos tecidos e pressões sangüíneas, materna e fetal. O acompanhamento de parâmetros hematológicos em bovinos e o estudo da sua relação com outros parâmetros sangüíneos, como o cortisol, são métodos que podem ser utilizados para avaliar a resposta do organismo frente aos processos fisiológicos de cada fase do ciclo produtivo em vacas leiteiras.
As alterações no leucograma de bovinos observadas durante o parto são típicas de uma resposta leucocitária a um quadro de estresse. O número de leucócitos totais encontra-se significativamente aumentado, principalmente devido ao aumento de neutrófilos, com ou sem desvio à esquerda. O número de cada tipo de leucócito varia, dependendo do grau de estresse e da condição das membranas fetais. Estas alterações são evidentes entre as 12 e 24 horas após o parto e diminuem nos dias subseqüentes.
O número de eritrócitos totais, a concentração de hemoglobina e o hematócrito podem sofrer alterações similares durante o parto. Um aumento significativo dos parâmetros eritrocitários foi observado durante o parto, fato relacionado com a diminuição do consumo de água durante o periparto. As alterações hematológicas relacionadas à lactação podem variar entre rebanhos e os baixos parâmetros eritrocitários durante este período podem estar relacionados com o nível de produção leiteira, com a nutrição do animal  e com o aumento do volume plasmático . Em geral, quanto maior é a produção leiteira, menores são os valores dos parâmetros eritrocitários.
Diversos estudos indicam que a alta incidência de doenças durante e após o período de transição está ligada à imunossupressão associada ao estresse, comum em vacas leiteiras. Alterações no sistema imune de vacas leiteiras durante o periparto e início da lactação foram relatadas por diversos pesquisadores, e com o manejo cada vez mais intensificado em rebanhos leiteiros, o risco de distúrbios metabólicos pode aumentar.
As alterações metabólicas ocorrem geralmente no início da lactação e são freqüentemente associadas a mudanças no manejo, na alimentação e na composição da dieta, mas também com alterações dos níveis hormonais que ocorrem durante o periparto. As alterações nos constituintes celulares e bioquímicos do sangue durante a gestação, parto e lactação em vacas leiteiras estão intimamente relacionadas com o cortisol, o hormônio do estresse.
Uma resposta imune eficiente se baseia na interação e no equilíbrio entre os diferentes tipos celulares e seus produtos. A incidência de doenças infecciosas, principalmente mastite e endometrite, pode também aumentar devido à supressão das funções imunológicas durante o periparto. Com a aproximação do parto, o número de leucócitos totais aumenta, principalmente em decorrência da neutrofilia. Todavia, as capacidades funcionais destas células estão prejudicadas durante este período.
Um dos pontos-chave para o controle de uma infecção é a rápida migração e recrutamento dos neutrófilos para o local da infecção.13 Estudos recentes têm se voltado para o mecanismo pelo qual o estresse se relaciona à redução da função imunológica. Muitos autores observaram que os glicocorticóides aumentam durante o periparto e que estes são capazes de reduzir a expressão de algumas moléculas (como a L-selectina) pelos neutrófilos, o que diminui sua capacidade de migração e chegada ao local de infecção.
Com a aproximação do parto, a quantidade de linfócitos e sua capacidade funcional diminuem, alcançando o ponto mínimo dias antes do parto. As células T são a subpopulação de linfócitos predominante na circulação sangüínea periférica dos ruminantes, chegando a 80% dos linfócitos totais.  Algumas funções desta subpopulação de linfócitos também se alteram durante este período, como a produção de interleucinas e interferon gama.
O objetivo deste estudo foi avaliar alguns parâmetros hematológicos como indicadores da saúde de vacas leiteiras e sua possível relação com o cortisol durante o período de transição e até a 11ª semana do ciclo produtivo de vacas de alta produção.
