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Classes de perfilhos em pasto de capim-braquiária em relação à localização das fezes bovinas

Publicado: 12 de julho de 2013
Por: Manoel Eduardo Rozalino Santos, Colegiado de Zootecnia da Universidade Federal do Vale do São Francisco -UNIVASF-,PE; Dilermando Miranda da Fonseca, Virgílio Mesquita Gomes, Thiago Gomes dos Santos Braz, Ronan Lopes Albino e Victor Valério de Carvalho, Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa -UFV-, MG.
Sumário

O experimento foi conduzido objetivando-se investigar a influência da deposição natural das fezes pelos bovinos sobre a densidade populacional de diversas classes de perfilhos no pasto de Brachiaria decumbens Stapf. cv. Basilisk manejada sob lotação contínua. Os tratamentos foram dois locais, um próximo (imediatamente adjacente) e outro distante cerca de 1,0 m das fezes excretadas pelos bovinos, avaliados em blocos casualizados, com três repetições. Os perfilhos foram classificados quanto à origem de desenvolvimento, nível de desfolhação e ao comprimento. O número de perfilhos vegetativos foi maior no local distante (1851 perfilhos/m2) do que naquele próximo das fezes (848 perfilhos/m2). O número de perfilhos reprodutivos foi maior nos locais próximos das fezes. Não foi observado efeito da localização das fezes sobre a densidade populacional de perfilhos mortos. O número de perfilhos basais e aéreos foi superior no local distante, quando comparados ao do local próximo das fezes. Houve maiores densidades populacionais de perfilhos desfolhados e sem meristema apical nos locais distantes das fezes, enquanto que a densidade populacional de perfilhos não desfolhados foi maior nos locais próximos das fezes. Os perfilhos menores foram mais frequentes (P<0,05) nos locais distantes das fezes, enquanto que os perfilhos maiores foram mais frequentes nos locais próximos das fezes. Em pasto de B. decumbens mantido sob lotação contínua, a deposição de fezes pelos bovinos modifica a distribuição espacial das categorias de perfilhos e, portanto, constitui um fator causador de heterogeneidade espacial da vegetação.

Palavras-chave: Brachiaria decumbens, categoria de perfilho, densidade populacional de perfilho, lotação contínua, pastejo

INTRODUÇÃO
A produtividade do pasto é decorrente de processos complexos e dinâmicos, que são afetados por diversos fatores bióticos e abióticos, característicos do ecossistema pastagem. Nesse sentido, o acúmulo de forragem é determinado, dentre outros fatores, pelo balanço entre surgimento e mortalidade de perfilhos, bem como pelas mudanças nas taxas de desenvolvimento de perfilhos individuais (CARVALHO et al., 2000).
As modificações na densidade populacional e nas características morfológicas de perfilhos individuais influenciam a estrutura do relvado pelo simples fato dos perfilhos, em conjunto, constituírem o pasto. O perfilho é considerado a unidade vegetativa básica das gramíneas (HODGSON, 1990) e a população de perfilhos existente no pasto determina suas características estruturais tais como altura, composição morfológica, densidade volumétrica da forragem e índice de área foliar (SANTOS et al., 2010a).
A densidade populacional de perfilhos é influenciada por vários fatores, como manejo do pastejo (CARVALHO et al., 2000; Santos, 2009), disponibilidade hídrica (MATTOS et al., 2005) e fertilidade do solo (MORAES et al., 2006). Outro fator que, certamente, determina as alterações no número de perfilhos no pasto é a deposição natural de fezes por bovinos que, em geral, ocorre de forma irregular e desuniforme (BRAZ et al., 2003).
A deposição de fezes em um local da pastagem constitui uma forma de retorno e distribuição de nutrientes (BRAZ et al., 2002), o que, teoricamente, resulta em condições mais favoráveis ao desenvolvimento dos perfilhos e, consequentemente, à produção de forragem (MARSHESIN, 2005). Adicionalmente, a presença das fezes no pasto também resulta em rejeição das plantas pelos bovinos nas suas proximidades (WILLIANS e HAYNES, 1995). Esses dois efeitos das fezes no pasto promovem a variabilidade espacial da vegetação e concorrem para a formação da estrutura horizontal do pasto (SANTOS et al., 2010b).
