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aditivos alternativos alimentação de aves

Perspectivas para a utilização de produtos de origem vegetal como aditivos alternativos na alimentação de aves

Publicado: 9 de dezembro de 2005
Por: Gerson Neudi Scheuermann y Anildo Cunha Junior. Embrapa Suínos e Aves, Concórdia-SC

1. Introdução

As plantas medicinais são os principais componentes da medicina tradicional. A utilização de plantas para o tratamento de doenças que acometem os seres humanos é uma prática milenar e que ainda hoje aparece como o principal recurso terapêutico de muitas comunidades e grupos étnicos. No início da década de 90, a Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgou que 60-85% da população dos países em desenvolvimento dependiam das plantas medicinais como única forma de acesso aos cuidados da saúde (Veiga Jr., et al., 2005).

Ao longo dos anos, as observações populares conduziram ao acúmulo de informações relevantes sobre a eficácia e os efeitos medicinais das plantas. Todo este conhecimento continua sendo válido para estimular o uso dos vegetais como medicamentos e assim promover a perpetuação desta cultura, além de despertar grande interesse por pesquisas que conduzam à identificação de substâncias naturais bioativas. Tanto é verdade, que este é um tema de marcante expressão no cenário científico.

Após séculos de uso empírico, os primeiros estudos científicos de plantas medicinais datam do século XIX. Nesta época foram isolados alguns compostos de plantas que se afirmaram como princípios ativos eficazes e de grande importância para a Medicina, a exemplo da cânfora, da quinina, da morfina, da estriquinina e da cocaína (Hamburger & Hostettmann, 1991). Até a primeira metade do século XX, merecida atenção era dada aos estudos de substâncias ativas de plantas. Contudo, depois de 1945, houve uma marcante diminuição no uso de plantas medicinais e, obviamente, uma redução significativa dos investimentos para estudos desta natureza devido ao desenvolvimento da química farmacêutica sintética e o aparecimento dos antibióticos produzidos por fermentação microbiana. No período pós-guerra, os metabólitos de plantas foram investigados sob a ótica da Fitoquímica clássica e da Quimiotaxonomia. Além disso, com a disponibilidade do carbono radioativo (14C), os estudos sobre a biossíntese de produtos naturais em geral foram marcantes, observando-se um enorme avanço neste campo, já que até então, as vias biogênicas eram de mera natureza especulativa.

Nas últimas duas décadas, a sociedade ocidental passou a reconsiderar as virtudes terapêuticas de plantas e os produtos naturais derivados desses organismos passaram novamente a ocupar papel de destaque na área de farmacologia. Nesse contexto, as pesquisas sobre a atividade de plantas e a bioprospecção de seus respectivos princípios ativos foram intensificadas.

Para se ter idéia da importância da Fitoterapia como forma de terapia medicinal, o comércio mundial de fitoterápicos movimenta mais de 20 bilhões de dólares por ano e apresenta perspectivas de crescimento. Nos EUA, pesquisas realizadas em 1997 revelaram que 42% da população fez uso de plantas medicinais pelo menos uma vez no ano de 1996, o que correspondeu a um aumento de aproximadamente 33% em relação ao índice obtido em 1990. As preparações fitofarmacêuticas são muito populares em países com forte tradição no uso de ervas, como a Alemanha, a França e a Suíça (Hamburger & Hostettmann, 1991). Na Europa, o comércio de extratos vegetais em 1997 alcançou cerca de US$ 7 bilhões. Na Alemanha, onde se consome metade dos extratos vegetais comercializados em todo o continente, as plantas medicinais são utilizadas pela população para o tratamento de resfriados (66%), gripe (38%), doenças do trato digestivo ou intestinal (25%), dores de cabeça (25%), insônia (25%), úlcera estomacal (36%), nervosismo (21%), bronquite (15%), entre outros (Veiga Jr., et al., 2005). Em 2000, o setor de fitoterápicos faturou US$ 6,6 bilhões nos EUA e US$ 8,5 bilhões na Europa.

