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Metabolização Drogas Aves

Metabolização de Drogas em Aves

Publicado: 24 de agosto de 2010
Por: Profa. Dra. Alexandra Acco (Universidade Federal do Paraná / Departamento de Farmacologia)
O sistema atual de produção avícola induz uma condição de alta densidade populacional nos galpões, facilitando a propagação de agentes infecciosos. Este fato, aliado à exigência de rápido crescimento das aves, tornou corriqueiro o uso de xenobióticos na ração ou na água, como agentes promotores de ganho de peso, antioxidantes, antibacterianos, antifúngicos, coccidiostáticos e parasiticidas. Diante de tantas drogas, das características de biotransformação de cada fármaco e de particularidades entre espécies (frangos, perus, codornas...), o conhecimento de processos farmacocinéticos e bioquímicos envolvidos é necessário, especialmente para minimizar efeitos adversos nos animais e nos consumidores de tais produtos de origem animal. Deste modo, para exemplificar esses processos, algumas drogas são comentadas neste texto.
Diante do uso de xenobióticos, é pertinente questionar: o que acontece com as drogas no organismo das aves? Quais são as conseqüências desses processos? Basicamente, as drogas percorrem um "caminho farmacocinético", representado por quatro etapas: 1) absorção, 2) distribuição, 3) biotransformação ou metabolização, e finalmente 4) excreção. A metabolização envolve a transformação química de xenobióticos lipossolúveis em metabólitos mais polares e hidrossolúveis, a fim de facilitar sua eliminação.
Em termos de absorção, a idéia geral de que os coccidiostáticos não sofrem absorção, e que, portanto, não sofrem metabolização, não é totalmente verdadeira. Uma fração, mesmo que pequena, é absorvida no trato gastrintestinal, alcançando uma biodisponibilidade de 10 a 33% para a monensina e 2,3 a 6,4% para o amprólio (Hamamoto et al., 2000). Esta fração absorvida estará sujeita à biotransformação, na qual vários processos bioquímicos estão envolvidos, em sua grande maioria dependente de sistemas enzimáticos hepáticos, plasmáticos, intestinais, pulmonares e renais. Diversas enzimas atuam nas duas fases da biotransformação, especialmente no fígado, intituladas:
a) Reações de Fase I: são dependentes basicamente das enzimas do citocromo P450 (CYP450), cujos produtos (metabólitos) podem ser farmacologicamente inativos, inalterados ou mais ativos do que o composto original. Atualmente são conhecidos mais de 100 genes que codificam diversas enzimas do CYP. Em frangos há 41 genes, sendo 21 com seqüências totalmente conhecidas, embora ainda não tenham sido descritas as famílias de enzimas 2B, 2D, 2E, 2F, 2S, 5A, 8A, 26B, 26C e 27B, bem caracterizadas em espécies de mamíferos. Frangos possuem, no entanto, enzimas CYP39, que está ausente em peixes, e o conteúdo total de citocromos em frangos é muito semelhante a humanos e algumas espécies de peixes (trutas). Os substratos para cada uma das enzimas, entretanto, são ainda pouco conhecidos em aves (Khalil et al., 2001).
Comparativamente com espécies de mamíferos, os frangos apresentam menor capacidade de metabolizar drogas pelo CYP1A; menor atividade também de CYP2C19, CYP2D6 e CYP3A4 do que humanos; e maior atividade de CYP2C9 do que humanos, o que significa maior taxa de metabolização de tolbutamina e warfarin. Assim o warfarin é muito menos tóxico em frangos do que em mamíferos (Martine et al., 1998; Khalil et al., 2001).
Interações nesta fase do metabolismo podem ocorrer quando drogas são usadas em combinação. Como exemplo, a monensina, um coccidiostático utilizado em produção de frangos e perus, pode ser usada em combinação com antibióticos (clorafenicol, eritromicina e enrofloxacina) ou sulfas (sulfadimetoxina, sulfadimidina e sulfaquinoxalina). Como conseqüência, pode haver:
- Modificação da atividade de monooxigenases do CYP450;
- Mudança do metabolismo de ambas as drogas que foram combinadas;
- Efeitos adversos.
Como exemplo, a associação de sulfadimidina e monensina altera a atividade enzimática da aminopiridina N-demetilase e anilina hidroxilase, aumentando suas atividades sete dias após suspensão do uso. Isto ocorre porque a sulfadimidina é um bom substrato para CYP450, e a seqüência de reações metabólicas é preferencialmente hidroxilação seguida por acetilação (Ershov et al., 2001). Este tipo de interação é uma das razões pela qual, no Brasil, o Departamento de Fiscalização de Insumos Pecuários da Secretaria de Defesa Agropecuária alerta sobre a monensina: "Este produto contém ionóforos a sua utilização simultânea com certas substâncias medicamentosas pode ser contra-indicada" (SDA/MAPA, 2008).                   
Diretamente ou após sofrer as reações de Fase I, a maioria dos compostos está sujeita ainda a passar pelas reações de Fase II.
