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Nutrigenômica DNA Gene Nutrição

Nutrigenômica: Você é o que você come?

Publicado: 23 de agosto de 2010
Por: Maria Constanza Rodriguez (Departamento de Pesquisa, Alltech do Brasil)
Intuitivamente, ser o que comemos sempre fez sentido, contudo a Nutrigenômica veio para fundamentar cientificamente esse ditado.
Revolucionando a nutrição
Nos últimos 10 a 15 anos, a pesquisa em nutrição tem sofrido grandes mudanças em seu foco baseadas na percepção de que muitos micronutrientes (vitaminas e minerais) e macronutrientes (gorduras, carboidratos e proteínas) possuem a habilidade de atuar como sinalizadores dietéticos potentes que interagem com o DNA para ativar ou desativar genes. A alteração da expressão gênica através da nutrição, portanto, oferece o potencial de mudar a função biológica de forma benéfica. Os padrões de expressão gênica em resposta a certos nutrientes podem ser vistos como "assinaturas dietéticas" (MÜLLER & KERSTEN, 2003). Simplificadamente, a Nutrigenômica é o estudo dessas assinaturas dietéticas com a finalidade de compreender como os nutrientes influenciam a saúde e o desempenho a nível molecular. As observações provenientes de experimentos de produção tradicionais são, em sua maioria, difíceis de interpretar; contudo, segundo o Dr. Ronan Power, Diretor de Pesquisa do Centro de Nutrigenômica Aplicada à Nutrição Animal da Alltech nos EUA, a Nutrigenômica permite que o examinador analise o padrão de expressão de, literalmente, milhares de genes em apenas um experimento.
Alguns termos importantes
Gene
Os genes servem como manuais de instrução para o organismo, eles são as coordenadas para a construção de todas as proteínas que participam das funções corporais. São compostos por ácido desoxirribonucléico (DNA).
DNA
Código (blueprint) para a produção de todos os componentes necessários para o desenvolvimento e manutenção das células. O DNA contém genes e cada gene representa uma unidade funcional para a produção de proteínas específicas.
Genoma
É toda a informação hereditária de um organismo que está codificada em seu DNA (ou, em alguns vírus, no RNA).
Genômica 
A genômica é o estudo dos genomas dos organismos. O conhecimento da seqüência total dos genomas de algumas espécies animais permitiu, através de diversas metodologias, averiguar a sua operacionalidade, inclusive de uma e de outra cadeia do DNA, e as suas nuances de transcrição consoante às células, tecidos, órgãos, fatores envolventes, etc.

Polimorfimos 
Envolve uma de duas ou mais variantes de uma seqüência particular de DNA. Quando essa variação na seqüência de DNA é comum na população, é chamada de polimorfismo; se for rara, é chamada de mutação. O ponto de corte utilizado é 1%, se a variação aparece em mais de 1% da população é um polimorfismo, caso contrário é chamada de mutação.
 
 
Alelo
Uma das diversas formas alternativas de um gene específico que ocupa uma certa região do cromossomo.

Biomarcadores ou marcadores biológicos
 
Moléculas que, algumas vezes, podem ser encontradas no sangue, outros fluidos corporais ou tecidos, podendo ser usadas para medir a presença, progresso de uma doença ou efeitos do tratamento.
Regulação gênica
Apesar de todas as células do nosso organismo apresentar um conjunto completo de genes idênticos, apenas uma fração desses genes está expressa ou "ligada" em cada tipo celular. É o subconjunto desses genes que estão expressos que fornece a cada célula a sua função específica e as suas características estruturais. Por esse motivo, por exemplo, as células hepáticas são totalmente diferentes, em sua estrutura e função, dos melanócitos na pele. Enquanto os hepatócitos apresentam funções como metabolização de substâncias e produção da bílis, os melanócitos secretam melanina, sendo responsáveis pela coloração da pele. Quando um gene está ativado, regulado positivamente, a maquinaria celular começa a transcrevê-lo em outro tipo de material genético chamado RNA mensageiro (mRNA). Alguns desses mRNA contêm o "código" ou a mensagem que será então traduzida em uma ou parte de uma proteína. Dessa forma, tipos celulares distintos são regulados e expressam diferentes proteínas que darão a identidade a cada célula, tecido e órgão do nosso corpo.
 
Agora sim, o que é Nutrigenômica?

