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Dados e Fatos sobre Comércio Internacional de Carnes Bovinas

Publicado: 13 de março de 2012
Por: Osler Desouzart (Consultor; ODConsulting- Planejamento e Estratégia)
O mestre e guru, Professor Vicente Falconi, já nos ensinava em sua obra indispensável, TQC Controle da Qualidade Total no Estilo Japonês que o objetivo de uma empresa era sobreviver diante da concorrência internacional, condensado em sua frase genial "o mercado internacional inclui a rua em que vives". Os ensinamentos de Falconi precedem ao fenômenoda globalização se tornar tema corriqueiro e à explosão internacional que o agronegócio brasileiro experimentou, principalmente a partir de 1995. O gráfico I nos permite visualizar o quanto o mestre tinha e tem razão. A cada ano que passa o comércio internacional de carnes responde por parcelas crescentes da produção mundial decarnes. Evidentemente que a cada crise econômica mundial, este crescimento sofrerá solução de continuidade, pois diante de uma queda na demanda é muito mais fácil, rápido e economicamente atraente frear importações do que diminuir a produção nacional. Passado o período de crises, as transações internacionais voltam a se acelerar e estou prognosticando que em 2011 mais de 9,5% da produção mundial de carnes será consumido fora do país onde foi produzida. O comportamento do mercado internacional de carnes nos três primeiros meses do ano permite mesmo dizer que meus prognósticos serão facilmente superados e que neste ano estarem os de volta ao crescimento de dois dígitos.
Gráfico I
Dados e Fatos sobre Comércio Internacional de Carnes Bovinas - Image 1
Aqueles que integram as equipes de planejamento estratégico de suas empresas nunca deverão deixar de considerar que crises são cíclicas. Mais cedo ou mais tarde elas ocorrerão e por mais severas que sejam, como a de 1929, elas não são eternas e um dia o mercado retomará.
A única coisa que tem crescimento permanente e garantido são a carga fiscal brasileira e o aumento dos escândalos envolvendo malversação do dinheiro público, majoritariamente impunes. Isto acompanhado por declarações de autoridades informando que a nossa carga fiscal é igualzinha a da Dinamarca, omitindo que nossos serviços públicos aproximam-se aos de Burundi.
Aproveito este interregno para pedir aos leitores que me perdoem por não seguir a nova orientação dos livros didáticos, custeados com o dinheiro público que sai dos nossos bolsos, ensine a irrelevância da concordância do plural, enquanto o Ministro da Educação - também pago com o nosso suado dinheiro - diz que seu ministério não tem nada com isso, pois seria censura interferir com a escolha de livros pelo corpo docente. Estou aguardando que se anuncie para breve a flexão dos advérbios, consagrando a forma "menas" usado fartamente em discursos e que em nome de se evitar o preconceito lingüístico seja perfeitamente aceito
como português escorreito a frase: "os cumpanheiro tá sofrendo menas perseguição da zelites que só faz pobrema". Ensinar não significa vilipendiar a forma popular do falar, pois esta se aprende fora da escola e não carece de livros didáticos. Ensinar é dar o direito de aprender a outra forma de falar e escrever o idioma, consagrada por escritores e pela academia. Quando se confunde isto por motivações ideológicas prega-se o maniqueísmo ditatorial. Que tal dar aos estudantes a possibilidade de falar e escrever "os companheiros estão sofrendo menos perseguições das elites que só causam problemas"?
Que Machado de Assis os perdoe e que Olavo Bilac seja levado da condição de poeta para profeta ao ter escrito: "Criança, jamais verás terra como esta".
Saindo das "razões pelas quais vou emigrar" e voltando ao tema do comércio internacional de carnes. Não há hoje como equacionar o abastecimento de carnes no mundo sem contemplar que parcela desse abastecimento terá que ser feito fora das fronteiras nacionais. Esta situação se torna particularmente verdadeira quando vemos que Ásia e África serão os grandes vetores da demanda futura de carnes. Ditas regiões estão experimentando um aumento dos ingressos de suas populações que até atingirem US$ 7,00/per capita/dia serão utilizados majoritariamente para melhoria de suas dietas, com maior ingestão de produtos de origem
animal. Estes requerem quatro vezes mais recursos naturais que os de origem vegetal e em muitos dos países daquelas regiões tais são insuficientes para presidir à mudança inevitável da dieta de suas populações.
Em média, nos países ricos "come-se" 3.000 litros de água por dia e "bebe-se" entre 2 e 5 litros de água por dia2. Na medida em que a renda aumenta o consumidor sai do trigo, do milho, do arroz e da soja para as carnes. Um quilograma de carne bovina exige até 16.0003 litros de água para ser produzido.
Muitos dos países asiáticos e africanos que responderão por 89,7% do crescimento demográfico mundial4 até 2050 (cf.Tabela I) apresentam carências de recursos naturais necessários à migração da "soja para o bife" .
