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Aproveitamento de soro de queijo de coalho na elaboração de bebida láctea pasteurizada

Publicado: 23 de dezembro de 2013
Por: Junio Cesar Jacinto de Paula, Doutor em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal de Viçosa (UFV), Pesquisador e Professor da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais -EPAMIG-, Instituto de Laticínios Cândido Tostes -ILCT-, MG; Felipe Alves de Almeida, Biomédico, Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC), MG; Maximiliano Soares Pinto, Doutor em Ciência e Tecnologia de Alimentos, UFV, Pesquisador e Professor, Universidade Federal de Minas Gerais -UFMG-, MG, e outros.
Sumário

No Brasil bebida láctea é definida basicamente como o produto lácteo resultante da mistura do leite e de soro de leite. Por serem economicamente viáveis, as bebidas lácteas pasteurizadas podem ser uma alternativa tecnológica para o aproveitamento do soro proveniente da fabricação de queijos. O objetivo principal deste trabalho foi elaborar, em escala industrial, uma bebida láctea pasteurizada, semelhante ao leite pasteurizado, desenvolvida à base de soro de leite proveniente da fabricação de queijo de Coalho e avaliar a qualidade e a estabilidade da mesma. Foram realizadas análises físico-químicas, microbiológicas e sensoriais do produto durante 13 dias de estocagem à temperatura de refrigeração 5ºC ± 1ºC. Os resultados mostraram que a bebida desenvolvida enquadra-se na denominação "Bebida Láctea Pasteurizada" com teor mínimo de 1,7% m/m proteína e o teor mínimo de gordura de 2,0% m/m definido pelo Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de Bebida Láctea. Os resultados também indicam que o produto possui estabilidade microbiológica e pode ser armazenado por até 13 dias sob refrigeração a 5°C ± 1ºC. No teste de comparação pareada pode-se concluir que não existe preferência significativa entre a bebida desenvolvida e o leite pasteurizado encontrado no mercado. Sendo assim, a bebida láctea pasteurizada é uma forma potencial para a utilização do soro proveniente da fabricação de queijo de Coalho, tendo em vista sua facilidade de fabricação, valor nutricional e principalmente o seu custo reduzido.

Palavras-chave: soro de leite; processamento; análises; vida de prateleira.

 

1 INTRODUÇÃO
Entre as diversas formas de utilização do soro de leite, a elaboração de bebidas lácteas constitui uma das alternativas mais simples e atrativas para o seu aproveitamento, uma vez que existe a possibilidade de uso dos equipamentos previamente disponíveis nas indústrias de laticínios (PINTADO, M. E.; MACEDO, A. C.; MALCATA, F. X., 2001; CASTRO et al., 2004). Aliado a este fato, pode-se observar que a produção de bebidas lácteas tem conquistado mercado em razão de sua boa aceitação sensorial, elevado valor nutritivo, baixo custo de produção, simplicidade do processo e preços mais atrativos para o consumidor, sendo uma alternativa a produtos clássicos como o leite pasteurizado ou leites fermentados (OLIVEIRA, 2006; THAMER e PENNA, 2006; SANTOS et al., 2008). No Brasil verificou-se uma crescente aceitação para as bebidas semelhantes ao leite, que são produzidas pela mistura de leite e soro obtido da fabricação de diversos tipos de queijos (GALLARDO-ESCAMILLA, F.J.; NELLY, A.L.; DELAHUNTY, C.M., 2007).
O Brasil é o quinto maior produtor de leite do mundo com mais de 29 milhões de toneladas, respondendo por 5,3% da produção mundial em 2010. No mesmo ano a produção de queijos produzidos sob inspeção foi de 801.440 toneladas, com aumento de 11% em relação à produção de 2009. No entanto, considerando que a produção de queijos informais (sem inspeção) equivale a 40% do total, pode-se concluir que o volume produzido atingiu 1,3 milhões de toneladas em 2010 (EMBRAPA, 2010; ABIQ, 2011). Entretanto, considerando o volume de queijos produzidos em 2010, foram gerados aproximadamente 13 milhões de litros de soro, que devido ao seu conteúdo de matéria orgânica, pode constituir um sério problema ambiental (ALESSI, 2005; SARAIVA, 2008).
O queijo de coalho é um queijo brasileiro típico da região norte e nordeste do país, sendo fabricado por diferentes tecnologias, principalmente por queijarias artesanais, de pequeno e médio porte. Com a padronização da tecnologia de fabricação empregando-se leite pasteurizado, a sua produção e consumo tem aumentado muito nos últimos anos, principalmente na região sudeste (BORGES et al., 2003; PEREZ, 2005; SOBRAL, D.; PAULA, J. C. J.; SILVA, P. H. F., 2007). Este crescimento na produção do queijo de coalho torna necessária a busca por alternativas para o aproveitamento adequado do soro proveniente da sua fabricação.
Sendo assim, o presente trabalho objetivou desenvolver e avaliar a qualidade e a estabilidade de uma bebida láctea pasteurizada, semelhante ao leite pasteurizado, elaborada a partir do soro de leite obtido da fabricação do queijo de coalho. Pretendeu-se desenvolver uma tecnologia simples, de baixo custo, de fácil implantação, a fim de disponibilizar mais uma alternativa viável para o aproveitamento ecológico racional e sustentável do soro e ao mesmo tempo incentivar o consumo de lácteos, disponibilizando uma bebida láctea altamente nutritiva e competitiva.
 