Nutrigenômica ou genômica nutricional
A Nutrigenômica estuda a ampla influência da nutrição no genoma. Dentro da perspectiva da Nutrigenômica, os nutrientes são sinalizadores dietéticos que são detectados pelos sensores celulares que influenciam a expressão gênica e protéica e, subseqüentemente, a produção de metabólitos. Dessa forma, padrões de expressão gênica, expressão protéica e produção de metabólitos em resposta a determinados nutrientes ou regimes nutricionais podem ser vistos como "assinaturas dietéticas". A Nutrigenômica busca examinar essas assinaturas em células, tecidos e organismos e tenta compreender como a nutrição influencia a homeostase. Além disso, a Nutrigenômica busca identificar os genes que influenciam o risco de doenças relacionadas à dieta em uma escala ampla do genoma, além de compreender os mecanismos que estão por trás dessa predisposição genética (MÜLLER & KERSTEN, 2003).
 
Como os nutrientes afetam os genes?
Os componentes da dieta podem afetar a expressão gênica diretamente ou indiretamente, agindo como ligantes para receptores de fatores de transcrição ou afetando positiva ou negativamente as vias de sinalização (KAPUT & RODRIGUEZ, 2004). Esses fatores de transcrição se ligam ao DNA para direcionar o padrão do mRNA, orquestrando a produção de proteínas específicas. Há vários exemplos na literatura de nutrientes que interagem com fatores de transcrição como os retinóides, ácidos graxos, glicose e ferro provenientes de alimentos como a cenoura, o salmão, as farinhas, forragens, grãos, etc. Os retinóides e ácidos graxos induzem o gene da acyl-CoA oxidase in vivo, o ácido retinóico ativa um fator de transcrição ao se ligar a ele (KELLER et al, 1993) e o consumo de altas quantidades de carboidratos leva ao aumento da expressão do mRNA, primeiramente pelo aumento da transcrição de mais de doze enzimas envolvidas nas vias lipogênica e glicolítica, envolvidas na conversão de glicose em ácidos graxos (FOUFELLE & FERRÉ, 2002). Nutrientes como o ferro e a glicose controlam a estabilidade do mRNA e as taxas de tradução de certos transcritos através da interação das proteínas citosólicas com seqüências específicas de nucleotídeos (CLARKE & ABRAHAM, 1992). O ferro comanda a regulação da estabilidade e controla a tradução do mRNA da transferrina e da ferritina, responsáveis pela internalização celular e transporte de ferro (KLAUSNER & HARFORD, 1989). Por todos esses motivos os nutrientes são considerados como ingredientes bioativos, e esses exemplos são apenas alguns dos milhares que ocorrem entre os nutrientes e os genes diariamente.
 
Como estudar a interação dos nutrientes com os nossos genes?

Umas tecnologias utilizadas no estudo da Nutrigenômica são os microarranjos de DNA (Microarrays ou Gene Chips)