MATERIAL E MÉTODO
Foram selecionadas 210 vacas multíparas da raça Holandesa, com produção superior a 25 kg/vaca/dia, pertencentes a cinco rebanhos comerciais considerados como sistemas intensivos de semi-confinamento de leite para as condições do Sul do Brasil (alimentação com base em suplementação e produção de leite acima de 8000 kilos por lactação). Após o exame clínico e verificação das condições exigidas para o estudo, foram analisadas amostras de 173 animais. A alimentação consistiu de silagens de milho e sorgo, forragem Tifton (Cynodon nlemfuensis), concentrado e suplemento mineral. Para o cálculo do valor nutritivo do alimento foi usado o programa Spartan Ration Evaluator.17
O ecossistema geográfico de localização dos rebanhos correspondeu ao planalto médio do Estado do Rio Grande do Sul. Foram avaliados dois períodos climáticos extremos para a zona temperada: inverno (dois rebanhos) e verão (três rebanhos). Em cada rebanho, os animais foram divididos em seis grupos de sete animais segundo o período do ciclo produtivo que se encontravam: pré-parto (3 e 2 semanas antes do parto esperado) e pós-parto nas semanas 2, 5, 8 e 11 da lactação. As amostras do período pré-parto e as duas primeiras da lactação corresponderam ao período de transição. Com o objetivo de reduzir os efeitos de fontes de variação externas e para avaliar com maior precisão o efeito período (pre e pós parto) sobre os resultados das análises, a amostragem dos animais foi efetuada no mesmo dia em cada núcleo de produção.
Todas as amostras de sangue foram obtidas mediante punção da veia coccígea em tubos a vácuo de 5 mL contendo solução do ácido etilenodiaminotetra-acético tripotássico (EDTA-K3) a 10%, como anticoagulante para a realização dos parâmetros hematológicos, e em tubos de 10 mL com heparina sódica para a dosagem do cortisol plasmático. Previamente a cada coleta de sangue, realizou-se o exame clínico para descartar qualquer animal doente ou suspeito de doença (problemas podais, endometrite, mastite, cetose e acidose clínica). Igualmente, foi verificado o período do qual o animal fazia parte e registrada a produção do leite dos dias prévios e do dia da coleta. Imediatamente após a coleta de sangue, foi realizado o esfregaço sangüíneo e as lâminas foram armazenadas em recipientes adequados, protegidas da luz e de contaminação. Para a coloração do material, foi utilizado o corante de Wright (Merck, Darmstadt, Alemanha). A contagem total de leucócitos foi realizada manualmente pela técnica de contagem em câmara de Neubauer, o hematócrito foi determinado pela técnica de microhematócrito (10.000 rpm por 5 minutos) e a determinação da hemoglobina foi feita mediante a técnica colorimétrica do cianeto de potássio (Labtest, Lagoa Santa, MG).
A partir do esfregaço sangüíneo corado de cada animal, foi realizada a contagem diferencial de leucócitos e avaliação da morfologia celular. A determinação do cortisol plasmático foi efetuada mediante radioinmunoensaio (RIE) de fase sólida com reativos comerciais (ICN Biomedicals, Irvine CA, USA). No intuito de avaliar o estado de saúde da glândula mamária, a contagem das células somáticas (CCS) presentes no leite das vacas durante os períodos 2, 5, 8 e 11 da lactação foram determinadas mediante citometria de fluxo (Somacount 300, Bentley Instruments Inc, Chaska, MN, USA).
Foram analisados os possíveis efeitos principais de rebanho e período de coleta mediante analise de variância da sub-rotina GLM do pacote estatístico SAS V8 (SAS)18 e, sempre que necessário, as variáveis foram transformadas para garantir a sua normalidade. A variável época foi analisada através do teste de T para amostras independentes. Quando necessário para o teste de médias foi empregado o teste de Tukey. Igualmente, através da correlação de Pearson, foram analisadas as relações entre as variáveis sangüíneas e os valores plasmáticos do cortisol.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na tabela 1 estão descritos os valores médios dos parâmetros hematológicos avaliados para os dois períodos climáticos de estudo, demonstrando que as condições de verão influenciaram a dinâmica sangüínea na maioria dos parâmetros estudados. Esta observação já foi descrita por outros pesquisadores que encontraram variações sazonais nas contagens de leucócitos totais em bovinos, sendo os maiores observados durante o verão.