Tabela I
A carência desses recursos pode ser contornada através da importação de "recursos naturais virtuais", ou seja, através da importação de produtos que exigem maiores quantidades de recursos naturais (principalmente, terra arável e água) na sua produção.
No caso das carnes, isto já está acontecendo como demonstrado no Gráfico II, onde podemos constatar que os Países em Desenvolvimento que respondiam por 15,4% das importações mundiais de todas as carnes, hoje respondem por 55,4% das importações mundiais.
Gráfico II
No Brasil, mui infelizmente, ainda vigora a cultura do "eu acho", "eu estou certo que", "estou convencido" e outras afirmações do empirismo. Ainda não faz parte dos valores coletivos de nossa cultura empresarial a orientação pelos "fatos e dados", preconizados pelo mestre Falconi e presente no processo decisório de muitas empresas brasileiras de ação global.
Se eu perguntar a uma platéia como estaria a orientação das exportações mundiais de todas as carnes, a visão ufanista afirmaria que seguiram o mesmo caminho das importações, e que hoje aquelas estão lideradas pelo Brasil.
O gráfico III apresenta dados que seguramente surpreenderiam a grande maioria. As exportações mundiais seguem sendo dominadas pelos Países Desenvolvidos. E alerto aos leitores que os dados de 2009 e 2010 devem ser considerados com uma necessária reserva. Ao contrário daqueles de 1965 a 2008, individualizados por países, estes mais recentes traduzem os 30 principais países e estimam os dados dos demais. Eu confesso que ficarei gratamente surpreso se os dados 2009/10 se confirmarem, mas temo que a prevalência dos países desenvolvidos nas exportações mundiais siga em patamares superiores a 60% do total.
Gráfico III
Essa continuidade da prevalência dos países desenvolvidos nas exportações mundiais de carnes deve-se a uma política de generosos subsídios e protecionismo. O dado mais recente disponível sobre as exportações por países data de 2008 e no Gráfico IV apresentamos os dez principais exportadores mundiais naquele ano. Verifiquem que o único país em desenvolvimento que figura desta lista é o Brasil, um estranho no ninho.
Gráfico IV
Ninguém gosta de estranhos no ninho e se busca sempre extirpar quistos. Países europeus e norte-americanos sofreram episódios de BSE, Febre aftosa, HPAI, anaplasmosis Bovina, bluetongue, etc e suas exportações suspensas por períodos mínimos. Se os episódios tivessem ocorrido no Brasil indago se ditas suspensões teriam tido o mesmo tipo de tratamento. A pergunta é naturalmente retórica, pois sabemos bem qual é a realidade de dois pesos e duas medidas quando se trata de avaliar situações sanitárias em países desenvolvidos e em desenvolvimento.
É perfeitamente lícito falar de obstáculos pseudo-sanitários como forma de protecionismo comercial. Dos 10 países que lideram as exportações mundiais, 2 são membros do NAFTA, 7 da União Européia e o Brasil integra o bloco do "eu sozinho", já que o MERCOSUL há muito se desviou de seu propósito de integrar as economias da Região num bloco para ser pautado por uma postura de esquerdismo de centro acadêmico. Enquanto isso os países membros criam obstáculos ao comércio intra-bloco e são habitualmente os primeiros a suspender as importações dos demais membros quando da ocorrência de episódios sanitários. Ao invés de caçarem em bando e se defenderem em bando, o MERCOSUL está se tornando um instrumento de protecionismo, de favorecimento às importações extra-bloco, quando não da facilitação de maquiagens de origem.
Os Estados Unidos e a União Européia dividem com o Japão a primazia dos subsídios à agricultura e os dois primeiros à exportação de seus produtos agrícolas, incluindo nessa postura de suporte o protecionismo sob as formas as mais diversas e em constante processo de inovação. Estão eles errados em defender os interesses de suas economias? Eu diria que não, por mais que condene subsídios à produção agrícola já que geram distorções nocivas e prejudiciais aos países em desenvolvimento e os condenam a uma perenização de sua pobreza. Não sou contra subsídios à agricultura, pelo contrário sou amplamente favorável, sempre e quando esses sejam para garantir a renda do agricultor, o que se pode fazer sem a promoção de gerar excedentes produtivos colocados no mercado internacional por meio de subsídios ou de "ajuda alimentar", esta sempre coincidindo com os excessos produtivos dos países desenvolvidos e não com os episódios de fome em países pobres.
Quando avaliamos a participação percentual desses 10 países nas exportações mundiais de carnes (Gráfico V e Tabela II), verificamos que os sete países da União Européia dominavam as vendas no mercado internacional de carnes até 1995, quando então surge uma potência exportadora, os Estados Unidos, a qual se soma outra em 2005, o Brasil. Somadas essas duas novas potências alcançam 31,1% das exportações mundiais em 2005, percentual que sobe para 34,3% em 2008 e que, segundo dados estimados pela FAO9, teria alcançados 49,1% em 2010.
Gráfico V
 
