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Isolamento de Salmonella Heidelberg em diferentes pontos da tecnologia de abate de frangos de corte

Publicado: 27 de setembro de 2013
Por: Fernanda Lucia Colla, L.B. Rodrigues, Elci Lotar Dickel e L.R. dos Santos, Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, Hospital Veterinário, Universidade de Passo Fundo -UPF-, RS, e Anderlise Borsoi e V.P. do Nascimento, Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Federal do Rio Grande do Sul -UFRGS-, RS.
Sumário

Bactérias do gênero Salmonella fazem parte da flora normal das aves e sua ocorrência em produtos avícolas varia com o manejo na criação e tecnologia de abate, representando riscos para o consumidor final e dificuldades nas exportações. A S. Heidelberg parece ser mais invasiva e causar doenças com maior gravidade que outros sorovares paratíficos. Este trabalho teve por objetivos pesquisar Salmonella em diferentes pontos da tecnologia de abate de frangos e relatar o isolamento de S. Heidelberg em um abatedouro sob inspeção federal. S. Heidelberg foi isolada em frangos logo após a depenagem e na água do chiller indicando que, embora não tenha sido realizado o isolamento em outros pontos amostrados, a bactéria estava presente no ambiente e poderia contaminar carcaças prontas para consumo, com reflexos na saúde pública. O isolamento de S. Heidelberg reforça esta preocupação uma vez que este sorovar tem se destacado como causador de doenças transmitidas por alimentos.

PALAVRAS-CHAVE: Salmonella Heidelberg, abatedouros, frangos de corte.