Dentre as causas da diversidade de estruturas que ocorrem no mesmo pasto em razão da deposição de fezes pelos bovinos, destaca-se a variação na densidade populacional de perfilhos, que pode ser estudada pela quantificação dos mesmos, assim como pela sua classificação, quanto ao estádio fenológico, à origem de desenvolvimento e à ocorrência de desfolhação (PEDREIRA et al., 2001).
Portanto, objetivou-se conhecer a forma como a deposição natural das fezes pelos bovinos interfere na distribuição espacial das distintas categorias de perfilhos no pasto de Brachiaria decumbens Stapf. cv. Basilisk manejado sob lotação contínua. Esse conhecimento, por conseguinte, contribui para melhor compreensão dos mecanismos envolvidos na formação da estrutura horizontal do pasto.
 
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi conduzido no Setor Forragicultura do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa, localizada em Viçosa- MG (20º45' S; 42º51' W; 651 m), entre os meses de outubro de 2008 a janeiro de 2009, numa área de pastagem de Brachiaria decumbens Stapf. cv. Basilisk, estabelecida em 1997. A área experimental foi constituída de três piquetes (unidades experimentais) com cerca de 0,30 ha, além de uma área reserva. O solo da área experimental é classificado como Latossolo Vermelho- Amarelo, de textura argilosa (EMBRAPA, 1999). A análise química da camada 0-20 cm, realizada no início do período experimental apresentou os seguintes resultados: pH em H2O: 4,79; P (Mehlich-1): 1,5 e K: 86 mg dm-3; Ca2+: 1,46; Mg2+: 0,32; Al3+: 0,19 cmolc dm-3 (KCl 1 mol L-1) e P-rem: 29,2 mg L-1. Com base nas recomendações de CANTARUTTI et al. (1999), a área experimental foi adubada nos dias 11/11/2008 e 15/ 12/2008 com duas aplicações de 50 kg ha-1 de N e K2O, bem como 25 kg ha-1 de P2O5 usando o formulado 20-05-20. Durante o período de avaliação, os dados climáticos (Tabela 1) foram registrados em estação meteorológica distante da área experimental, aproximadamente, 500 m.
Desde outubro de 2008 os piquetes foram manejados sob lotação contínua com taxa de lotação variável, de modo a manter a altura do pasto em, aproximadamente, 25 cm. Para isso, a altura do pasto foi monitorada duas vezes por semana e foram utilizados bovinos machos, em recria, com peso médio de 200 kg.
Os tratamentos consistiram de dois locais no mesmo pasto, um próximo e outro distante das fezes dos bovinos. Considerou-se como próximo das fezes o local imediatamente adjacente às fezes, enquanto que o local distante correspondeu àqueles que, num raio de cerca de um metro, não havia presença de fezes. Adotou- se o delineamento em blocos ao acaso com três repetições.
Tabela 1. Médias mensais da temperatura média diária, insolação, precipitação pluvial total e evaporação total durante o período de outubro de 2008 a janeiro de 2009
Classes de perfilhos em pasto de capim-braquiária em relação à localização das fezes bovinas - Image 1
Para determinação da densidade populacional de perfilhos, foram colhidas seis amostras por piquete, sendo três amostras oriundas de cada local do pasto (próximo e distante das fezes), com corte ao nível do solo de todos os perfilhos contidos no interior de um quadrado de 0,25 m de lado. Esses perfilhos foram acondicionados em sacos plásticos identificados e, em seguida, levados para o laboratório. Os perfilhos vivos que tinham a inflorescência visível foram classificados como reprodutivos; os vivos que não tinham a inflorescência visível foram denominados de vegetativos; e aqueles cujo colmo estava totalmente senescido foram classificados como mortos. O somatório dos perfilhos vegetativos e reprodutivos correspondeu aos perfilhos vivos, enquanto que o número de perfilho total foi obtido somando-se os perfilhos vivos com os mortos.