2 MATERIAIS E MÉTODOS
2.1 Localização
O presente trabalho foi conduzido nos laboratórios e no Núcleo Industrial do Centro de Pesquisa do Instituto de Laticínios Cândido Tostes da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (CEPQ/ILCT/EPAMIG), em Juiz de Fora – MG.
2.2 Delineamento estatístico e análise dos resultados
O experimento foi conduzido no delineamento inteiramente casualizado (DIC) com um fator de estudo (tempo), sendo avaliado o efeito do tempo na qualidade do produto. Foram realizadas análises de variância para verificar o efeito do tempo nas variáveis estudadas (acidez, pH, contagem de aeróbios mesófilos, contagens de coliformes a 30°C e a 45°C e de fungos filamentosos e leveduras).
Os dados foram analisados utilizando estatística descritiva para avaliação, apresentação e discussão dos resultados, sendo o desvio padrão máximo aceito entre as duplicatas de ± 5,00.
2.3 Testes preliminares, obtenção do soro de leite e fabricação do queijo de Coalho
Foram realizados testes preliminares para a definição do processamento, binômio tempo/ temperatura de tratamento térmico do produto, fluxograma de fabricação e formulação ideal para a produção da bebida.
A partir da definição de todos os parâmetros e da escolha de uma formulação, o produto foi elaborado em escala industrial em três repetições utilizando-se soro de leite proveniente de diferentes fabricações de queijo de Coalho, sem adição de ácido lático e sem adição fermento lático.
Para a fabricação do queijo de Coalho, foram utilizados 50 L de leite pasteurizado, padronizado para 3,0 % (m/m) de gordura e adicionado de cloreto de cálcio, 25 mL da solução a 40 % (m/v). Procedeu-se então a coagulação a 34°C, usandose 1,5 mL de coagulante líquido (Chy-max M®, força 950 IMCU/mL, Chr-Hansen) para 50 L de leite. Após o tempo necessário para a coagulação (aproximadamente 30 min), a coalhada foi cortada lentamente em grãos de tamanho reduzido (aproximadamente 0,5 cm de aresta). A primeira mexedura foi fixada em 20 min, quando, então, iniciou-se a segunda mexedura, com aquecimento lento da massa (1°C a cada 2 a 3 min), com vapor indireto até 50°C. O processo de mexedura foi efetuado até o ponto, que foi obtido cerca de 60 a 80 min após o corte da coalhada. O soro, aproximadamente 80% do volume de leite do tanque, foi retirado para a fabricação da bebida láctea e a massa foi então salgada com 1,5% de sal em relação ao volume inicial de leite. Após 5 min de homogeneização, o restante do soro salgado foi drenado e o bloco de massa foi pré-prensado por 20 min com o dobro do peso estimado da massa, quando o bloco foi cortado e enformado em formas retangulares de 2 kg, equipadas com dessoradores no corpo e na tampa. Os queijos foram prensados por 130 mim com peso equivalente a 10 vezes o peso do queijo (20 kg) e virados nas formas por duas vezes, sendo a ultima prensagem realizada sem o uso de dessorador na forma. Ao final, os queijos encaminhados para a câmara fria para secagem e posterior embalagem a vácuo (SOBRAL, D.; PAULA, J. C. J.; SILVA, P. H. F., 2007).
2.4 Fabricação da bebida láctea pasteurizada
Foram elaborados 12L de bebida láctea pasteurizada, à base de soro de leite proveniente de fabricações de queijo de Coalho, em três repetições. A Figura 1 apresenta o fluxograma de fabricação da bebida láctea pasteurizada.
 