A carne de aves e seus derivados configuram-se como os principais alimentos envolvidos em surtos de infecções alimentares por Salmonella em decorrência do preparo inadequado e da contaminação cruzada, passível de ocorrer nas cozinhas domiciliares e industriais. A contaminação das carcaças de frango pode acontecer pela presença do micro-organismo no ambiente de criação das aves e, consequentemente, pela disseminação às carcaças durante as operações de abate, mesmo quando os abatedouros são dotados de boas práticas de higienização e processamento. A presença da Salmonella na pele, penas, pés, cloaca e trato digestivo das aves é um fator agravante para a indústria avícola e de processamento de carne, pois o patógeno pode ser transferido para as carcaças de frango dentro do abatedouro, ainda no processamento, e transformar-se em risco para a saúde pública comprometendo a segurança alimentar da população (Rezende et al., 2005).
Mais de 2.500 sorovares de Salmonella já foram identificados, mas somente cerca de 10% foram isolados de aves, uma vez que a distribuição dos sorovares de Salmonella de fontes avícolas é geograficamente variável e alterna-se com o passar dos anos (Gast et al., 2007). O sorovar Heidelberg é citado como o terceiro isolado mais frequente na avicultura no Canadá e o quarto em doenças transmitidas por alimentos nos Estados Unidos (Chittick et al., 2006). Também no Canadá, a S. Heidelberg é destaque em saúde pública e alterna com S. Enteritidis a posição de segundo ou terceiro sorovar mais isolado em humanos (DemCzuk et al., 2003).
No Brasil, desde 1962, a Salmonella Heidelberg tem sido identificada em aves e produtos derivados (Hofer et al., 1997). Este sorovar foi isolado por Nascimento et al. (1997) em carcaças e partes de frango com a identificação de S. Enteritidis em 51% das amostras, S. Hadar em 26% e S. Heidelberg em 11%. Já Dickel (2004) avaliou o processo higiênicosanitário de abate de frangos em três matadouros no Sul do Brasil e relatou que carcaças, antes e depois do chiller, apresentaram, respectivamente, 31,7% e 20% de positividade, sendo identificados os sorovares Heidelberg (63,9%), Enteritidis (31,9%), Worthington (2,1%) e Tennessee (2,1%).
Dentre as salmonelas que causam infecções em humanos, a S. Heidelberg parece ser mais invasiva e causar doenças com maior gravidade que outros sorovares paratíficos (Public..., 2006). Este trabalho teve como objetivos investigar a presença de Salmonella em diferentes pontos da tecnologia de abate de frangos de corte e relatar a identificação de Salmonella Heidelberg, um sorovar de crescente importância em saúde pública, em um abatedouro sob inspeção federal.
O trabalho foi realizado em um frigorífico com abate diário de 350 mil aves, sendo amostrados oito pontos do fluxograma com coletas de swabs (cloacais e de gaiolas), água (escaldagem e chiller) e frangos antes e depois da escaldagem, da depenagem e do resfriamento. Inicialmente, buscou-se quantificar a contaminação por Salmonella em diferentes pontos da tecnologia de abate de aves, utilizando-se a metodologia adaptada para quantificação de Salmonella de Desmidit et al., (1998) e Dufrenne et al., (2001). Os pools de swabs cloacais e de gaiolas foram colocados em 50 mL de água peptonada 1% (AP 1%) e incubados a 37º C por 12 horas. Inocularam-se 100 mL das amostras de água em 50 mL de AP 1% com concentração tripla e incubou-se por 12 horas a 37º C. Adicionaram-se 150 mL de AP 1% em frangos e carcaças acondicionadas em sacos plásticos com capacidade para 4.000 mL, agitou-se manualmente por um minuto e incubou-se o caldo de rinsagem resultante por 12 horas a 37º C (Cox et al., 1981). O controle positivo foi S. Typhimurium ATCC 14028 com 4,0 x 102 células/mL e o controle negativo Escherichia coli ATCC 25922 com 9,6x102 células/mL. As amostras foram pré-incubadas a 37º C e após 12 horas inoculou-se 1 mL das amostras em 9 mL de caldo RV até a diluição 10-3. Incubaram-se os caldos RV por 24h à 41º C em banho-maria, com agitação e semearam-se 100 μL de cada diluição com alça de Drigalski em agar Rambach e agar XLD, em duplicata, sendo as placas incubadas a 37º C por 24 horas (US. Department..., 2007). Colônias compatíveis com Salmonella foram submetidas às provas bioquímicas de TSI, LIA e SIM, caldo ureia e sorologia com antissoro polivalente O para Salmonella (Difco®) (Brasil, 1998) e identificação final por BAX® PCR.
Não foi possível obter colônias isoladas para quantificação de Salmonella com a metodologia utilizada, realizando-se assim exclusivamente a identificação da bactéria, que foi isolada em frangos após a depenagem e na água do chiller. No isolamento de Salmonella referente às amostras estudadas, obteve-se positividade de 6,6% (2/30). Entretanto, ao avaliarmos os pontos amostrados, a positividade será de 25% (2/8), ao longo da tecnologia de abate de aves de aves. Na tecnologia de abate de aves, as amostras positivas de uma carcaça podem não representar contaminação de todo o lote, e temperaturas da água de escaldagem e do pré-chiller podem ser limitantes para o crescimento de Salmonella, mas não impedem a recontaminação das carcaças.
Dados do Programa de Redução de Patógenos (Brasil, 1998) indicam positividade para Salmonella em 6,32% das 123.446 amostras de carcaças de aves analisadas após o sistema de pré-resfriamento (dados oficiais não publicados). Já Von Ruckert et al. (2009) relataram maior frequência de Salmonella após o chuveiro de lavagem das carcaças, localizado entre a evisceração e o pré-resfriamento e menor contaminação na saída do pré-resfriamento, demonstrando a importância do monitoramento de diferentes pontos críticos de controle eventualmente identificados no abate de frangos. Olsen et al. (2003) citaram os equipamentos da linha de abate como potenciais fontes de contaminação cruzada entre lotes positivos e negativos, e Canson et al. (1997) relataram uma incidência de 20% de Salmonella em 18 carcaças coletadas após a depenagem, antes do pré-resfriamento e após o pré-resfriamento, indicando tanto a possibilidade de contaminação cruzada entre as etapas como a de lotes previamente contaminados.
A pesquisa de Salmonella desde os lotes nas granjas até o abatedouro, incluindo a água do processamento e produtos finais, é fundamental para se estimar a extensão da contaminação existente nos cortes e carcaças de frangos e avaliar a efetividade dos métodos de controle empregados para reduzir esta contaminação. Uma alternativa para controle do patógeno, além das imprescindíveis boas práticas de higiene, é apresentada por Northcutt et al. (2003) que citaram o pré-resfriamento em tanque de imersão, com água adicionada de 20 ppm de hipoclorito de sódio, como potencial redutor das contagens de Salmonella em 0,5 log10, tanto antes como após o chiller. Entretanto, como a legislação brasileira não permite a utilização de mais do que 5 ppm de cloro na água do pré-resfriamento, o controle de Salmonella neste sistema deve ser realizado apenas pelo efeito da temperatura da água, aliada ao movimento de renovação por contrafluxo, conforme preconizado pela Portaria SDA nº 210 (Brasil, 1998).
A Salmonella Heidelberg tem se destacado como um dos principais sorovares de Salmonella que causam infecções em humanos nos Estado Unidos, ocupando o 3º lugar com 3,9% dos isolamentos (S. Enteritidis 16,9% e S. Typhimurium 16%) (CDC..., 2007). Já em 2009, embora S. Heidelberg tenha decrescido para o 4º lugar dentre os isolamentos, esta porcentagem aumentou para 8,9 %, também na América do Norte (Vieira et al., 2009). Dados sobre o isolamento de S. Heidelberg no Brasil são escassos, mas os trabalhos até então apresentados têm mostrado a tendência de maior isolamento deste sorovar (Nascimento et al., 1997; Dickel, 2004; Rezende et al., 2005).
A crescente importância de Salmonella Heidelberg tem levado também a estudos em razão da frequente resistência à droga ceftiofur e redução da suscetibilidade aos antimicrobianos relacionados à ceftriaxona (cefalosporina de terceira geração). Tais fatos podem limitar as opções de tratamento de gestantes e crianças que desenvolvem salmonelose extraintestinal por Salmonella Heidelberg (Public..., 2006) e representar uma preocupação extra com relação à saúde pública.
Salmonella foi isolada em frangos após a depenagem e na água do chiller indicando que, embora não tenha sido realizado isolamento em outros pontos amostrados, a bactéria estava presente no ambiente e poderia contaminar carcaças prontas para consumo, com reflexos na saúde pública. O isolamento de S. Heidelberg reforça esta preocupação uma vez que este sorovar tem se destacado como causador de doenças transmitidas por alimentos.
 
REFERÊNCIAS
BRASIL, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa n.70, de 06 de outubro de 2003. Aprova o Programa de redução de patógenos - monitoramento microbiológico controle de Salmonella sp .em carcaças de frangos e perus. Diário Oficial da União de 26/11/1998. seção 1. p. 226. Brasília. 1998.
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CHITTICK, P.; SULKA, A.; TAUXE, R.V.; FRY, A.M. Summary of National Reports of foodborn outbreaks of Salmonella Heidelberg infections in the United States: clues for disease prevention. Journal of Food Protection, v.69, n.5, p.1150-1153. 2006.
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Autores:
Anderlise Borsoi
Universidade Tuiuti do Paraná (UTP)
Fernanda Colla
Elci Lothar Dickel
Universidade de Passo Fundo -UPF
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Fabio Tavares Zancan
26 de marzo de 2015
Excelente artigo sobre Salmonella, pois estas continua a ser problema na Avicultura Brasileira
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