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Avanços na fibra alimentar para animais monogástricos: em que ponto estamos?

Publicado: 25 de abril de 2022
Por: Jae Cheol Kim e Alejandro Criado
INTRODUÇÃO
Embora a fibra alimentar seja, certamente, um dos componentes das matérias primas menos conhecidos pelos nutricionistas de animais monogástricos, seu papel e função associados à digestibilidade nutricional e à saúde intestinal em relação à microbiota residual estão sob crescente investigação. No entanto, a definição e determinação da fibra alimentar ainda está gerando confusão entre a maioria dos nutricionistas, onde eles estão buscando avaliar a função da fibra no lúmen intestinal e sua interação com a microbiota comensal e patogênica. Do ponto de vista dos nutricionistas de monogástricos, neste artigo será examinado o entendimento atual da estrutura da fibra e os avanços na determinação da mesma através da aplicação da tecnologia de espectroscopia de infravermelho próximo (NIR), discutindo a melhor forma de usar a informação gerada pela análise de fibras em uma formulação prática.
CLASSIFICAÇÃO DA FIBRA ALIMENTAR E AS PRINCIPAIS FRAÇÕES DE FIBRAS FUNCIONAIS EM MATÉRIAS PRIMAS USUAIS
Utilizadas há muito tempo, fibra bruta e fibras em detergente, são predominantemente determinadas pelo método gravimétrico após uma série de hidrólises em meio ácido/detergente. Essas classificações tradicionais de fibra contemplam apenas parcialmente as diferentes frações da fibra alimentar (Tabela 1). Por exemplo, a fibra bruta engloba 21 a 56% da fração total da fibra alimentar e depende do conteúdo de celulose e lignina das diferentes matérias primas, uma vez que o método de fibra bruta capta apenas parte da celulose e da lignina. Da mesma forma, a fibra em detergente neutro (FDN), que é a classificação de fibra mais usada na formulação de rações comerciais, engloba 63 a 100% da fibra total da dieta e depende do teor de hemicelulose e de pectina das diferentes matérias primas, já que o método de FDN não capta a pectina e detecta apenas parte da hemicelulose (Choct, 2015). Sendo assim, seguindo a classificação tradicional de fibra, os nutricionistas têm ignorado uma parte grande e importante das frações de fibra que é a hemicelulose/pectina ou a maior parte dos polissacarídeos não celulósicos. Assim, fica claro e quase unânime entre os nutricionistas que devemos passar da análise e aplicação de fibra bruta tradicional ou de FDN para a de polissacarídeos não amiláceos (PNA). Depois que o PNA for usado para avaliação da matéria prima e formulação da dieta, poderemos então avançar nosso conhecimento em termos de exigência quantitativa das diferentes frações de fibra para atender as diversas necessidades. Por exemplo, seremos capazes de entender qual proporção de PNA solúvel de um ingrediente específico (por exemplo, trigo ou polpa cítrica) pode causar aumento da viscosidade intestinal ou qual proporção de PNA insolúvel de um ingrediente específico (por exemplo, farelo de trigo ou farelo de arroz) pode reduzir a proliferação de patógenos sem comprometer a digestibilidade nutricional.
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ANÁLISE DE FIBRAS ATRAVÉS DO NIR
A estimativa mais precisa da fibra é obtida pela análise da fibra alimentar total, que é a soma dos polissacarídeos não amiláceos e da lignina, analisando os monômeros individualmente. No entanto, a prática de hidrolisar a fibra em seus monômeros constituintes por meio de uma série de hidrólises enzimáticas/químicas e subsequente quantificação dos monômeros por cromatografia gasosa ou cromatografia líquida de alto desempenho é cara, trabalhosa e demorada. Com o custo e a velocidade atual da análise de PNA por via úmida, é improvável que o PNA seja adotado comercialmente como uma análise de rotina para avaliação de ingredientes ou formulação de dietas. Devido à lógica acima mencionada, a AB Vista investiu significativamente em empenho e financiamento de pesquisas para desenvolver uma plataforma de predição de PNA usando a tecnologia NIR. O projeto envolveu um acervo de 1.700 amostras coletadas ao longo de 5 anos, incluindo tanto os principais cereais e quanto os ingredientes proteicos e fibrosos de 24 países, cobrindo a maioria dos países produtores da maior quantidade de ingredientes para ração. Foram incluídas nas amostras cereais (trigo, milho, cevada, sorgo, arroz, aveia, milheto, triticale, etc), fontes de proteína (farelo de soja, soja integral, farelo de colza, farelo de amendoim e farelo de glúten de milho) e de fibras (DDGs, farelo de trigo, farelo de arroz, casquinha de soja, farinha de mandioca, farelo de girassol, etc). As amostras moídas (1 mm) foram analisadas para PNA usando o método de Englyst et al. (1994) e também através de um NIR de bancada (Foss DS2500 cobrindo uma faixa de ondas de 400 a 2.500 nm, com uma resolução de 0,5 nm) para coletar a informação espectral. Vários modelos de predição foram desenvolvidos usando diferentes pré-tratamentos: espectros de absorbância bruto, de derivada primeira e derivada segunda; com e sem pré-processamento da Variável Normal Padronizada (Standard Normal Variate - SNV). Quando 2 tratamentos matemáticos foram utilizados, a SNV foi aplicada após a derivada. Devido ao número limitado de amostras, foi decidido avaliar o desempenho de cada modelo de predição através da validação cruzada. O número ideal de fatores foi escolhido com base na raiz quadrada do erro quadrático médio da validação cruzada (RMSECV). O melhor modelo de predição foi selecionado considerando as estatísticas de cada equação com base no coeficiente de determinação (R2), erro padrão da validação cruzada (SECV) e RPDSEC (razão entre o desvio padrão e o erro padrão de calibração).