Tabela II
Ao constatarmos essa evolução dos Estados Unidos e Brasil é de se indagar se os setores decarnes dos dois países não teriam pontos de convergência a uni-los para além dos óbviospontos de divergência entre dois competidores internacionais? Onde estariam mais bemdefendidos os interesses do campo brasileiro? No MERCOSUL onde ao protecionismo dosvizinhos respondem nossas autoridades com pedidos aos produtores brasileiros para quecompreendam os interesses maiores implícitos nas constantes concessões? No romantismo dodiálogo Sul-Sul, belíssimo para poesia de boas intenções e realidade de não contar com o apoiopara quaisquer das pretensões brasileiras nos organismos internacionais? Ou na busca de acordos bilaterais com quem compartilhamos a condição de potência exportadora e onde osempresários brasileiros de carnes estão presentes como grandes atores?Os interesses presentes no mercado internacional de carnes e suas preparações não sãopequenos. As importações em 2008 somaram mais de US$ 100 bilhões (US$ 103.059.546.000)e movimentaram mais de 35 milhões de toneladas (35.398.081 tm). As carnes de aves e suaspreparações dominam os volumes (cf. Gráfico VII), mas em valores as carnes bovinas e suaspreparações respondem por 31,7% (valor de US$ 32,7 bilhões de dólares), sendo superadapelas importações de carnes suínas e suas preparações.
Gráfico VI
Dados e Fatos sobre Comércio Internacional de Carnes Bovinas - Image 14
Gráfico VII
Dados e Fatos sobre Comércio Internacional de Carnes Bovinas - Image 15
Considerando que esta edição circula na FEICORTE, detalharemos a carne bovina, onde o Brasilocupa a liderança das exportações mundiais. Na Tabela III encontra-se como foi compostoesse comércio de carnes bovinas e suas preparações em 2008.
Tabela II
Nas exportações totais de todas as carnes bovinas e suas preparações, o Brasil liderou em2008, seja em quantidade quanto em valores (cf. Gráficos VIII e IX ).
Gráfico VIII
Gráfico IX
Sob o risco de cansar aos leitores com excesso de dados, creio que é indispensável mostrar não somente a situação dos 12 principais países em 2008, mas sua evolução ao longo dos anos.
As Tabelas IV e V traduzem respectivamente a evolução dessas exportações em valores equantidade, com o domínio brasileiro nos anos de 2005 e 2008. Em volume somos os maioresexportadores desde 2004 e em valores essa conquista é mais recente, datando de 2006quando superamos a Austrália que até então detinha a primazia.
Tabela IV
Dados e Fatos sobre Comércio Internacional de Carnes Bovinas - Image 22
Tabela V
Dados e Fatos sobre Comércio Internacional de Carnes Bovinas - Image 23
Na Tabela VI, verificamos que em preço médio por tonelada de carne exportada, o Brasil ocupa 9º lugar nessa lista. Há explicação, ou como dizia um ex-chefe meu, há sempre explicação. O mix de produtos exportados difere de um país para outro, assim como o destino dessas exportações. Além disso, os países da União Européia beneficiam-se das vendas intracomunitárias que não estão sujeitas aos impostos de entrada pagos por terceiros países em suas vendas à CEE.
Tabela VI
Dados e Fatos sobre Comércio Internacional de Carnes Bovinas - Image 24