As pesquisas com plantas medicinais possuem, geralmente, propósitos voltados ao desenvolvimento de fármacos para emprego na Medicina humana. Isto pode ser observado quando, em nível mundial, no período compreendido entre 1983 e 1994, foram aprovados 529 novos fármacos, dentre os quais 39% são produtos naturais ou derivados semi-sintéticos (Pinto et al., 2002).
As propriedades terapêuticas dos vegetais ainda são pouco exploradas por estudos com fins veterinários. Um número relativamente reduzido de trabalhos são norteados pela idéia de se usar plantas ou mesmo seus metabólitos secundários para fins terapêuticos, profiláticos ou como melhoradores do desempenho de animais. No entanto, as recentes restrições ao uso de antibióticos promotores de crescimento (APC) na produção animal, tem incentivado a busca por aditivos alternativos. Neste sentido, cresce em importância a possibilidade de exploração do potencial antimicrobiano, bem como de outras propriedades das plantas e de seus respectivos constituintes.

No presente texto são apresentados os principais fundamentos da pesquisa envolvendo princípios ativos de plantas e a possibilidade de aplicação na produção de frangos de corte.

2. Metabólitos secundários de plantas

A natureza tem fornecido um número expressivo de substâncias orgânicas, sendo os organismos do Reino Vegetal um dos principais contribuintes. O fascinante potencial de fornecimento de novas substâncias deve-se à incrível capacidade desses organismos em biossintetizar os mais variados tipos de estruturas moleculares. A diversidade e a complexidade das moléculas é algo realmente fantástico e portanto seria um desperdício não se beneficiar da enorme capacidade de síntese das plantas.
Embora os vegetais contenham milhares de constituintes químicos, as propriedades terapêuticas estão especialmente relacionadas com os chamados metabólitos secundários. Os metabólitos secundários são compostos micromoleculares evolutivamente selecionados para conferir vantagens adaptativas às plantas. Essas substâncias participam diretamente das interações bioquímicas de convivência e comunicação entre as plantas e os vários organismos vivos no sistema ambiental.
Ao longo do processo evolutivo as plantas desenvolveram mecanismos de defesa para sua sobrevivência. Dentre as formas de proteção adquiridas, foram desenvolvidas rotas biossintéticas — hoje conhecidas como metabolismo secundário — para produção de substâncias nocivas e tóxicas aos inúmeros parasitas e predadores (Salisbury & Ross, 1992).

Em princípio, chegou-se a acreditar que esses compostos oriundos de rotas alternativas eram apenas simples resíduos do metabolismo. Entretanto, sabe-se atualmente que as principais funções dos produtos do metabolismo secundário são: atuar como agentes de defesa para combate de organismos patogênicos, insetos fitófagos e herbívoros predadores; e atuar como agentes de competição para modificação do comportamento germinativo e do crescimento de espécies vegetais estranhas. A capacidade estimulatória de tais compostos também é destacada, já que podem servir como atraentes de animais polinizadores e dispersores de sementes, promovendo assim a perpetuação de uma dada espécie. Alcalóides, terpenos, esteróides, flavonóides, cumarinas, xantonas, lignanas, fenilpropanóides, acetofenonas, cromanos, quinonas, derivados do ácido benzóico e da acetofenona são classes representativas de metabólitos secundários de plantas.

Os óleos essenciais, por exemplo, são misturas constituídas por um número variado de substâncias orgânicas com estruturas relativamente simples, onde os principais componentes provêm de rotas secundárias, no caso monoterpenos, sesquiterpenos e fenilpropanóides. Essas composições naturais se tornaram um conveniente atrativo devido às suas propriedades biológicas e organolépticas. Particularmente na produção animal, observa-se nos estudos uma forte tendência pelo uso de plantas aromáticas, considerando-se a composição e o potencial antimicrobiano de seus respectivos óleos essenciais. Entretanto, seria interessante considerar nos estudos futuros não apenas a fração de metabólitos secundários constituintes dos óleos de essências, mas também outras classes de compostos com ação antimicrobiana comprovada, como por exemplo, flavonóides, cumarinas e xantonas (Cowan, 1999).