Figura 1 – Fluxograma de fabricação da bebida láctea pasteurizada à base de soro de leite proveniente da fabricação de queijo de Coalho.
Aproveitamento de soro de queijo de coalho na elaboração de bebida láctea pasteurizada - Image 1
 
2.5 Análises físico-químicas, microbiológicas e sensoriais
No tempo T0 (dia da fabricação) foram realizadas análises físico-químicas do leite e do soro utilizado para a produção das bebidas lácteas. Periodicamente, nos tempos T1 (1 dia após fabricação), T2 (3 dias após fabricação), T3 (6 dias após fabricação), T4 (9 dias após fabricação) e T5 (13 dias após fabricação) foram realizadas análises físicoquímicas, microbiológicas e sensoriais das três repetições das bebidas lácteas para avaliar a sua qualidade e estabilidade durante o armazenamento sob refrigeração a 5°C ± 1°C.
As análises físico-químicas de pH, determinação da acidez titulável (%, m/v), teores percentuais de umidade e voláteis totais (%, m/m), gordura (%, m/m) e resíduo mineral fixo (%, m/m) foram realizadas de acordo com os métodos descritos na Instrução Normativa nº 68, de 12 de dezembro de 2006 (BRASIL, 2006). O teor de carboidratos foi calculado pela diferença percentual da soma dos demais nutrientes, proteínas, gordura, resíduo mineral fixo e umidade, segundo Paula (2005). O teor percentual (m/m) de nitrogênio total foi obtido pelo método Kjeldahl, conforme descrito por Pereira et al. (2001), para calcular o teor percentual (m/m) de proteína: com base no teor de nitrogênio total e no fator 6,38. As análises de viscosidade aparente foram realizadas pelo método instrumental utilizando viscosímetro rotacional com haste n° 02 a 20°C e com 50 rotações por minuto (PEREIRA et al., 2001).
As contagens microbiológicas foram realizadas segundo as metodologias: contagens de aeróbios mesófilos – Petrifilm Aerobic Count Plate, 3M, NMUSA (AOAC 990.12 – Contagem total de aeróbios mesófilos em amostras de alimentos em geral); contagens de coliformes a 30°C e a 45°C – Petrifilm E.coli/Coliform Count Plate, 3M, NM-USA (AOAC 991.14 – Contagem de Coliformes e E. coli em alimentos, película Reidratável Seca); contagem de fungos filamentosos e leveduras – Petrifilm Yeast and Mold Count Plate, 3M, NM-USA (AOAC 997.02 – Contagem de Bolores e Leveduras em Alimentos, Filme Reidratável Seco – Método Petrifilm) e S. aureus – Petrifilm Staph Express Count Plate, 3M, NM-USA (AOAC 2003.08 – Método para Contagem de Staphylococcus aureus em Laticínios) foram realizadas, de acordo com os procedimentos determinados pelo fabricante, sendo ambos indicados para análises em leite e derivados (PARK, 2004).
Para as análises sensoriais foram realizados os testes de aceitação utilizando-se a escala hedônica de nove pontos, variando entre os termos "desgostei extremamente", com escore 1, até "gostei extremamente" com escore 9, e de preferência (comparação pareada) para se comparar, quanto à preferência, a bebida láctea pasteurizada em relação ao leite pasteurizado padronizado encontrado no mercado (MINIM, 2006). As análises foram conduzidas com no mínimo 30 provadores não treinados de ambos os sexos, em cabines individuais sob luz branca e as amostras apresentadas sob refrigeração (5ºC) em copos descartáveis de 50 mL. A ordem de apresentação das amostras foi balanceada e casualizada entre os julgadores.
 