As estatísticas das calibrações desenvolvidas são apresentadas na Tabela 2. O que muitas vezes preocupa a indústria e os nutricionistas é a precisão da predição quando um ingrediente para ração for analisado através da calibração NIR. Erros de predição, como erro padrão da validação cruzada (SECV), podem ser usados para estimar o intervalo de variação para a predição. Por exemplo, o conteúdo total de PNA dos cereais pode ser predito dentro de um intervalo de erro de ± 2,24% com 95% de confiança (SECV x 2; 1,12 x 2 = 2,24). A precisão de uma calibração NIR pode ser aumentada quando a calibração cobre uma ampla variação. O teor de PNA nos grãos de cereais é menor e menos variável em comparação com aquele dos farelos proteicos e dos ingredientes fibrosos, e, portanto, o coeficiente de determinação (R2) das calibrações dos cereais é menor que das outras calibrações, embora ainda mostrem uma precisão razoável de viabilidade. O RPD é um índice para a robustez de uma calibração. Uma calibração com RPD entre 2 e 3 é considerada uma calibração aceitável para triagem e controle de qualidade, enquanto uma calibração com RPD> 3 é considerada uma calibração robusta para potencialmente substituir a análise bromatológica via úmida (Williams 2014). As estatísticas apresentadas mostram claramente que as calibrações PNA desenvolvidas para cereais, farelos proteicos e ingredientes fibrosos são robustas e oferecem potencial para avaliação rotineira de matérias-primas. A equipe NIR AB Vista atualizará essas calibrações regularmente como parte da manutenção anual de calibrações, o que melhorará ainda mais a previsibilidade futura. 
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IMPACTO DA FIBRA SOBRE A NUTRIÇÃO E A SAÚDE INTESTINAL DE ANIMAIS MONOGÁSTRICOS
Há várias publicações investigando o impacto da fibra sobre a nutrição e a saúde intestinal de animais monogástricos. No entanto, uma vez que a maioria delas usa análises tradicionais de fibra como um tratamento, é difícil interpretar os resultados claramente. No entanto, se resumirmos o conhecimento atual deste tópico, ele poderá ser sintetizado em poucos pontos:
•O aumento do teor de PNA solúvel em uma dieta aumenta a viscosidade da digesta e o tempo de retenção da digesta no trato gastrointestinal (TGI), o que geralmente resulta em menor digestibilidade nutricional e maior incidência de diarreia por disbiose bacteriana (Kim et al., 2012; Pascoal et).
•No entanto, o nível de PNA solúvel que não aumentaria a viscosidade intestinal será utilizado pela microbiota no intestino grosso, e contribuirá para o pool de energia corporal total.
•O aumento do teor de PNA insolúvel em uma dieta geralmente aumenta a taxa de passagem da digesta pelo TGI e, portanto, reduz a digestibilidade nutricional e aumenta a perda endógena de aminoácidos.
•Entretanto, sabe-se que a inclusão de pequenas quantidades (2-4%) de PNA insolúvel (por exemplo farelo de aveia ou farelo de trigo) previne a retenção prolongada de digesta no TGI, reduzindo assim o risco de crescimento bacteriano excessivo (disbacteriose) no intestino delgado (Molist et al. 2010). Além disso, foi relatado que uma pequena quantidade de fibra insolúvel aumenta o consumo de ração pelos animais uma vez que a taxa de passagem da digesta aumenta.
•Um teor de PNA insolúvel que está acelerando a passagem da digesta reduzirá a digestibilidade nutricional no intestino delgado, enquanto um teor de PNA insolúvel que não está comprometendo a digestibilidade nutricional, mas aumentando o consumo de ração, melhorará o desempenho dos animais.
•Não entendemos muito de toda a comunidade microbiana do TGI e como ela está respondendo a diferentes dietas. No entanto, foi demonstrado que o aumento do fluxo de fibras fermentáveis no intestino grosso aumenta a produção de ácidos graxos voláteis (AGV), que é uma fonte significativa de energia para animais monogástricos e também diminui a produção de ácidos graxos de cadeia ramificada, que é um indicador de fermentação proteica (Kim et al, 2012).
•Entre as frações variáveis de fibras, parece que o influxo de xilo-oligossacarídeos no ceco/intestino grosso aumenta mais efetivamente a produção de AGV, enquanto o influxo de oligossacarídeos gerados a partir de polissacarídeos pécticos não aumenta efetivamente a produção de AGV. Uma investigação mais aprofundada dessa interação entre os diferentes tipos de oligossacarídeos e a fermentação microbiana só é possível medindo a composição de açúcar da fibra alimentar através da análise de PNA