Os Gráficos X e XI apresentam o crescimento percentual das exportações de 11 desses 12principais países exportadores. Eliminamos a Índia na medida em que suas exportações em1965 eram ínfimas, o que destorceria a apreciação dos gráficos. Os três principais países poreste critério - Alemanha, USA e Brasil - guardam suas posições, tanto no crescimento do valorquanto do volume de suas exportações (cf. Gráficos X e XI).
Gráfico X
Gráfico XI
A partir de 2004 o Brasil constrói uma liderança nas exportações de carnes bovinas, situação que se confirma se considerarmos os dados preliminares divulgados pelo Food Outlook de novembro de 2010 da FAO (cf. Tabela VII). Todos os prognósticos futuros elaborados pelasmais distintas fontes - MAPA, OCDE-FAO, USDA - coincidem na previsão de que essa liderança estaria confirmadas pelo menos até 2019. Quem atua nesse campo de mercado internacional de proteínas animais endossa com facilidade essas previsões. Além disso, empresas brasileiras do segmento bovino estão hoje presentes com operações locais em inúmeros países do mundo, criando, abatendo, transformando e comercializando gado e carnes bovinas. Muitas das exportações de terceiros países são fruto desta atuação e em muitos casos transformaram positivamente as perspectivas da pecuária em alguns desses países. O segmento bovino enfrenta inúmeros desafios futuros. Alguns deles foram brevemente abordados neste artigo, como o aspecto de que a demanda futura por carnes e a preferência por espécies será condicionada pela carência e má distribuição dos recursos naturais no fundo, mormente terra arável e água. As espécies mais eficientes prevalecerão. Isso não significa que a demanda por carne bovina desaparecerá. Entretanto, é inevitável que acarne bovina se torne progressivamente mais cara, fazendo com que os cortes selecionados se tornem artigos de luxo e acessíveis somente aos segmentos de maior renda, que hoje representam < 15% da população mundial. Os produtos transformados de carne bovina estarão cada vez mais presentes na mesa do consumidor mundial. A geografia da produção também mudará fazendo com que países de escassos ou limitados recursos naturais busquem suplementar com importações parcelas da expansão do consumo de suas populações, inevitável na medida em que a renda de suas populações aumente. Nesse cenário um país como o Brasil, onde o trinômio terra, água e fotossíntese está presente tem tudo para manter por décadas uma posição de liderança em produção e exportação decarnes bovinas. Ainda que o berço seja esplêndido não oferece ele segurança de sono tranqüilo e nem garantia de sucesso. O setor de bovinos será obrigado a se re-inventar e a se questionar - até quando poderemos seguir convivendo com uma cabeça por hectare quando a terra, recurso finito, se tornará progressivamente mais cara? Até quando se conviverá sem o conceito de produtividade de água numa espécie que é a campeã no uso do mais escasso de todos os recursos? Até quando prevalecerá 48 meses para se ter um animal pronto quando muitos o produzem em menos da metade desse tempo? Até quando prevalecerá a postura individual, obloco do eu sozinho, num mercado que é global, sujeito a valores e pressões globais? Convido-os a que dediquem uns poucos dias a refletir e a partilhar idéias sobre o futuro do segmento bovino.
Tabela VII
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Osler Desouzart
3 de julio de 2012