3. Fundamentos da pesquisa de plantas medicinais

O percurso compreendido entre a planta e o medicamento é longo e caracterizado pela multidisciplinaridade. O sucesso das pesquisas, que têm como foco principal a geração de conhecimento para o desenvolvimento de novos fitoterápicos e fitofármacos, muito depende da colaboração de profissionais de diferentes áreas do conhecimento. A estratégia para obtenção de princípios ativos a partir de organismos vegetais é ilustrada na figura 2 (Hamburger & Hostettmann, 1991).

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3.1. Planta medicinal, fitoterápico e fitofármaco
Segundo a OMS, planta medicinal é “todo e qualquer vegetal que possui, em um ou mais órgãos, substâncias que podem ser utilizadas com fins terapêuticos ou que sejam precursoras de fármacos semi-sintéticos”.
Fitoterápico, de acordo a Secretaria de Vigilância Sanitária (portaria n° 6 de 31 de janeiro de 1995), é “todo medicamento tecnicamente obtido e elaborado empregando-se exclusivamente matérias primas vegetais com finalidade profilática, cura tiva ou para fins de diagnóstico, com benefícios para o usuário. É caracterizado pelo conhecimento da eficácia e dos riscos do seu uso, assim como pela reprodutibilidade e constância de sua qualidade. Não podem estar incluídas substâncias ativas de outras origens, não sendo considerado produto fitoterápico quaisquer substâncias ativas, ainda que de origem vegetal, isoladas ou mesmo suas misturas”. Em resumo, fitoterápico é uma composição medicamentosa com formulação específica elaborada a partir de plantas.
Fitofármaco é a substância ativa isolada e identificada, obtida a partir de plantas, ou mesmo, misturas de substâncias ativas de origem vegetal.

3.2. Seleção da planta, coleta e identificação botânica
A escolha da planta que será objeto das investigações é o primeiro passo da pesquisa. Para a descoberta de compostos ativos, este é um dos pontos cruciais para o sucesso do estudo. Basicamente, três tipos de abordagens são utilizadas para selecionar uma espécie vegetal: randômica, quimiotaxonômica e etnofarmacológica. A abordagem randômica, que seria a escolha sem qualquer critério, tem simplesmente como fator determinante a disponibilidade da planta. Neste caso de seleção,
10.000 diferentes tipos de plantas correspondem de 50.000 a 100.000 possibilidades estruturais de produtos naturais (Malone, 1983; Cordell, 1995). As famílias e gêneros vegetais apresentam um perfil característico de metabólitos secundários. Este fato é considerado na abordagem quimiotaxonômica ou filogenética, onde a seleção da espécie acontece em relação à ocorrência de uma certa classe de substância em um dado gênero ou família, segundo dados existentes na literatura. Na abordagem etnofarmacológica, a seleção da planta é realizada com base no uso terapêutico evidenciado por um determinado grupo étnico.