•Não apenas o ácido butírico, mas também os ácidos propiônicos ou os AGV total, em geral, regulam a produção de IgA secretora na lâmina própria e também a produção de IgG nos tecidos sistêmicos, como o baço (Kim et al, 2018). Portanto, o aumento da produção de AGV através da alteração de microbiota comensal para microbiota mais fermentadora de fibra fortalecerá a barreira mucosa e também a imunidade sistêmica de animais monogástricos.
No entanto, a resposta do animal aos diversos tipos e quantidades de fibra será variável e depende do status fisiológico do animal, da comunidade microbiana residual em um rebanho, das condições ambientais e do status sanitário/imunidade dos animais. Por exemplo, a quantidade de fibra solúvel que desencadeia a viscosidade intestinal será diferente dependendo da idade do animal, uma vez que a microbiota residual no TGI é muito mais desenvolvida e madura em animais mais velhos (Fischer, 2003). Nesse sentido, a mesma quantidade de PNA solúvel que causa indigestão associada à viscosidade em animais jovens pode contribuir para um maior aproveitamento de energia em animais mais velhos, especificamente quando a microbiota madura fermenta a fibra solúvel no intestino grosso sem causar problemas de viscosidade no intestino delgado. Da mesma forma, a alteração na microbiota em um rebanho devido ao estresse ambiental ou ao surto de doença clínica ou subclínica alterará a resposta animal às diferentes frações de PNA da dieta.
FUTURO DESENVOLVIMENTO
Infelizmente, nosso conhecimento das complexas interações entre PNA da dieta, microbiota residual e fatores externos, como doenças e estresse ambiental, com ramificações significativas nas propriedades físico-químicas da digesta, é crucialmente limitado. Portanto, precisamos pesquisar muito mais para aplicar nosso conhecimento à nível comercial. No entanto, nas últimas duas décadas, temos visto nutricionistas avançarem seu conhecimento partindo do uso de proteína bruta para o de aminoácidos totais, de digestibilidade ileal aparente de aminoácidos e, atualmente, de digestiblidade ileal padrozinada de aminoácidos. Deste ponto de vista, não há dúvida que a calibração NIR para PNA pode ser um excelente trampolim para avançar nosso conhecimento e buscando alcançar um conceito nutricional de precisão em fibras alimentares para animais monogástricos. Por exemplo, realizar rotineiramente uma análise através de PNA principais ingredientes com o uso do NIR e monitorar as alterações nas variáveis-alvo, como desempenho ou prevalência de doenças entéricas, pode melhorar nosso entendimento sobre a influência do tipo/proporção variável de PNA na fisiologia digestiva de animais monogástricos, o que não teria sido possível sem a calibração NIR para PNA devido ao alto custo e tempo necessário para a análise bromatológica de PNA por via úmida.

Kim, J.C., Hansen, C.F., Mullan, B.P., Pluske, J.R. (2012). Nutrition and pathology of weaner pigs: Nutritional strategies to support barrier function in the gastrointestinal tract. Animal Feed Science and Technology 173, 3-16.

Kim, M., Qie, Y., Park, J., Kim, C. H. (2018). Gut microbial metabolites fuel host antibody response. Cell Host & Microbe 20, 202-214

Molist, F., de Segura, G., Perez, J. F., Bhandari, S. K., Krause, D. O., Nyachoti, C. M. (2010). Effect of wheat bran on the health and performance of weaned pigs challenged with Escherichia coli K88+. Livestock Science 133, 214-217.

Pascoal, L., Thomaz, M., Watanabe, P., Ruiz, U., Ezequiel, J., & Amorim, A. 2012. Fiber sources in diets for newly weaned piglets. Revista Brasileira de Zootecnia 41, 636-642.

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Autores:
Alejandro Criado
AB Vista
Jae Cheol Kim
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Massaruti Gilberto Julio Julio
29 de abril de 2022
Boa noite não tenho nada de inconveniência, so dizer esta de parabéns pelo os avanços na fibra alimentar para aves.
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