Posteriormente, os perfilhos vivos também foram classificados quanto à origem de desenvolvimento, em basais e aéreos. Considerou-se perfilho basal aquele oriundo de gemas localizadas próximas ou no nível da superfície do solo. Os perfilhos aéreos correspondem àqueles originados de gemas laterais, localizadas nos nós superiores de um perfilho basal principal.
Nas mesmas amostras, também foi feita a classificação dos perfilhos vivos de acordo com o nível de desfolhação. Para isso, os perfilhos foram agrupados em três categorias:
Perfilho sem desfolhação: perfilhos em estádio vegetativo ou reprodutivo que não apresentavam sinais de desfolhação em uma ou mais lâminas foliares e que possuíam o meristema apical;
Perfilho com desfolhação: perfilhos em estádio vegetativo ou reprodutivo que apresentavam desfolhação parcial ou total em uma ou mais lâminas foliares e, adicionalmente, possuíam o meristema apical;
Perfilho sem o meristema apical: perfilhos em estádio vegetativo ou reprodutivo que não apresentavam o meristema apical devido sua remoção pelo pastejo dos bovinos.
Em adição, todos os perfilhos vivos (vegetativos ou reprodutivos) de cada amostra foram agrupados em sete classes de comprimento: 0 a 10 cm; 10 a 20 cm; 20 a 30 cm; 30 a 40 cm; 40 a 50 cm; 50 a 60 cm; e perfilhos com mais de 60 cm, sendo os resultados expressos em termos percentuais. Com isso, calculou-se a participação relativa das distintas categorias de comprimento na densidade populacional total de perfilhos no pasto.
As análises dos dados experimentais foram realizadas utilizando o Sistema para Análises Estatísticas - SAEG, versão 8.1 (Universidade Federal de Viçosa, 2003). As estimativas de densidade populacional de perfilhos, oriundas de contagem, sofreram transformação raiz quadrada; enquanto que as estimativas da participação relativa das distintas categorias de perfilhos, expressas em percentagem, sofreram transformação angular ou arco seno. Essas transformações foram necessárias para assegurar que as prerrogativas básicas da análise de variância fossem atendidas. Posteriormente, para cada característica, foram realizadas análise de variância e aplicação do teste F a fim de comparar os dois locais do mesmo pasto. Todas as análises estatísticas foram realizadas ao nível de significância de até 5 % de probabilidade.
 
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A presença das fezes de bovinos influenciou (P<0,05) as densidades populacionais de perfilhos vegetativos, reprodutivos, vivos e totais do capimbraquiária manejado sob lotação contínua (Tabela 2). Observou-se que a densidade populacional de perfilhos vegetativos foi maior (P<0,05) no local distante, quando comparado ao próximo das fezes. O maior crescimento da forrageira, proporcionado pela deposição de nutrientes oriundos das fezes e também a rejeição do pasto pelo animal, resultaram em pastos mais altos próximos das placas de fezes. Com isso, provavelmente, houve sombreamento de perfilhos vegetativos mais novos e de menor comprimento, que poderiam ter morrido. Realmente, em ambientes com escassez de luz, a alocação de assimilados é prioritária para os perfilhos mais velhos da gramínea em relação àqueles mais jovens (PEDREIRA et al., 2001).