Durante a seleção da espécie vegetal para trabalhos de bioprospecção é preciso considerar tanto as informações etnofarmacológicas quanto os aspectos quimiotaxonômicos. A probabilidade de se descobrir substâncias inéditas, sejam elas ativas ou não, é maior na abordagem randômica. Apesar disto, a abordagem etnofarmacológica, que considera o histórico da planta como um recurso para tratamento de doenças, favorece a descoberta de compostos bioativos, além de significar uma economia de tempo e recursos financeiros. A relação entre atividade biológica e o uso na medicina tradicional pode ser demonstrada. Cerca de 75% dos compostos puros naturais empregados na indústria farmacêutica foram isolados seguindo recomendações da medicina popular (Cechinel Filho & Yunes, 1998). Durante a seleção, um outro ponto precisa ser considerado:
em grande parte dos casos, as distintas partes da planta (folha, caule, flor e raiz) apresentam constituição química diferentes e por isso é preciso definir qual parte do vegetal será investigada. O mais viável é iniciar com aquelas utilizadas na medicina popular e posterirormente passar às partes seguintes.
Com a planta selecionada, é preciso determinar o local e a época de coleta, visto que os fatores ambientais e a sazonalidade influenciam na biossíntese dos metabólitos secundários. A coleta é feita em duas etapas. Na primeira, são coletadas amostras representativas de ramos contendo folhas, flores e frutos para confecção de excicatas. Posteriormente, as excicatas são encaminhadas para um herbário, onde a planta deve ser identificada, catalogada e permanecer depositada com um número de registro. A identificação botânica segura é imprescindível para o trabalho. A falta de identificação científica ou equívocos nesta etapa podem anular o estudo, desqualificando-o cientificamente. Feito isto, a segunda etapa da coleta visa unicamente a obtenção de material suficiente para preparação do extrato vegetal bruto (no mínimo 2 Kg).

3.3. Da planta aos constituintes ativos — estudos biomonitorados
Para subsidiar os trabalhos experimentais, é importante considerar o conjunto das informações etnofarmacológicas e de dados quimiotaxonômicos (substâncias predominantes) e ensaios biológicos disponíveis na literatura relacionados à planta alvo.
O isolamento dos constituintes ativos de plantas acontece através de um estudo sistemático com biomonitoramento. A preparação de extratos é o ponto de partida das atividades em laboratório. No método mais conveniente e comumente empregado em estudos químico-farmacológicos, faz-se a preparação de um extrato bruto hidroalccólico. O material vegetal, devidamente seco e triturado, é extraído por maceração exaustiva com uma mistura de etanol/água ou metanol/água com proporções em volume definidas. A solução resultante é filtrada e o solvente destilado para se obter o extrato bruto (EB). Uma amostra do EB é então submetida a ensaios biológicos para avaliação preliminar da atividade pretendida. Posteriormente, acontece o fracionamento do extrato para separação das substâncias de acordo com suas polaridades. O EB é suspenso em água e particionado sucessivamente com solventes de polaridades crescentes, como hexano, diclorometano, acetato de etila e n-butanol. Por destilação dos solventes são obtidas as diferentes frações solúveis do extrato bruto. Todas as frações são testadas em ensaios biológicos para localização dos princípios ativos. Àquelas que se mostrarem promissoras e apresentarem um efeito biológico considerável devem ser submetidas a procedimentos cromatográficos para isolamento e purificação dos compostos.

Para separação das substâncias presentes nas frações utiliza-se sucessivamente a técnica de cromatografia por adsorção em coluna (Collins et al., 1997). Basicamente, o procedimento envolve a aplicação da fração desejada no topo de uma coluna de adsorvente (fase estacionária) empacotada em um tubo de vidro e elui-se com misturas de solventes (fase móvel) no modo gradiente de polaridade. Inúmeras sub-frações são coletadas e posteriormente analisadas por cromatografia em camada delgada (Collins et al., 1997). As sub-frações com o mesmo perfil cromatográfico são reunidas e tais conjuntos são submetidos novamente à uma outra cromatografia em coluna para obtenção dos compostos majoritários semi-puros ou em misturas. A purificação final das substâncias isoladas é realizada por recristalização e para separação de misturas de compostos utiliza-se a cromatografia “flash”. A fase estacionária mais utilizada nestes procedimentos cromatográficos é a sílica gel, contudo, dependendo da necessidade, outros suportes como alumina, sephadex e celulose também podem ser empregados. Após o isolamento e purificação, segue-se com a elucidação estrutural das substâncias obtidas. Para resolução de suas estruturas moleculares são empregados um conjunto de métodos espectrométricos, como espectrometria no ultravioleta (UV), espectro170
metria no infravermelho (IV), espectrometria de ressonância magnética nuclear de hidrogênio e carbono-13 (RMN 1H e 13C) e espectrometria de massas (EM) (Silverstein et al., 1991). Finalmente, as substâncias isoladas e devidamente identificadas são submetidas aos ensaios biológicos para verificação de suas atividades. Dentre os constituintes, aqueles que apresentarem ação significativa são ditos princípios ativos da planta sob investigação. Na figura 3 são indicadas as prováveis classes de metabólitos secundários isolados das diferentes frações.