Quero pedir desculpas públicas ao Dr.Egberto Bastos e ao Dr.Ivan Luz Ledic pelo atraso em comentar. Viajo muito pois tenho família, que me enche de alegrias, e um governo, que me enche de tristezas e às vezes de desesperança, para sustentar. Só hoje um e-mail de alerta do Engormix fez com que eu fosse ao forum verificar ditos comentários. Aceitem por favor essas desculpas.

Osler Desouzart
3 de julio de 2012

Maravilhoso comentário, com riqueza de dados, que se lança num momento em que tenho refletido muito sobre o segmento de leite. Por que o Brasil, candidato por suas condições de recursos naturais a potência pecuária não decolou no leite como o fez na carne? Por que ao visitar supermercados vemos produtos importados em abundância concorrendo com os produtos brasileiros? Por favor não me interpretem mal. Sou inteiramente favor do livre comércio e acho que protecionismos são o melhor estímulo à ineficiência e marasmo. Mas me indago porque nosso setor de lácteos quando faz produtos diferenciados, como queijos finos, coloca-os a níveis de preço até superiores aos de marcas consagradas internacionais e provenientes de países que firmaram tradição na produção de queijos, como França e Holanda. Vamos dos queijos tipo brie e camembert brasileiros vendidos no varejo de São Paulo a preços de R$ 69,00 o kg, valor idêntico aos dos importados da Normandie francesa, região berço? Porque vamos dos queijos de valores tais para o mar de mesmices de queijos tipo mozarela e lanche a preços comoditizados de R$ 12,00 p. kg? Porque as empresas do segmento lácteo lutam para melhorar EBITDA que quando alcançam 14% são celebrados? Porque ainda raciocinamos em termos de litro por animal, quando o mundo raciocina em termos de matérias primas lácteas por animal (proteína, gordura, sólidos, etc)? Há muito porque e devo confessar que na vida só fiz duas conferências sobre leite, colocando o quem é quem do mercado internacional. E confesso que na última de que participei saí desestimulado, já que apresentei a um público produtor da cadeia perguntas para as quais não tenho resposta sobre nossa baixa competitividade. No melhor estilo do Mestre Falconi buscava um "toró de idéias" que nos permitisse começar a identificar causas e não efeitos. Mui lamentavelmente eram épocas de eleições e havia pessoas presentes cujo objetivo era de horizonte eleitoreiro e que preferiram trocar a buscar de causas por slogans do tipo "função social" e acusações aos "grandes grupos que exploram o produtor". Quando se tem no horizonte como objetivo maior a próxima eleição não se progride. Recolhi-me à minha insignificância e prometi-me nunca mais colocar os pés naquele evento, ainda que realizado no meu torrão natal, o Rio Grande do Sul. Registro com satisfação e orgulho a ponderação do colega investigador. Vou repensar minha posição e voltar a estudar com maior profundidade o leite, pois julgo inevitável que venhamos a ter papel maior no abastecimento internacional de lácteos. O leite merece que pensemos para além dos objetivos da próxima eleição. Somos potência em produtos pecuários. Não podemos ser uma potência manca. Obrigado ao colega pela ponderação.

Osler Desouzart
3 de julio de 2012

Prezado Dr.Egberto,

Uma das teorias seria de que houve um plano estratégico onde se fundamentou que o Brasil só se tornaria potência se tivesse projeção na política internacional (daí os esforços por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU; vários insucessos na tentativa de comandar organismos internacionais; presença em missões de paz internacionais sob mandato da ONU; aumento da participação no FMI; etc), alguma projeção militar (restrita a missões de paz e reaparelhamento das forças armadas, primariamente focado em meio de defesa a recursos na plataforma continental) e finalmente se tivesse atores no segmento econômico com projeção internacional. O Brasil é uma potência do agronegócio e esse seria um segmento natural para receber apoio e incentivo do Estado na formação de grupos de ação global ou, como prefiro dizer, de ação glocal. Ao apoiar empresas do segmento de proteínas animais evitar-se-ia que se repetisse com as carnes, principalmente (em lácteos ainda temos uma longa estrada por percorrer), o que se passou com os grãos, onde somos a segunda potência produtora e exportadora e onde os atores são Cargill, ADM, Bunge, L.Dreyfuss e outras empresas glocais de capital estrangeiro. Com as carnes visava-se que o Brasil fosse sujeito da frase e não simples adjunto adverbial de lugar. Esta é uma mera teoria.
Além disso, sabemos bem por inúmeros exemplos que boas teses e intenções acabam sendo usadas para fitos menos republicanos. Esperemos que este não seja o caso e que não testemunhemos novos malfeitos.
As empresas brasileiras glocais de carnes tem uma posição hoje de destaque e fica difícil a qualquer equação de abastecimento ignorá-las. Tal entretanto não é garantia de êxito. Na atividade empresarial não há garantia de êxito. Empreendimentos não são carros onde podemos obter garantias de três anos em carros montados no Brasil ou 5 anos em carros importados, cujas peças de reposição custam uma fortuna. Por enquanto fico com meu Honda Civic 2003 pois recuso-me a pagar US$ 37.000 por um carro que, fabricado no Brasil, é disponibilizado ao consumidor mexicano por US$ 21.000.
Fico também com a esperança que motivações maiores prevaleçam sobre a visão pequena e menor de uma eventual perpetuação de poder.