Parâmetros hematológicos e níveis de cortisol plasmático em vacas leiteiras de alta produção no Sul do Brasil - Image 1
As diferenças entre os rebanhos avaliados ocasionaram a maior variação sobre as variáveis estudadas, situação que pode ser explicada pelas alterações genéticas, de manejo e alimentação, e nos planos de sanidade que são utilizados em cada um dos rebanhos. A seleção genética para o aumento da produção de leite aumenta sensivelmente a carga metabólica das vacas leiteiras, o balanço energético tende a ser negativo durante a fase de lactação estudada o qual leva ao estresse nutricional. Estes fatores estão relacionados ao aumento da incidência de doenças infecciosas.11 A influência da dieta sobre o hemograma de bovinos também tem sido estudada, sendo observada leucocitose e monocitose em vacas alimentadas com silagem quando comparadas a vacas alimentadas com forragem verde.20
Os parâmetros hematológicos estudados encontram-se dentro dos valores de referência para a espécie bovina, e podem ser válidos para as condições ecológicas e de produção animal da região Sul e Sudeste do Brasil, onde se encontram os estados com maior produção leiteira individual do país. Em geral, a resposta leucocitária em bovinos difere daquela observada em outras espécies animais. As alterações hematológicas nesta espécie são sugestivas de considerações diagnósticas, como no caso de septicemias ou endotoxemias, sendo raramente específicas para uma determinada afecção. Uma septicemia bacteriana aguda freqüentemente é caracterizada por neutropenia ao invés de neutrofilia, e em ruminantes existe uma tendência menor para o desenvolvimento de uma neutrofilia significante.
Parâmetros hematológicos e níveis de cortisol plasmático em vacas leiteiras de alta produção no Sul do Brasil - Image 2
As contagens diferenciais de leucócitos (Tabela 2) obtidas neste estudo não mostraram alterações significativas. As maiores alterações hematológicas foram observadas no final da gestação, período no qual o crescimento do feto obriga uma redistribuição dos componentes sangüíneos. Observações similares já foram relatadas nas contagens totais de leucócitos em vacas durante o periparto.22,23 Outros estudos indicam que há um aumento gradual de leucócitos à medida que o parto se aproxima, observando-se um pico de aproximadamente 13 x 10/mL nove horas após o parto, voltando aos valores normais 3 dias após o parto.
Normalmente, diferentes protocolos de imunização para doenças de controle não obrigatório (ex. leucose, diarréia viral bovina, rinotraqueíte bovina infecciosa, e/ou diferentes programas de controle de parasitas) são adotados para cada rebanho. É possível que estes rebanhos apresentem alterações nas variáveis hematológicas principalmente no que se refere às células associadas à defesa celular (ex. linfócitos T). No presente estudo, observou-se que o rebanho influenciou de forma contundente a resposta hematológica, quando comparado ao efeito período (momento da coleta).
Parâmetros hematológicos e níveis de cortisol plasmático em vacas leiteiras de alta produção no Sul do Brasil - Image 3
O cortisol plasmático foi monitorado para avaliar o nível de estresse durante o periparto. O comportamento deste hormônio nos diferentes períodos pode ser observado na figura 1. Os maiores valores foram detectados na segunda semana após o parto, situação que é fisiologicamente aceitável, uma vez que neste período a produção do leite é desencadeada e há aumento da síntese de lactose para garantir a maior produção de leite e outros produtos da gliconeogênese modulada pelo cortisol. Valores altos de cortisol também foram encontrados durante o pré-parto, o que também pode estar relacionado com o período de transição, caracterizado por grandes desafios na homeostasia. O cortisol não foi dosado no dia do parto, mas outros autores encontraram elevados valores 
neste dia.
 
CONCLUSÕES
Não foram encontradas correlações significativas entre o cortisol plasmático e a maioria dos parâmetros hematológicos avaliados. Os resultados indicam que os animais do estudo estão sob condições de saúde e manejo satisfatórias, uma vez que não há indício de estresse clínico. A maior concentração de cortisol foi encontrada durante a segunda semana de lactação. Além disso, não houve correlação significativa entre os valores hematológicos e a CCS do leite. Os valores hematológicos obtidos neste estudo podem ser usados como valores de referência para bovinos de raça Holandesa sob condições de produção do Sul do Brasil. O estudo de métodos de auxílio diagnóstico para uma avaliação geral do rebanho, como a determinação de alguns parâmetros hematológicos, permite uma oportuna ação sobre o manejo e saúde dos animais.
 
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Autores:
Romulo Campos
Universidad Federal Do Rio Grande do Sul UFRGS
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