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Os extratos vegetais e suas respectivas frações são misturas complexas de diferentes metabólitos e, assim, as técnicas hifenadas e acopladas são ferramentas poderosas para estudos desta natureza. A cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) pode ser aplicada, por exemplo, na separação de componentes de sub-frações. A cromatografia gasosa de alta resolução acoplada a espectrometria de massas (CGAR-EM) pode ser empregada com sucesso para identificação de compostos em extratos e frações sem a necessidade de se proceder com toda a marcha fitoquímica.

Muitas vezes o interesse está voltado para os óleos essenciais de plantas. O método mais simples para extração de óleos de essências é a destilação por arraste de vapor. Por este processo ocorre a destilação de misturas imiscíveis em temperaturas menores do que o ponto de ebulição do componente mais volátil. Como na maioria das vezes utiliza-se água como um dos líquidos, consegue-se a separação de componentes de ponto de ebulição mais elevados em temperaturas inferiores a 100°C. Na prática, uma quantidade de material vegetal é aquecida em presença de água e os vapores são condensados por resfriamento para coleta de um destilado. Posteriormente, o destilado é extraído com um solvente orgânico para se obter o óleo essencial.

Atualmente, um dos métodos destacados para a obtenção de óleos essenciais é extração por fluído supercrítico. Neste processo, as essências são obtidas a partir do material vegetal pulverizado, através da passagem de um fluxo contínuo de solvente (p.e., CO2) no estado supercrítico, ou geralmente, próximo ao estado crítico (Sovová, 2005). A caraterização dos óleos essenciais acontece frequentemente por CGAR-EM.
No que diz respeito à análise biológica, deve-se levar em consideração a simplicidade, a rapidez, a reprodutibilidade e o baixo custo dos testes. Apenas com o propósito de identificar as substâncias ativas, usualmente são feitas triagens com modelos experimentais menos complexos. Por exemplo, para avaliar a atividade antifúngica e antibacteriana é comum utilizar-se o método da difusão em ágar e o método da concentração inibitória mínima.

3.4. Estudos posteriores
Após a obtenção e identificação das substâncias ativas, surgem novas frentes de trabalho, e o desfecho final das pesquisas fica por conta de estudos posteriores avançados.
Como mencionado anteriormente, em um primeiro momento os compostos passam por bioensaios simples. Entretanto, depois de selecionadas, as substâncias deverão ser avaliadas em testes mais específicos para comprovação da atividade, definição do seu mecanismo de ação e avaliação da toxicidade.
Muitas vezes, são possíveis estudos envolvendo modificações moleculares para otimização da atividade de uma dada substância natural. Dependendo dos grupos reativos, uma série de variações moleculares podem ser realizadas. Nas mudanças estruturais procura-se introduzir grupos funcionais capazes de potencializar a atividade do composto de partida, permitindo a aplicação de métodos qualitativos e quantitativos de correlação entre a estrutura química e a atividade biológica (SAR e QSAR). Nestes casos, visa-se o incremento estrutural da molécula para aumento de sua potência.
As estruturas dos compostos ativos isolados de plantas são interessantes modelos para o planejamento racional de fármacos (Montanari & Bolzani, 2001). Diante deste fato, o que se faz é utilizar as moléculas destes produtos naturais como base para a elaboração de estruturas análogas, até mesmo mais simples, capazes de apresentar atividade similar ou maior. Com as estruturas definidas, busca-se uma rota sintética viável para preparação das substâncias.
Mesmo que já se tenha identificado o(s) princípio(s) ativo(s) de uma planta, é necessário, por questões de controle de qualidade e segurança, realizar a quantificação desses(s) constituintes. Em trabalhos com este objetivo são empregadas técnicas modernas de análise, como a CLAE acoplada a diferentes sistemas de detecção (ultravioleta, fluorescência, arranjo de diodos e massa) e a cromatografia gasosa com detecção por espectrometria de massas (CG-EM).