Ivan Luz Ledic
2 de julio de 2012

Trabalho maravilhoso e com informações consistentes, com projeções animadoras para nosso país que está inserido nesse contexto e garantindo o abastecimento global. Gostaria muito de ver um trabalho similar a esse com relação ao leite. Tenho algumas informações sobre o assunto, mas não tão completas como o aqui exposto.
Abaixo alguns dados que possuo sobre o assunto produção e exportação de leite, acanhado perto das informações contidas nesse artigo do Dr. Osler, mas que de certa forma demonstra que os países em desenvolvimento, principalmente do continente latino americano passarão a fazer parte da solução para abrandar a escassez de alimentos no mundo.
A expressão Terceiro Mundo indica o conjunto de países subdesenvolvidos, de acordo com a Divisão de Estatística das Nações Unidas. Dos 173 países e possessões, 128 (74%) são considerados subdesenvolvidos, conforme relação da Food and Agriculture Organization (FAO, 2007). Apenas a Mongólia, Coréia do Norte e a frígida Groenlândia estão fora da faixa trópico-subtrópico.
Uma análise da distribuição de leite de bovinos no mundo revela que a produtividade de leite nos países menos desenvolvidos é extremamente baixa O conjunto de países subdesenvolvidos (CPS) possui 58% das terras do planeta, 79% dos seres humanos (população global de 6,5 bilhões) e 75% do total de vacas. Apesar disso, entretanto, produzem apenas 39% da produção mundial de leite.
Seremos, no mundo, segundo estimativas, 9 bilhões de pessoas em 2.025 (3 bilhões a mais). A fome no mundo continua a aumentar e de todas as zonas do Mundo, apenas a Ásia, o Pacífico, a América Latina e as Caraíbas conseguiram uma redução no número absoluto de pessoas subalimentadas.
Hoje existem premissas de que 850 milhões de pessoas (9,35%) são ameaçadas pela fome, 700 milhões (7,7%) pela desnutrição e 24 mil pessoas morrem diariamente, com número total de vítimas anuais a mais de 45 milhões.
De outro lado, o crescimento ‘patológico’ dos centros urbanos não tem sido capazes de absorver a mão-de-obra, mesmo com o crescimento muito rápido no emprego não agrícola, insuficiente para promover a estabilização ou diminuição do subemprego.
DOS 550 BILHÕES DE LITROS DE LEITE PRODUZIDOS PELO GADO BOVINO A NÍVEL GLOBAL, SÓ 12% É UTILIZADO PARA COMÉRCIO INTERNACIONAL, POIS HÁ NECESSIDADE INTERNA PARA MANTER O CONSUMO DOMÉSTICO DA POPULAÇÃO.
Com as novas políticas econômicas e investimentos algumas coisas estão melhorando em alguns países. A projeção é que o consumo entre 1993 e 2020 aumente 0,2% por ano em países desenvolvidos e 3,3% anual em países em desenvolvimento.
NOS PRIMEIROS O CONSUMO PASSARÁ DE 245 MILHÕES DE TONELADAS A 263 MILHÕES DE TONELADAS, JÁ NO TERCEIRO MUNDO SERÁ MAIOR, DE 168 MILHÕES DE TONELADAS PARA 391 MILHÕES. Quanto ao consumo per capita por ano nos países desenvolvidos diminuirá levemente de 192 kg a 189 kg, enquanto nos países em desenvolvimento aumentará de 40 a 62 kg.
Para dar um exemplo na Índia 200 milhões de pessoas saíram da linha da pobreza e em 25 anos a China tirou 300 milhões da população da miséria.
Considerando somente essas 500 milhões de pessoas da Índia e China que irão aumentar o consumo, que seja de só 30 kg/pessoa/ano, leva a uma demanda de mais 15 bilhões de litros/ano. Isso representa 35% do total de leite produzido pelo mundo.
Como fazer então para abastecer essa população e manter o abastecimento interno do mercado de lácteos de quem já produz?
América Latina conta com uma disponibilidade importante de recursos, que ainda que com profundas diferenças por países, permitem que nesse continente se consolide e melhore sua posição de importância mundial na produção bovina.
O CPD já está no limite físico de sua capacidade de produção e a solução deve ocorrer através do CPS, para aumentar em pelo menos mais 23% do leite produzido (cerca de 126 bilhões de litros), através de uma política de fomento pecuário que tem de atacar ao mesmo tempo diversas frentes como: nutrição, alimentação, melhoramento genético e sanidade.
Entretanto, vem acontecendo no Terceiro Mundo transformações que geram esperanças. Em algum momento no último terço do século XX, a larga vala ou abismo, que separava as pequenas minorias dominantes e tirânicas do resto do povo dos países CPS, começou a ser tapada pela transformação geral de suas sociedades.
Todavia as conseqüências dessa transformação ainda esperam por mais alguma coisa, pois os velhos rurais e os jovens urbanos estão separados por centenas de quilômetros de péssimas estradas e séculos de desenvolvimento.
Como resultado dessa transformação, a produção de leite na América Latina está com um crescimento forte na última década do século XX, na ordem dos 74 bilhões de litros.