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 Análises físico-químicas
Os resultados das análises físico-químicas da bebida láctea pasteurizada, do soro proveniente das fabricações de queijo de Coalho e do leite utilizado para a fabricação da bebida encontram-se na Tabela 1.
A bebida láctea pasteurizada elaborada a partir do soro de leite proveniente da fabricação do queijo de Coalho apresentou teor médio de proteína e gordura acima do nível recomendado pela legislação, encontrando-se, portanto, em conformidade com o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de Bebida Láctea, que estabelece o teor mínimo de proteína de 1,7% m/ m e no mínimo 2,0% (m/m) de gordura de para bebida láctea pasteurizada (BRASIL, 2005).
A composição da bebida láctea pasteurizada pode variar de acordo com a composição e a quantidade de soro empregada. Essa variação pode ser comprovada ao se comparar os resultados do presente trabalho com os encontrados por Oliveira (2006), o qual elaborou uma bebida láctea fermentada com soro de leite proveniente da fabricação de queijo Minas Frescal e enriquecida com ferro. O referido autor obteve valores de 14,94% (m/m) de extrato seco total, 1,65% (m/ m) de proteínas e 1,6% (m/m) de gordura.
Silva et al. (2010) obtiveram resultados diferentes aos observados neste trabalho, exceto quanto ao teor de gordura, ao avaliarem bebidas lácteas pasteurizadas sabor bacuri enriquecidas com 2% e 4% de pólen. Os valores médios, de composição, verificados pelos autores foram de 15,29% e 17,65% (m/m) de extrato seco total, 12,22% e 13,96% (m/m) de carboidratos, 0,76% e 1,25% (m/m) de proteínas, 1,82% e 2,12% (m/m) de gordura, 0,49% e 0,55% (m/m) de resíduo mineral fixo e 68,3 e 79,76 Kcal/100g, respectivamente.
 
Tabela 1 – Composição físico-química da bebida láctea, do leite e do soro utilizado para a sua elaboração.
Aproveitamento de soro de queijo de coalho na elaboração de bebida láctea pasteurizada - Image 2
 