4. Utilização de plantas na alimentação de frangos

O trato gastrointestinal (TGI) das aves é estéril quando da eclosão, mas no período imediatamente posterior ocorre rápida colonização por um grande e diversificado número de espécies bacterianas. Existe um equilíbrio na população microbiana do TGI e parece não haver uma microbiota típica, uma vez que fatores como a composição do alimento e a presença de patógenos afetam as espécies bacterianas de maneira diferenciada. Embora os cecos tenham pequena participação na recuperação de nutrientes, no geral a população microbiana do TGI não possui participação direta no sistema digestivo. Foi demonstrado que aves “germ-free” apresentam crescimento melhor do que aves convencionais, mesmo que as últimas recebam antibióticos (Coates et al., 1963). Ainda, conforme revisado por Ewing e Cole (1994), em animais “germ-free” há uma estrutura de vilos mais regular e de espessura menor, resultando em peso total do intestino delgado menor nestes animais. A presença de bactérias
ocasionaria inflamação e espessamento da parede intestinal, reduzindo a eficiência e a capacidade de absorção (Sprinz, 1962, citado por Ewing e Cole, 1994). Portanto, a utilização de aditivos na ração que criem um ambiente desfavorável aos microorganismos, tende a reduzir o impacto negativo destes.

Considerando que muitos metabólitos secundários de plantas apresentam comprovada atividade antimicrobiana in vitro (Cowan, 1999; Nascimento et al., 2000; de Souza et al., 2004), existe o potencial para a utilização destas substâncias em condições in vivo. Contudo, ainda é reduzido o número de trabalhos que reportam a influência de constituintes vegetais sobre o desempenho de aves, o que indica a necessidade de investigações futuras.
As avaliações in vitro comprovam que os óleos essenciais de plantas apresentam potencial atividade frente a microorganismos de impacto econômico na produção (Penalver et al., 2005). Com vistas à atividade antimicrobiana, os óleos essências atraem a atenção para utilização in vivo, contudo, a viabilidade de uso nos sistemas produtivos pode ser dificultada pela alta dosagem requerida. Por exemplo, Botsoglou et al. (2002) observaram que a adição do óleo de orégano à dieta de frangos não apresentou efeito como promotor de crescimento quando administrado a 50 ou 100 mg/Kg de ração.

Alguns estudos testaram a utilização de extratos vegetais após inoculações específicas, inclusive Eimerias para avaliar o efeito direto ou nas infecções secundárias. Youn e Noh (2001) avaliaram o potencial anticoccidiano dos extratos de 15 plantas em frangos inoculados com Eimeria tenella, considerando a taxa de sobrevivência, sintomas de diarréia, lesões, ganho de peso corporal e oocistos excretados. Os autores concluíram que os extratos de Sophora flavescens Aiton, P. koreana Nakai, Sinomenium acutum, Ulmus macrocarpa e Quisqualis indica Linne se mostraram efetivos. Biavatti et al. (2003) observaram que o uso de extratos de Alternanthera brasiliana (180 mL/200 Kg de ração) em frangos inoculados com Eimeria aos 14 dias de idade propiciou melhora no desempenho das aves entre 14 e 21 dias. Guo et al. (2004) mostraram que os extratos aquosos de Lentinus edodes, Tremella fuciformes e Astragalus membranaceus estimularam significativamente o desenvolvimento de frangos infectados com Mycoplasma gallisepticum.