Dos 550 milhões de toneladas de leite líquido de vaca (83,5% da produção total), 76% dessa produção contribuíram 22 países, 47,8% a produziram tão somente oito países e com 15,0% contribuiu só Estados Unidos. América do Sul participa com 9,5% da produção mundial, enquanto Centro América o faz com 2,5%.
Ao tomar a produção de leite líquido de vaca desde o ano 2003 e projetando para 2009, o incremento média dos seis anos foi de 2,46%.
América do Sul durante 2008 foi a região do mundo com o crescimento em produção de leite mais acelerado e isto o demonstra sua participação na produção mundial, que era de 9,09% em 2003 para 9,45% em 2007.
A produção de leite nos países desenvolvidos entre 2010 e 2020 aumentará 0,4% por ano, passando de 348 milhões de toneladas a 371 milhões. A produção per capita diminuiu, ao passar de 272 kg a 267 kg. Este crescimento moderado da produção nestes países se deve principalmente a crescimentos nos Estados Unidos e Oceania.
Por outra parte, a produção nos países em desenvolvimento no mesmo período aumentará mais, de 2,0% anual, passando de 164 milhões de toneladas a 401 milhões de toneladas. O aumento da produção na Latino América especificamente será de 2,7% anual. O crescimento da produção seria o resultado de uma maior produção por vaca.

Em conjunto, uma análise da imensa superfície em pastos, o número da população bovina, a baixa taxa de lotação animal e a produção por bovino, podem indicar os países em desenvolvimento como os de maior capacidade para responder a aumentos de produtividade.
Assim, o leite tem tudo para tornar-se uma importante ‘commodity’ para o CPS, principalmente na América Latina.

Um exemplo está no Brasil, onde isso já está ocorrendo. Nos últimos 16 anos o número de vacas ordenhadas aumentou em 11,5%, enquanto a produção de leite foi mais elevada; teve crescimento de 77%. Possivelmente esta seja uma das maiores taxas de crescimento de produtividade de leite do mundo.
Este é um fator que transcorre do uso de novas tecnologias e de seleção de animais mais adequados aos sistemas de produção no Brasil e que vai fixar o homem em suas terras, evitando o êxodo rural.
Em 1999 o Brasil importava 2,3 bilhões de litros de leite (12% da produção do país). No ano de 2005 ocorreu o inverso – passou a ser exportador, com aproximadamente 400 milhões de litros (equivalente a 1,6% da produção nacional). Já em 2007 foram destinados à exportação cerca de 940 milhões de litros (3,5% do total produzido).
Relatório da AgraFNP sobre a indústria de leite brasileira projeta que, em 2019 haverá um crescimento de produção de 3% ao ano e as exportações brasileiras do setor representarão 7% do total produzido pelo país.
A produção nacional em 2019, segundo essa fonte, será de 36,8 bilhões de litros de leite, sendo que o excedente exportável alcançará 2,64 bilhões de litros.
Na avaliação da AgraFNP, embora o Brasil ainda não seja considerado um importante ‘player’ no mercado internacional, as perspectivas de crescimento são grandes.

Egberto Barros
13 de marzo de 2012

Olá Osler
Boa Tarde
O cenário internacional do comercio de carne, demonstrado no seu brilhante artigo, é um "jogo" , de fato, para e de gigantes. Diante desta conclusão, estaria justificada a formação de grandes empresas trans nacionais como JBS e MARFRIG com o apoio financeiro do Governo através do BNDES? Embora, neste momento, estariam cartelizando o mercado interno e em detrimento do produtor nacional que está pagando a salgada conta desta engenharia de empresas para produzir e viabiliza aquelas empresas? Este apoio "governamental" poderia ser vista/entendida como "estratégia/política" de Estado em benefício do país?
Grande abraço
egberto barros

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