Tabela 2. Densidade populacional de perfilhos em diferentes categorias em pastos de capim-braquiária, em função da localização das fezes de bovinos1
Classes de perfilhos em pasto de capim-braquiária em relação à localização das fezes bovinas - Image 2
A densidade populacional de perfilhos reprodutivos foi maior (P<0,05) nos locais próximos das fezes, o que esteve associado ao maior desenvolvimento dos perfilhos, causado, possivelmente, pela maior disponibilidade de nutrientes, inclusive o nitrogênio, no solo adjacente às fezes (MARCHESIN, 2005). Com isso, os perfilhos se desenvolveram mais e atingiram o estádio reprodutivo mais rapidamente. Essa inferência pode ser feita a partir do trabalho de CAMINHA (2009), que verificou que o pasto de capimmarandu, manejado sob lotação contínua e com bovinos, apresentou maior ocorrência de perfilhos florescidos quando submetido à maior dose de nitrogênio (450 kg/ha.ano). Essa maior densidade populacional de perfilhos reprodutivos nos locais próximos das fezes (Tabela 2) também pode ser justificada pela rejeição das plantas pelos bovinos nesses locais do mesmo pasto. Nesse contexto, WILLIANS e HAYNES (1995) relataram que a área do pasto rejeitada pelos animais pode ser cinco a 12 vezes maior do que a área do pasto com fezes, e o período dessa rejeição pode ser de 40 dias a 18 meses, de acordo com as condições edafoclimáticas. Assim, é provável que tenha ocorrido menor frequência e intensidade de pastejo nas proximidades das fezes, o que garantiu que grande parte dos perfilhos não tivesse o seu ciclo fenológico normal interrompido e, dessa forma, maior percentual de perfilhos vegetativos atingiu o estádio reprodutivo. Por outro lado, possivelmente, os perfilhos presentes nos locais distantes das fezes foram pastejados mais frequentemente, o que pode ter resultado, inclusive, na eliminação do meristema apical de muitos deles e minimizado o aparecimento de perfilhos reprodutivos.
Com relação aos perfilhos mortos, não foi observado efeito (P>0,05) da proximidade das fezes sobre a densidade populacional, tendo o valor médio sido de 584 perfilhos/m2 (Tabela 2). Dessa forma, no local distante das fezes, a maior frequência do pastejo poderia ter contribuído para a mortalidade dos perfilhos, enquanto nos locais próximos das fezes, o maior sombreamento na base das plantas pode ter ocasionado mortalidade de perfilhos menores. Esses processos, embora distintos, podem explicar a ausência do efeito das fezes dos bovinos sobre o número de perfilhos mortos no mesmo pasto de capimbraquiária.
As densidades populacionais de perfilhos vivos e totais foram, respectivamente, 47% e 45% superiores nos locais distantes das fezes, quando comparadas aos dos locais próximos das fezes (Tabela 2). Esses resultados se devem, sobremaneira, à maior ocorrência de perfilhos vegetativos nos locais distantes das fezes, conforme explicado anteriormente
As densidades populacionais de perfilhos basais e aéreos também foram influenciadas (P<0,05) pela localização das fezes de bovinos. Constatou-se que a densidade populacional de perfilhos basais foi maior (P<0,05) do que a de perfilhos aéreos, independentemente do local do pasto avaliado. Ademais, os números de perfilhos basais e aéreos foram superiores (P<0,05) no local distante das fezes, quando cotejados aos dos locais próximos das fezes (Figura 1).
Figura 1. Densidade populacional de perfilhos aéreos e basais em pastos de capim-braquiária, em função da localização das fezes de bovinos; para cada categoria de perfilho, médias seguidas de letras distintas diferem pelo teste F (P<0,05)
Classes de perfilhos em pasto de capim-braquiária em relação à localização das fezes bovinas - Image 3
A maior densidade populacional de perfilhos basais no local distante das fezes (Figura 1) ocorreu porque, possivelmente, os bovinos realizaram o pastejo mais frequente nesse local do pasto, o que permitiu maior incidência de luz na base das plantas que, por conseguinte, pode ter estimulado o desenvolvimento de perfilhos a partir das gemas basais. Realmente, na maioria das espécies, maiores intensidades luminosas favorecem o perfilhamento (LANGER, 1963). Contudo, o maior crescimento das plantas nos locais próximos das fezes certamente resultou em um ambiente mais sombreado próximo à superfície do solo, o que criou condição não predisponente ao perfilhamento basal do capim-braquiária. De fato, em pastos mais altos, a maior competição por luz no dossel resulta, dentre outros fatores, em menor densidade populacional de perfilhos basais (SBRISSIA e SILVA, 2008). Além disso, a reduzida razão vermelho:infravermelho, característica comum à luz que chega nos estratos inferiores do pasto também causa atraso no desenvolvimento das gemas em perfilhos (DEREGIBUS et al., 1983).