A composição físico-química do leite pode sofrer variações, devido fatores ligados ao manejo, genética, sanidade e nutrição animal (GONZÁLEZ, 2007). Contudo, a composição média do leite, utilizado para a elaboração da bebida láctea, foi próxima a encontrada por Cunha et al. (2008) e Natal (2010). Os valores obtidos pelos autores foram 6,69 e 6,77 de pH, 0,17 e 0,16% (m/v) de acidez, 11,84 e 10,08% (m/m) de extrato seco total, 4,9 e 3,65% de carboidratos, 3,14 e 2,80% (m/m) de proteínas, 3,0 e 3,55% (m/m) de gordura e 0,80 e 0,80% (m/m) de resíduo mineral fixo, respectivamente.
Essas variações nos componentes do leite têm influência na composição do soro, além de ser influenciada pela tecnologia aplicada à coagulação da caseína e pelo pH (HOMEM, 2004). O soro de leite proveniente da fabricação de queijo de Coalho, empregado neste trabalho apresenta diferenças na composição, quando comparado com o soro proveniente da fabricação de queijo Minas Frescal e Mussarela, que também são utilizados na fabricação de bebidas lácteas.
Cunha et al. (2008) obtiveram valores de pH de 6,23, 0,11% (m/v) de acidez, 6,10% (m/m) de extrato seco total, 4,74% (m/m) de carboidrato, 0,66% (m/m) de proteína, 0,16% (m/m) de gordura e 0,53% (m/m) de resíduo mineral fixo, para soro obtido da fabricação queijo Minas Frescal. Tal composição esta diretamente ligada ao processo de fabricação do queijo, que no caso do Minas Frescal normalmente utiliza-se a pré-acidificação do leite com ácido lático, o que naturalmente modifica a composição do soro obtido. Silva et al. (2010) para soro obtido do mesmo queijo, encontraram pH de 6,45 e 0,11% (m/v) de acidez titulável, os quais são semelhantes aos encontrados no presente trabalho. Já para soro de leite proveniente da fabricação de Mussarela, Paula (2005) obteve valores muito próximos aos deste trabalho com 0,12% (m/v) de acidez; 6,97% (m/m) de extrato seco total; 5,36% (m/m) de carboidrato; 1,03% (m/m) de proteína, 0,20% (m/m) de gordura e 0,39% (m/m) de resíduo mineral fixo.
3.2 Evolução da acidez e pH da bebida láctea ao longo do tempo de armazenamento
Os resultados da evolução da acidez da bebida láctea pasteurizada durante a estocagem a temperatura de 5ºC ± 1ºC por 13 dias, encontram-se na Figura 2.
 
Figura 2 – Evolução da acidez ao longo do tempo de armazenamento da bebida láctea.
Aproveitamento de soro de queijo de coalho na elaboração de bebida láctea pasteurizada - Image 3
 
A análise de variância indicou diferença estatisticamente significativa (p≤0,05) em relação à acidez para os tempos de armazenamento que variam de 1 a 13 dias. Houve elevação da acidez titulável do produto ao longo do seu armazenamento refrigerado, segundo o modelo apresentado na Figura 2.
As variações de acidez e pH ocorreram como esperado, ao longo do tempo de armazenamento. Pois, provavelmente durante a estocagem sob refrigeração as bactérias termodúricas alteradoras que resistiram à pasteurização se desenvolvem utilizando a lactose como substrato produzindo ácido lático. Consequentemente, houve um ligeiro aumento da acidez titulável e uma redução no pH, não sendo inversamente proporcional devido ao poder tamponante do produto. Este comportamento irá depender da temperatura de refrigeração, do tempo de armazenamento e do poder acidificação das bactérias resistentes a pasteurização assim como da contagem inicial do leite e do soro utilizado (COSTA, L.C.G.; CARVALHO, E.P.; CARVALHO, A.S., 1983; HORST e SILVA, 2005). Sendo assim, os resultados indicam que, por segurança, sugere-se a vida útil do produto de no máximo 9 dias tendo em vista que as condições de transporte e comercialização que podem não ser as mais adequadas, o que levaria a aceleração das alterações sensoriais.
Os resultados da evolução do pH da bebida láctea pasteurizada durante a estocagem a temperatura de 5ºC ± 1ºC por 13 dias, encontramse na Figura 3.
A análise de variância também indicou diferença estatisticamente significativa (p£0,05) em relação ao pH para os tempos de armazenamento que variam de 1 a 13 dias. Houve abaixamento do pH do produto ao longo do armazenamento segundo o modelo quadrático apresentado na Figura 3.
 