O alho (Allium sativum) é uma das plantas mais estudadas para aplicações na saúde. A substância responsável pelo cheiro característico do alho é a alicina. Embora as propriedades antibacterianas e antifúngicas da alicina estejam bem documentadas (Miron et al., 2000), a adição de alho em pó em até 4,5% às dietas de frangos de corte não resultou em aumento no ganho de peso e na eficiência alimentar (Konjufca et al.,1997). De imediato tem-se a impressão de que a possível perda de substâncias voláteis durante o processo de secagem seja responsável pelo resultado negativo. Contudo, a inclusão de até 0,6% de alho fresco na dieta de frangos também não resultou em efeito no desempenho de frangos (Freitas et al., 2001). Estes resultados indicam a dificuldade em traduzir efeitos observados in vitro para avaliações in vivo. A possibilidade de se obter resultado diferente em condições de produção comercial de frangos não pode ser descartada.
Possivelmente, o principal benefício da utilização de plantas e seus constituintes não resida apenas no efeito antimicrobiano.

Uma importante propriedade que tem sido observada quando do uso de determinadas plantas aromáticas ou temperos é sua influência na atividade enzimática, com consequente melhora da digestibilidade de nutrientes. Esta é a abordagem de recente revisão de Platel e Srinivasan (2004). Dados obtidos por Platel e Srinivasan (2000) utilizando animais de laboratório mostram com clareza uma melhora na atividade enzimática intestinal com a adição da substância capsaicina, bem como de gengibre e cominho à dieta (Tabela 1). Possivelmente, o estímulo da digestão não se restringe à ativação das enzimas digestivas pancreáticas, havendo também contribuição de outros fatores como secreções gástrica, intestinal e biliar. Uma possível consequência seria a maior velocidade na passagem da digesta, conforme observado por Platel e Srinivasan (2001) após submeterem animais de laboratório por seis semanas a uma dieta contendo mistura de plantas aromáticas (Tabela 2). Observações de que ocorre melhora na digestibilidade protéica em frangos através da utilização de óleos essenciais foram recentemente publicadas por Hernández et al. (2004). Os autores utilizaram uma combinação de óleo de orégano, canela e pimenta (200 ppm) na ração das aves (Tabela 3), observando que, no geral, os óleos melhoraram a digestibilidade da ração. O efeito na melhora do desempenho, contudo, não chegou a ser significativo.
Visando explorar a vantagem dos óleos essenciais na digestibilidade, recentemente avaliamos um produto fitogênico comercial à base de óleos essenciais microencapsulados, saponinas e substâncias picantes e amargas em frangos de corte. Baseado em avaliações preliminares, o produto foi adicionado a uma dieta cujos níveis de energia, proteína, lisina, metionina, cálcio e fósforo eram consideravelmente menores à dieta controle (Tabela 4). Observou-se efeito positivo da adição dos extratos no peso vivo aos 35 dias, o que parece ter sido potencializado pela adição de ácidos orgânicos. Já aos 42 dias, não mais foi constada diferença entre os tratamentos no peso vivo nem na conversão alimentar. A partir da avaliação econômica do experimento, conclui-se ser vantajosa a utilização do composto fitogênico, visto que a economia na formulação diferenciada da dieta supera o custo do produto incluído.