Já a maior densidade populacional de perfilhos aéreos nos locais distantes das fezes (Figura 1) pode ser um indicativo da maior frequência de pastejo possivelmente ocorrida nesse local do pasto, conforme já discutido. Isso pode ter resultado em aumento da remoção dos meristemas apicais dos perfilhos e, consequentemente, estimulado o perfilhamento aéreo. Uma das consequências da desfolhação pode ser a eliminação do meristema apical. Com isso, há perda da dominância apical e maior potencial para o desenvolvimento das gemas laterais (SANTOS et al., 2010c).
Na classificação dos perfilhos de capim-braquiária quanto ao nível de desfolhação, também foi observado efeito (P<0,05) das fezes dos bovinos. De fato, observaram- se maiores (P<0,05) densidades populacionais de perfilhos desfolhados e sem meristema apical nos locais distantes das fezes, enquanto que, a densidade populacional de perfilhos não desfolhados, foi maior (P<0,05) nos locais próximos das fezes (Figura 2). Esses resultados têm como causa a menor desfolhação ocorrida nos locais próximos das fezes, em razão da rejeição da forragem pelos bovinos (WILLIANS e HAYNES, 1995). Em adição, esses resultados permitem inferir que, além de fatores como a intensidade do verde, a altura do pasto e a facilidade de apreensão da forragem (BAZELY, 1990), a proximidade das fezes também diminui a preferência dos bovinos pelas plantas no mesmo pasto.
Nos dois locais do pasto constatou-se que a maior parte dos perfilhos possuía algum nível de desfolhação, embora esta tenha sido maior nos locais distantes das fezes (Figura 2). Realmente, no local distante das fezes, 75% dos perfilhos basais estavam desfolhados e 15% não possuíam o meristema apical. Já no local próximo das fezes, os perfilhos desfolhados e sem o meristema apical também apresentaram maior participação relativa, com valores de 65% e 4%, respectivamente. De forma contrária, reduzido percentual de perfilhos encontrava-se sem desfolhação, tanto nos locais próximos (31%) quanto nos locais distantes (10%) das fezes. Salienta-se que a maioria dos perfilhos de capim-braquiária sem desfolhação eram perfilhos jovens e, portanto, de comprimento reduzido, o que diminuiu a sua probabilidade de desfolhação pelo fato dos bovinos terem dificuldade em pastejá-los.
Também foi observado efeito da proximidade das fezes dos bovinos sobre a participação relativa das classes de comprimento de perfilhos presentes no pasto. De maneira geral, os perfilhos menores (até 20 cm de comprimento) foram mais frequentes (P<0,05) nos locais distantes das fezes, enquanto que os perfilhos maiores (com mais de 30 cm de comprimento) foram mais frequentes (P<0,05) nos locais próximos das fezes (Tabela 3).
Figura 2. Densidade populacional de perfilhos desfolhados, não desfolhados e sem meristema apical em pastos de capim-braquiária, em função da localização das fezes de bovinos; para cada categoria de perfilho, médias seguidas de letras distintas diferem pelo teste F (P<0,05)
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A maior participação de perfilhos maiores nos locais próximos das fezes pode ter sido consequência da maior competição por luz entre os perfilhos nesse local do pasto. A deposição de fezes pode ter aumentado a disponibilidade de nutrientes para a planta, melhorando as condições para o seu crescimento. Este maior crescimento não foi interrompido pelo pastejo, haja vista a ocorrência de rejeição da forragem próxima das fezes pelos bovinos (WILLIANS e HAYNES, 1995). Desse modo, houve a formação de um microclima mais sombreado nesse local do pasto, que pode ter ocasionado a morte de perfilhos mais jovens (de menor tamanho), bem como estimulado o alongamento do colmo daqueles perfilhos mais velhos (de maior comprimento), devido à competição por luz no dossel. Nessa última condição, embora o número de perfilho total diminua (Tabela 2), acentua-se o processo de alongamento do colmo para expor as novas folhas na região superior do dossel, onde a luminosidade é maior (LEMAIRE, 2001). Essa é uma resposta morfológica típica de gramíneas forrageiras tropicais sob condições de sombreamento e já foi registrada para espécies do gênero Pennisetum (VOLTOLINI et al., 2010), Brachiaria (PEDREIRA et al., 2007) e Panicum (BARBOSA et al., 2007).