Figura 3 – Evolução do pH ao longo do tempo de armazenamento da bebida láctea.
Aproveitamento de soro de queijo de coalho na elaboração de bebida láctea pasteurizada - Image 4
 
3.3 Análises microbiológicas
As análises microbiológicas, no tempo 1 dia após a fabricação apresentaram contagens <1,0 x 101 UFC.mL-1 para Staphylococcus sp., coliformes 30ºC e 45ºC e para a contagem total de fungos filamentosos e leveduras. A contagem de aeróbios mesófilos foi 1,2 x 102 UFC.mL-1, para o mesmo tempo. Sendo assim, a bebida láctea pasteurizada encontra-se em conformidade com a legislação, que estabelece o limite de, no máximo, duas amostras em cinco analisadas, contendo entre 7,5 x 104 UFC.mL-1 e 1,5 x 105 UFC.mL-1 para aeróbios mesófilos (n=5, c=2, m=7,5 x 104, M=1,5 x 105) por mililitro de produto. Para as bactérias do grupo coliforme a legislação preconiza duas amostras em cinco analisadas, contendo entre 5 e 10 coliformes a 30°C por mililitro ou grama de produto (n=5, c=2, m=5, M=10) e até duas amostras em cinco analisadas, contendo entre 2 e 5 coliformes a 45ºC por mililitro ou grama de produto (n=5, c=2, m=2, M=5) (BRASIL, 2005).
Silva et al. (2010) analisaram 2 amostras de bebidas lácteas pasteurizada sabor bacuri enriquecida com 2% e 4% de pólen, e encontraram resultado < 3 NMP/g para coliformes a 30°C e a 45°C em ambas as amostras. Contudo, a ausência de coliformes no produto final, também pode ser indicativa de boas condições higiênico-sanitárias, durante o processo de elaboração das bebidas (TEBALDI et al., 2007).
3.3.1. Contagem de aeróbios mesófilos em função do tempo
Os resultados da evolução da contagem de aeróbios mesófilos da bebida láctea pasteurizada, durante a estocagem a temperatura de 5ºC ± 1ºC por 13 dias, encontram-se na Figura 4.
A análise de variância indicou diferença estatisticamente significativa (p£0,05) em relação à contagem de aeróbios mesófilos para os tempos de armazenamento que variam de 1 a 13 dias. Houve aumento da contagem de aeróbios mesófilos do produto ao longo do armazenamento segundo o modelo quadrático apresentado na Figura 4.
 
Figura 4 – Evolução da contagem de aeróbios mesófilos ao longo do tempo de armazenamento.
Aproveitamento de soro de queijo de coalho na elaboração de bebida láctea pasteurizada - Image 5
 