Microarranjos de DNA
Os microarranjos possibilitam o acesso dos efeitos específicos de uma dieta ou nutriente sobre a expressão de uma grande proporção do genoma inteiro. O Projeto Genoma Humano permitiu a identificação dos cerca de 25.000 genes presentes no DNA humano. A determinação da seqüência dos 3 bilhões de pares de bases do DNA está auxiliando na compreensão do funcionamento de células, tecidos e até mesmo de organismos inteiros. Esse conhecimento não se limita apenas a humanos, outras espécies como camundongos, primatas, aves, bovinos e suínos também já estão parcial ou inteiramente seqüenciadas. Também chamado de gene chip, a tecnologia dos microarranjos foi adaptada dos microchips usados pela indústria da computação. Pareando a informação reunida do genoma com os avanços recentes da nanotecnologia, os microarranjos são criados por equipamentos de robótica que arranjam quantidades minúsculas de milhares de seqüências gênicas em uma superfície, um chip, que não ultrapassam o tamanho de um fósforo. No chip, cada gene apresenta uma localização específica e é representado por múltiplas cópias dele mesmo. A tecnologia por trás do gene chip é bastante simples e explora um aspecto básico do DNA e RNA, a capacidade de uma molécula de RNA de se ligar ou hibridar a seqüência de DNA ou molde do qual foi transcrita, mas não a seqüências diferentes da sua própria. Para determinar quais genes estão ativados e quais estão desativados em uma determinada população de células, é necessário primeiramente coletar moléculas de RNA mensageiro (mRNA) presentes nas células. Essas moléculas de RNA são então transcritas no laboratório em uma molécula estável chamada de DNA complementar (cDNA). A molécula de cDNA também é capaz de hibridar com o molde de DNA do chip. Todas essas moléculas de cDNA são então marcadas com um corante fluorescente e, a seguir, entram em contato com a lâmina de microarranjo (gene chip). As respectivas moléculas marcadas irão encontrar e se ligar a suas fitas complementares (genes) no microarranjo, identificando-os com uma marca (tag) fluorescente. Finalmente, vários passos de enxágüe são utilizados para a remoção das moléculas de DNA que não hibridaram. Para decifrar os resultados, o pesquisador necessita utilizar um scanner capaz de medir a intensidade de cada ponto fluorescente do microarranjo. Se um gene em particular da população de células estiver altamente ativo, ele produz várias cópias de mRNA (na forma de cDNA marcados) que irão hibridar com suas cópias gênicas correspondentes no microarranjo. Isso gera uma área com muita fluorescência. Por outro lado, genes pouco ativos produzem poucos mRNA, que resultam em pontos de fluorescência mais fracos. Se um determinado gene não apresentar nenhuma fluorescência, isso significa que não foram sintetizados mRNAs nessa população de células de interesse, indicando que o gene apresenta-se inativo nessas células. Pode-se utilizar também um método de detecção com dois canais, onde são utilizados dois fluoróforos com comprimentos de onda distintos e a hibridação ocorre por competição. O grupo que apresentar maior abundância de mRNA terá o spot marcado com a sua cor. Um exemplo é o que ocorre com células cancerosas e células normais. Se marcarmos as células cancerosas em vermelho e as normais em verde, os pontos em vermelho representam genes mais expressos nas células cancerosas e os em verde genes mais expressos nas células normais. O potencial dessa tecnologia se torna evidente ao considerarmos as comparações que podem ser realizadas entre células de um animal jovem versus células de um animal velho, células cerebrais de um indivíduo normal versus células de um indivíduo com Alzheimer, e assim por diante. Essa tecnologia nos fornece informações vitais sobre a importância dos genes na manutenção de uma célula saudável e quais genes são mobilizados em resposta ao stress e a doenças.
 
Benefícios das pesquisas com Nutrigenômica
Ao ser capaz de compreender geneticamente como os compostos químicos de dietas comuns afetam o equilíbrio entre a saúde e a doença, pela sua alteração da expressão de genes ou estruturas de um indivíduo, será possível intervir na nutrição delineando dietas personalizadas que possam retardar doenças, otimizar e manter a saúde humana. Além dos benefícios para os seres humanos, essa ciência vanguardista também auxiliará a estabelecer estratégias nutricionais que possam trazer significativa melhora na saúde e produtividade animal.
É importante salientar que as pesquisas que envolvem substâncias bioativas em culturas de células humanas, como as associações realizadas a partir de estudos epidemiológicos, são consideradas apenas como preliminares até que estudos clínicos em humanos sejam realizados para verificar esses efeitos e mecanismos. Um grande passo será estabelecer biomarcadores necessários para quantificar a resposta biológica positiva à ingestão do nutriente.
 
Quando bem aplicada, a Nutrigenômica promove uma maior compreensão de como a nutrição influencia os genes.
 
Referências
MULLER, M.; KERSTEN, S. Nutrigenomics: Goals and strategies.
Nature Reviews
(2003) 4: 315-322.
KAPUT, J.; RODRIGUEZ, R.L. Nutritional genomics: the next frontier in the postgenomic era.
Physiol. Genomics
(2004) 16: 166-177.
KELLER, H.; DREYER, C.; MEDIN, J.; MAHFOUDI, A.; OZATO, K.; WAHLI, W. Fatty acids and retinoids control lipid metabolism through activation of peroxisome proliferation-activated receptor-retinoid X receptor heterodimers. Proc. Natl. Acad. Sci. (1993) 90: 2160-2164.
FOUFELLE, F.; FERRÉ, P. New perspectives in the regulation of hepatic glycolitic and lipogênica genes by insulin and glucose: a role for the transcription factor sterol regulatory element binding protein-1c.
Biochem. J.
(2002) 366: 377-391.
CLARKE, S. D.; ABRAHAM, S. Gene expression: nutrient control of pre- and posttranscriptional events.
FASEB J.
(1992)6:3146-3152.
KLAUSNER, R. C.; HARFORD, J. B. Cis-trans models for post-transcriptional gene regulation.
Science
(1989) 246: 870-872.
  
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