•b)  Reações de Fase II: são dependentes de enzimas de conjugação, que conjugam as drogas a substratos endógenos, como ácido glicurônico, sulfatos e alguns aminoácidos. Como resultado, metabólitos inativos e altamente polares são produzidos, facilitando sua eliminação do organismo. Algumas enzimas microssomais, como a UDP-glicuronosil transferase (UDPGT), e outras citoplasmáticas, como as sulfotransferases (ST), atuam nestes processos.
Do mesmo modo que nas reações de Fase I, na Fase II do metabolismo também importantes diferenças são descritas entre aves e mamíferos, e mesmo entre espécies de aves. Como exemplo destas diferenças, as reações de conjugação com ácido glicurônico podem ser citadas, pois são mais freqüentes em pintinhos do que em adultos. Isto ocorre porque a enzima UDPGT, responsável pela conjugação de drogas com ácido glicurônico, tem maior atividade em pintinhos, enquanto as SF apresentam a mesma atividade em animais jovens e maturos (Bartlet et al., 1976).
Um problema comum que pode ocorrer na alimentação de aves diz respeito à oxidação nas rações, devido ao uso de gordura oxidada. Tal uso pode induzir à: (a) destruição de vitaminas lipossolúveis; (b) problemas de palatabilidade; (c) perda de energia e proteínas; e (d) geração de compostos tóxicos (da Silva Jr, ...). Neste contexto, o fígado é extremamente importante, pois tanto sofre ação de oxidações como as combate através de enzimas antioxidantes, como catalase, superóxido dismutase e glutationa-S-transferase (GST). A GST é uma enzima de Fase II do metabolismo, que atua de maneira bastante efetiva na conjugação de drogas e compostos tóxicos à glutationa (GSH), a fim de restabelecer a homeostase e reduzir o estresse oxidativo celular. Assim, compostos antioxidantes, que vêm sendo amplamente utilizados na alimentação de aves de produção, quando atuam sobre enzimas antioxidantes podem afetar positivamente o metabolismo, em especial na Fase II. Tal possibilidade torna patente a necessidade de pesquisas nesta área que avaliem a ação de extratos antioxidantes sobre o metabolismo e estresse oxidativo, uma vez que seu uso vem sendo amplamente difundido em avicultura e tais efeitos ainda não são bem conhecidos.
Em conclusão, devido à grande variabilidade metabólica entre espécies de aves, e considerando que cada fármaco é metabolizado de modo particular, apesar dos processos gerais conhecidos, ainda há muita deficiência de informações sobre a metabolização em aves. Além disso, quando ocorrem interações metabólicas entre drogas e toxinas (micotoxinas, por exemplo), conseqüências deletérias podem aparecer. Há, portanto, necessidade de investimentos em pesquisas farmacocinéticas nas diferentes aves de interesse comercial para esclarecimento das particularidades desses processos metabólicos.
Referências
BARTLET AL, KIRINYA LM. Activities of mixed function oxidases, UDP-glururonyl tranferase and sulphate conjugation enzymes in galliformes and anseriformes. Quarterly Journal of Experimental Physiology. 61, 105-119, 1976.
DA SILVA JR, A. Como garantir um bom aproveitamento da energia das rações com Antioxidantes e Lisofosfolipídios - Problemas provocados pela oxidação nas rações, ingredientes e premixes. Indaiatuba, São Paulo, Brasil. Disponível: http://www.pecnordeste.com.br/documentos/Arnaldo_da_Silva_Jr-Avicultura.pdf
ERSHOV E, BELLAICHE M, HANJI V, SOBACK S, GIPS M, WEISMAN Y, SHLOSBERG A. The effect of hepatic microsomal cytochrome P450 monooxygenases on monensin±sulfadimidine interactions in broilers. Journal of Veterinary Pharmacology and Therapeutics. 24, 73-76, 2001
Hamamoto K, Koike R, Machida Y. Bioavailability of amprolium in fasting and nonfasting chickens after intravenous and oral administration. Journal of Veterinary Pharmacology and Therapeutics. 23, 9-14, 2000.
HENRI J, MANCEAU J, SANDERS P, LAURENTIE M. Cytochrome P450-dependent metabolism of monensin in hepatic microsomes from chickens and turkeys. Journal of Veterinary Pharmacology and Therapeutics. 31, 584-586, 2008.
KHALIL WF, SAITOH T, SHIMODA M, KOKUE E. In vitro cytochrome P450-mediated hepatic activities for five substrates in specific pathogen free chickens. Journal of Veterinary Pharmacology and Therapeutics. 24, 343-348, 2001.
Martine K, Herve P, Louis P. Residues depletion in egg after warfarin ingestion by laying hens. Veterinary Human Toxicology, 40, 273-275, 1998.
SDA/MAPA - Departamento de Fiscalização de Insumos Pecuários Secretaria de Defesa Agropecuária. Antimicrobianos, anticoccidianos e agonistas autorizados. Atualizado em 10/07/2008.
 
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Autores:
Profa. Dra. Alexandra Acco
Universidade Federal do Paraná - UFPR
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