A pasteurização tem como finalidade a redução da carga microbiológica transitória e eliminação completa da carga microbiológica patogênica presente, sem que o produto tenha grandes alterações físico-químicas ou prejuízos de seus elementos bioquímicos, além de suas propriedades sensoriais, assegurando e mantendo estável a conservação do leite. Entretanto, como existe a sobrevivência de bactérias termodúricas durante o processo de pasteurização e as contaminações pós-pasteurização durante o resfriamento e envase, é natural que essa carga inicial se multiplique durante a estocagem refrigerada do produto (RICHARDSON, 1985). A contagem para aeróbios mesófilos manteve-se em conformidade com a legislação durante todo período de estocagem refrigerada.
3.3.2. Contagem de fungos filamentosos e leveduras em função do tempo
Os resultados da evolução da contagem de fungos filamentosos e leveduras da bebida láctea pasteurizada, durante a estocagem a temperatura de 5ºC ± 1ºC por 13 dias ocorreram como esperado. Nos tempos 1, 3, 6 e 9 dias após a fabricação as contagens foram <1,0 x 101 UFC.mL-1 e no tempo 13 dias após a fabricação a contagem subiu para 1,45 x 101 UFC.mL-1 , indicando boas condições higiênico-sanitárias, durante o processo de elaboração das bebidas.
Não existem na legislação brasileira normas com padrões microbiológicos estabelecidos para fungos filamentosos e leveduras em bebida láctea pasteurizada. No entanto, a qualidade de produtos lácteos, em termos microbiológicos, também pode ser verificada a partir da determinação quantitativa de fungos filamentosos e leveduras, constituindo uma boa fonte de informações acerca das condições de higiene, a fim de prever as condições sanitárias do processo, do ambiente e do estabelecimento. Fungos filamentosos e leveduras são os microrganismos que mais contaminam os ambientes na indústria de laticínios (ANDRADE, 2008).
3.4 Análises sensoriais
A análise de variância não indicou diferença estatisticamente significativa (p>0,05), para a aceitação sensorial da bebida láctea pasteurizada durante a estocagem refrigerada a 5°C ± 1ºC. A média geral de aceitação do produto ao longo do armazenamento sob refrigeração foi de 5 pontos na escala hedônica de 9 pontos, sendo classificado com o termo hedônico "indiferente" na opinião dos julgadores. Este fato pode ter ocorrido em função de não ser utilizado nenhum tipo de aromatizante, corante no produto ou agente adoçante, buscando-se aproximar-se ao máximo do leite pasteurizado encontrado no mercado. Sendo assim, este resultado foi o esperado, pois diversos consumidores se mostram indiferentes em relação ao sabor e odor do leite puro que é pouco pronunciado podendo ser ligeiramente doce ou salgado. Silva et al. (2010) também utilizaram a escala hedônica de nove pontos para avaliação sensorial de duas bebidas lácteas pasteurizadas sabor bacuri com 2% e 4% de pólen, os resultados médios encontrados foram 7,2 e 7,0, respectivamente.
No teste comparação pareada dos 30 provadores 18 preferiram o leite pasteurizado encontrado no mercado e 12 preferiram a bebida láctea pasteurizada. Sendo assim, não houve preferência significativa entre a bebida desenvolvida e o leite pasteurizado encontrado no mercado, ao nível de 5% de probabilidade pelo teste de comparação pareada. Assim, em termos sensoriais, o leite pasteurizado pode ser facilmente substituído pela bebida láctea pasteurizada.
 
4 CONCLUSÕES
Com base nas condições empregadas neste trabalho e nos resultados obtidos, pode-se concluir que a bebida láctea desenvolvida à base de soro de leite proveniente da fabricação de queijo de Coalho atende os parâmetros microbiológicos e físicoquímicos preconizados pela Instrução Normativa n.º16, de 23 de agosto de 2005.
A bebida láctea pasteurizada armazenada a temperatura de 5ºC ± 1ºC por 13 dias, apresentou resultados físico-químicos e microbiológicos compatíveis com os descritos na literatura, bem como aceitação sensorial constante durante toda a estocagem. Levando-se em conta o acompanhamento da evolução do pH e da acidez titulavel durante a estocagem refrigerada pode-se estimar uma vida de prateleira de 9 dias para a bebida desenvolvida.
Sendo assim, os resultados indicam que, por segurança, sugere-se a vida útil do produto de no máximo 9 dias tendo em vista que as condições de transporte e comercialização que podem não ser as mais adequadas, o que levaria a aceleração das alterações sensoriais.
A tecnologia de fabricação empregada na elaboração da bebida láctea é simples, de baixo custo e não necessidade de grandes investimentos para ser implementada. Assim, a utilização do soro de leite proveniente da fabricação de queijo de Coalho para elaboração de uma bebida láctea pasteurizada, semelhante ao leite pasteurizado, agrega valor nutritivo e pode gerar receitas, podendo ser uma alternativa viável para o aproveitamento ecológico racional e sustentável do soro.
 
AGRADECIMENTO
Os autores agradecem ao CNPq, pelo suporte financeiro concedido ao projeto.
 
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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**O artigo foi originalmente publicado por Rev. Inst. Latic. “Cândido Tostes”, Jul/Ago, nº 387, 67: 13-20, 2012.
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Autores:
Junio César Jacinto de Paula
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