O efeito antioxidante das plantas e seus metabólitos também pode ser destacado para a produção animal. No organismo animal são gerados radicais superóxido em processos metabólicos normais que utilizam oxigênio. Os radicais de oxigênio estão envolvidos em várias patologias, dentre elas artrite, inflamações e desordens no fígado. Na célula animal existe um sistema natural de defesa antioxidante que pode ser enzimático ou não-enzimático. A detoxificação enzimática ocorre através de enzimas como superóxido desmutase, catalase e glutationa peroxidase. Além disso, várias substâncias antioxidantes não-enzimáticas estão naturalmente presentes nos tecidos animais e outras são fornecidas através da dieta, principalmente oriundas das plantas, para proteger o organismo dos danos decorrentes das oxidações. Os flavonóides são compostos fenólicos que facilmente participam dos processos de oxi-redução intra- e extra-celulares. O efeito antioxidante dos flavonóides deve-se principalmente à sua habilidade de interagir com radicais livres que iniciam os processos de oxidação ou que são produzidos nas reações em cadeia.
É possível que a propriedade antioxidante das plantas seja útil na produção animal, visando a melhoria do desempenho. Em outra abordagem, alguns estudos tem avaliado a possibilidade de incluir antioxidantes naturais na dieta para melhoria das características qualitativas da carne. Por exemplo, Tang et al. (2000) observaram que a inclusão (300 ppm) na dieta de frangos de uma mistura de catequinas (um grupo de flavonóides) extraída de fonte natural retardou a oxidação lipídica na carne em comparação à dieta controle ou à inclusão de vitamina E (200 ppm).

5. Considerações finais

A avicultura de corte no Brasil é uma atividade altamente intensiva que tem utilizado as mais avançadas tecnologias disponíveis em genética, nutrição, manejo e controle sanitário para atingir os altos níveis de produtividade. A utilização de APC na ração é uma das ferramentas utilizadas para o sucesso deste sistema. Trata-se de uma prática em fase de revisão a partir da política restritiva imposta pela União Européia a qual visa principalmente reduzir o desenvolvimento de resistência bacteriana aos antimicrobianos. Embora trate-se de assunto polêmico, o contexto é propício para alternativas, dentre as quais destacam-se os produtos de origem vegetal, cujo potencial antimicrobiano já há muito é conhecido em estudos in vitro e na medicina humana.
É grande a possibilidade de se obter agentes antimicrobianos a partir de extratos de plantas, de onde originou-se considerável parte dos medicamentos de uso humano. Embora já existam produtos à base de extratos vegetais disponíveis comercialmente, pode-se considerar que a pesquisa com extratos vegetais ainda é pouco explorada na produção animal. A maioria das informações relacionadas ao efeito antimicrobiano das plantas disponíveis na literatura foram geradas com testes in vitro, quando sabe-se que muitos dos microorganismos que compõem a microbiota entérica não podem ser cultivados in vitro. Além disso, na avicultura há particularidades a serem consideradas, como a necessidade de controle das Eimerias.
Além da atividade antimicrobiana, outras propriedades biológicas dos extratos de plantas tendem a ser exploradas. Dentre elas, as vantagens cujo relato na literatura ainda é recente, com o fato de que determinados óleos essenciais melhoram a digestibilidade devido a efeitos na atividade de enzimas digestivas ou na concentração de sucos gástricos/digestivos.

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Alguns produtos à base de plantas aplicáveis à produção animal têm sido introduzidos no mercado, com resultados promissores.
Em contraste com aditivos de outras procedências, os produtos naturais de espécies vegetais tem grande aceitação por se partir da premissa que tudo aquilo que é natural não apresenta riscos. Contudo, é necessário reconhecer que pesquisas sobre a composição química, a atividade biológica, o modo de ação, a eficiência no sistema de produção e a toxicidade de plantas e respectivos metabólitos são indispensáveis para o uso seguro dos produtos alternativos e facilitariam a adoção pelas cadeias produtivas.
A demanda, aliada à vasta biodiversidade brasileira, ainda pouco explorada, surge como uma grande oportunidade e indica a necessidade de estudos de bioprospecção aplicados à Avicultura. Assumindo que a flora brasileira é verdadeiramente um valioso e promitente acervo de novas e potenciais substâncias, e tendo em vista que na interseção entre diferentes áreas do saber repousam inúmeros avanços científicos, existe uma grande necessidade de se consolidar o estabelecimento das interfaces entre a Fitoquímica, a Farmacologia e a Produção Animal.

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6. Referências

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Palestra proferida no I Forum Internacional de Avicultura, publicada nos ANAIS do Evento AVE EXPO  Américas 2005 

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