Tabela 3. Participação relativa (%) de classes de perfilhos com distintos comprimentos em pasto de capim-braquiária, em função da localização das fezes de bovinos1
Não houve diferença (P>0,05) na participação relativa dos perfilhos com 20 a 30 cm de comprimento, entre os locais avaliados (Tabela 3), o que pode estar relacionado ao critério de manejo do pastejo adotado nesse experimento, onde o pasto de capim-braquiária foi mantido com altura média de 25 cm durante todo o período experimental.
À exceção dos perfilhos reprodutivos e sem desfolhação, constatou-se que as demais categorias de perfilhos avaliadas nesse trabalho (vegetativo, vivo, total, basal, aéreo, desfolhado e sem meristema apical) apresentaram menor densidade populacional nos locais próximos das fezes (Tabela 2, Figuras 1 e 2). Nesse local do pasto também foi quantificada a maior participação relativa de perfilhos de maior comprimento (acima de 30 cm) (Tabela 3). Padrão de resposta inverso foi verificado no local do pasto distante das fezes, que apresentaram maior densidade populacional das referidas categorias de perfilhos, porém esses perfilhos eram de menor tamanho. Essa análise conjunta dos dados (Tabelas 2 e 3 e Figuras 1 e 2) permite constatar a ocorrência da lei de compensação entre tamanho e densidade populacional de perfilhos (YODA et al., 1963; SBRISSIA e SILVA, 2008), nos locais próximos e distantes das fezes. Segundo essa lei, pasto com plantas mais altas apresentam perfilhos mais pesados, porém com menor densidade populacional. Ao contrário, em pastos com menor altura observa-se maior número de perfilhos de menor comprimento. As mudanças dinâmicas e compensatórias nos comprimentos e nos números de perfilhos do pasto ocorrem, sobretudo, em razão da competição por luz entre os perfilhos no dossel (SBRISSIA e SILVA, 2008).
Com base nos dados apresentados, também é possível inferir que a deposição de fezes pelos bovinos na pastagem constitui causa inerente da heterogeneidade espacial da vegetação, também denominada de estrutura horizontal do pasto. Essa assertiva é válida se considerarmos que o pasto é constituído por uma população de perfilhos (HODGSON, 1990) que tem suas características modificadas pela proximidade com as fezes. Logo, se a estrutura e, ou, a morfologia dos perfilhos individuais, que são as unidades básicas do pasto, são alteradas pela deposição das fezes dos bovinos, o pasto também terá sua estrutura modificada.
Vale ainda salientar que, dentre outros fatores, foram as modificações ocorridas nas características morfológicas dos perfilhos individuais, que possibilitaram constatar diferenças na densidade populacional das distintas categorias de perfilhos entre os locais do pasto. Por sua vez, a diferenciação morfológica de perfilhos individuais constitui-se em resposta plástica do capim-braquiária para se adaptar às novas condições ambientais (microclima) decorrentes da deposição das fezes dos bovinos.
 
CONCLUSÕES
Em pasto de Brachiaria decumbens mantido sob lotação contínua, a deposição de fezes pelos bovinos modifica a distribuição espacial das categorias de perfilhos e, portanto, constitui um fator causador de heterogeneidade espacial da vegetação.
 
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**O trabalho foi originalmente publicado no Boletim da Indústria Animal (BIA), do Instituto Zootecnia (IZ/APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo, Brasil.
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Autores:
Manoel Eduardo Rozalino Santos
Universidade Federal do Vale do São Francisco -UNIVASF-
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